Após 14 anos sem mudanças no comando, a rede de material de construção Leroy Merlin troca de presidente no país e pretende avançar num plano de aberturas de dois novos formatos de lojas no Brasil, um voltado para arquitetos e designers – a rede será chamada de “L’espace AD” – e outro com unidades menores, ainda sem marca definida.
Na linha de frente da Leroy desde 2006, o francês Alain Ryckeboer deixará a posição em agosto e será substituído por Ignacio Sánchez, diretor-geral da varejista na Espanha há quase 11 anos. Os executivos devem trocar de cargo entre si – Ryckeboer passa a ser o presidente da filial espanhola. O comunicado foi feito internamente pela matriz este mês.
Já com a vinda de Sánchez, a ideia é retomar o projeto de crescimento orgânico, com a abertura de novas lojas – que ficou em segundo plano com a recessão de 2015 e 2016. Antes disso, a Leroy abria até três lojas ao ano no Brasil. Desde então, isso se reduziu a uma por ano, em média. A cadeia tem 42 pontos no país. Procurado, Sánchez preferiu não dar entrevista.
“É uma troca para renovar estratégias. Já vinhamos discutindo isso em 2019, e mesmo com a pandemia, as necessidades de cada país continuam. A Espanha tem uma grande ‘expertise’ em lojas e o Brasil tem um modelo digital que o controlador quer levar para a Europa”, diz Ryckeboer.
Haverá uma curta transição de cargos, com a presença dos dois CEOs por dez dias em cada país. Sanchez chega ao Brasil no fim de julho e a transição começa em agosto. Os novos modelos de loja devem começar a operar neste ano, inicialmente em São Paulo, e são uma forma também de reagir à crise gerada pela pandemia.
As lojas menores podem aumentar a presença do grupo nas capitais e trazer novos clientes para a rede. Ainda ajudam a acelerar a entrega do pedido on-line – segmento em franca expansão – porque as lojas têm sido usadas como locais de estocagem de itens vendidos pelo site. Também por terem uma metragem menor, haveria uma circulação mais limitada de pessoas nos pontos, num momento em que clientes buscam locais com menor aglomeração.
Desde o início do isolamento social, a rede viu multiplicar por quatro as vendas on-line no país. Eram 80 pedidos ao dia, em média, antes da pandemia, e agora esse patamar chega a 700. A equipe de logística e entregas foi reforçada. Lojas foram reabertas após prefeituras considerarem a atividade essencial. Na época, fornecedores tiveram prazos de pagamento renegociados, dizem fontes.
Ryckeboer diz que detalhes do modelo mais compacto de loja serão divulgados em três meses. A rival Telha Norte, do Grupo Saint Gobain, iniciou em 2019 a abertura de pontos menores em áreas urbanas. Além disso, redes regionais melhoraram a experiência de compra e ampliaram portfólio. Esses movimentos acirraram a competição em locais onde a Leroy ganhou mercado na última década, comenta Gouvêa de Souza.
Já a “L’espace AD” será uma loja butique para ampliar a força do grupo entre decoradores e arquitetos. “No Brasil, parte da classe média contrata esse profissional em reformas. Ele é vital nessa cadeia”, afirma Ryckeboer. A Adeo tentou trazer outras marcas ao país, nem sempre com sucesso. A rede de artigos de decoração Zôdio foi aberta em 2017 e fechada em 2019 por causa do resultado abaixo do esperado. O grupo ainda busca expandir a atacadista Obramax, que começou a operar em 2017 com planos de atingir dez unidades até 2022. Hoje são duas.
Sobre o assunto, o executivo diz que a Leroy não gere essas marcas. “Não é nossa responsabilidade. De qualquer forma, o que posso dizer é que a Zôdio não alcançou as metas e a Obramax vai bem, ainda vai se desenvolver mais”. Ele conta que isso não desestimulou os controladores do grupo, com € 23 bilhões em vendas anuais (só é menor que Home Depot e Lowe’s) e cerca de 800 lojas em 14 países.
Mesmo com a crise gerada pela pandemia, a Leroy mantém projeção de aumento de 7% a 8% nas vendas em 2020, atingindo pouco mais de R$ 6 bilhões no ano. No melhor cenário, a varejista estima alta de 15% a 20% – o mercado espera crescer cerca de 5%. “Acreditamos que o consumidor deve continuar a comprar produtos para casa, algo que ganhou força com o isolamento. Já recuperamos em maio a perda de vendas de março e abril. Achamos que a situação no Brasil pode ser melhor do que na Espanha. O cliente ficou em casa semanas, meses, isso o levou a gastar mais com o lar”, diz Ryckeboer.
No plano de expansão que ficará a cargo do novo CEO, estão previstas inaugurações em Santos (SP) e Porto Alegre em 2021. Também há terreno para construção de loja em Salvador e interesse por cidades como Cuiabá, Recife e Belém.
Quando Ryckeboer se tornou CEO, em 2006, a rede tinha 12 lojas e faturava R$ 750 milhões. Hoje o volume de lojas mais que triplicou (são 42) para receita oito vezes maior. Líder, a Leroy tem 4,5% das vendas do setor (as quatro maiores têm 13%). O Brasil é o sexto maior mercado do grupo Adeo, mas perdeu posições por causa da desvalorização do real no fim da gestão de Ryckeboer – o faturamento em euros caiu quase 50% em cinco anos.
Na Espanha, Ryckeboer não terá isso “pesando contra”. São 130 lojas do grupo naquele país, que em 2016 fundiu as cadeias Leroy e Aki. “Vou sentir falta da forma como o varejo é feito aqui. No Brasil você sempre dá um jeito de fazer as coisas, há um envolvimento das pessoas em fazer dar certo. Vamos levar o ‘omnichannel [modelo de canais de venda integrados] nosso para lá”, diz.
Fonte: Valor Econômico