Gigante chinesa Alibaba entra na disputa pelo comércio eletrônico no país, que cresceu muito com a pandemia
Toda semana, três aviões dos grandes, como o Boeing 747, saem da China para o Brasil lotados só de encomendas de usuários do AliExpress, o maior marketplace (shopping virtual) do planeta. É uma das medidas do esforço que a marca do gigante chinês Alibaba faz para fincar sua bandeira de vez no Brasil.
A empresa está de olho no segmento do comércio eletrônico que mais cresce no país, turbinado pela pandemia: o de plataformas digitais de vendas que agregam diferentes fornecedores. Movimentou R$ 30 bilhões no primeiro semestre, segundo a Ebit Nielsen.
Porém, a chinesa liderada pelo bilionário Jack Ma encontra uma disputa já acirrada no país, com nacionais e estrangeiras investindo para conquistar o novo consumidor digital brasileiro.
Além dos aviões para agilizar sua entrega de produtos chineses no Brasil, o AliExpress adotou neste ano outras três medidas específicas para o mercado nacional: reduziu pela metade o valor mínimo da compra que dá direito a frete grátis, que agora é de US$ 15 (cerca de R$ 85); passou a parcelar em seis vezes sem juros no cartão.
E trouxe para o país seu modelo de contratação de influenciadores digitais para disseminar um burburinho nas redes sociais. Uma estratégia de formiguinha criada na China que a tornou o maior shopping virtual do mundo, que vendeu mais de US$ 1 trilhão no último ano fiscal.
“Os organizadores do programa te pagarão dois dólares em comissão por comprador indicado”, promete a convocatória do programa do Alibaba para atrair “influenciadores digitais criativos” dispostos a divulgar seus produtos no país.
Potencial a explorar
“O Brasil está entre os cinco maiores mercados do AliExpress no mundo, e estas mudanças se refletiram em alta de 40% nas vendas de diversas categorias de produtos relacionados ao dia a dia, ao longo deste ano”, afirmou, por e-mail, Yan Di, executivo do AliExpress para o Brasil.
O potencial é grande, diz Carlos Coutinho, diretor de varejo da PwC:
— O e-commerce representa 6% do varejo no Brasil, contra 15% nos EUA e 25% na China.
Pesquisa da Nielsen aponta que 32% dos consumidores brasileiros não sabem o que é marketplace. Ainda assim, este tipo de e-commerce cresceu 56% no primeiro semestre ante igual período de 2019, enquanto o comércio eletrônico como um todo teve alta de 39,4%. Essas plataformas já representam 78% do varejo eletrônico do país.
— É uma evolução que aconteceu com o varejo tradicional anos atrás, quando as lojinhas pequenas viram a chegada dos hipermercados e dos shoppings oferecendo a conveniência de tudo num lugar — diz Roberto Butragueño, diretor de Varejo da Nielsen do Brasil. — E o Brasil é um país único no mundo, assim como no varejo tradicional, é muito descentralizado. Há espaço para vários players, desde que eles tenham diferenciais.
Neste contexto, o prazo de entrega é um dos principais diferenciais que as varejistas buscam, investindo em centros de distribuição e novos arranjos logísticos. No caso do AliExpress, o desafio é intercontinental.
Para isso, criou um sistema em que recolhe produtos de vários vendedores na China e envia tudo em pacote único ao Brasil. O Alibaba informou que, globalmente, pretende quadruplicar a frota de aviões para entregar em 72 horas em qualquer lugar nos próximos anos.
— Antes, um produto chinês demorava 40 dias para chegar no Brasil. Hoje, já está entre 12 e 25 dias, um prazo não muito acima de algumas empresas brasileiras — diz André Boaventura, diretor da Leve, divisão de logística do Ebanx especializada em soluções de logística relacionadas à China.
Marco Dutra, consultor da SGPweb, conta que a indonésia Shopee também entrou forte no país, oferecendo frete grátis e sem cobrar taxa dos vendedores, que chega a 16% do valor do produto em algumas plataformas.
Mas ele adverte que, para conquistar o brasileiro ainda desconfiado, é preciso ter uma boa logística.
As concorrentes não estão paradas, e as estratégias vão muito além do serviço de streaming usado pela gigante Amazon para fidelizar. No Magazine Luiza, além de lojas funcionarem como minidepósitos — inclusive para parceiros do seu marketplace —, a integração tem nova dimensão:
— Um parceiro pode vender conosco on-line e permitir a retirada da mercadoria em nossas lojas, onde nossos vendedores têm acesso ao catálogo do marketplace, ou seja, podem vender 17 milhões de produtos — diz Leandro Leite, diretor-executivo de Marketplace da Magalu, cuja plataforma cresceu 214% no último ano, segundo a empresa.
Supermercados digitais
Julia Rueff, diretora de Marketplace do Mercado Livre no Brasil, lembra que os shoppings virtuais foram fundamentais para a sobrevivência de muitas empresas e empreendedores durante a pandemia — em muitos casos, foi o único canal de vendas disponível.
E, com essa experiência, não apenas consumidores se acostumaram às compras digitais. Fornecedores estão vendo nas plataformas um bom caminho para faturar. Atrair vendedores também importa.
— Fomos pioneiros, temos um ecossistema robusto, oferecemos serviços completos aos parceiros. E a vantagem de termos nosso app em um em cada três smartphones brasileiros — comenta Rueff. — Na pandemia, tivemos entrada de mais de cinco milhões de usuários na América Latina.
Na B2W, de marcas como Americanas.com e Submarino, a diversificação é a palavra-chave no marketplace, que já representa 60% do faturamento do grupo, algo em linha com o que ocorre no exterior em grupos como Amazon.
Jean Lessa, diretor de Tecnologia e Marketplace da B2W Digital, afirma que a empresa desenvolveu soluções para pequenos lojistas durante a pandemia, com entrega rápida dentro do bairro do consumidor, e está apostando na diversificação. Hoje, a empresa tem 62 mil vendedores associados.
— O produto mais vendido em nossa plataforma, em termos de quantidade, não de valor, foi banana-prata, o que, para nós, é surpreendente. Esperaríamos celular ou TV, coisas típicas do mercado on-line até então — conta Lessa, que investe em supermercados digitais para chegar a 100 milhões de produtos no marketplace.
Já a Via Varejo, que também investe muito no segmento, aposta em agilidade para reforçar a confiança em suas marcas Casas Bahia e Pontofrio:
— Não vamos ver aqui o que aconteceu nos EUA, onde a Amazon dominou. O brasileiro é diferente, gosta de pesquisar antes de comprar. Há espaço para seis grandes players — comenta Abel Ornelas, diretor de Operações da Via Varejo.
Fonte: O Globo