21/10/2014
Por Ivone Santana | De São Paulo
A transformação da sociedade sob o ponto de vista das comunicações começa por um pequeno dispositivo implantado em equipamentos essenciais ao dia a dia das pessoas. É com um chip que as empresas de telecomunicações pretendem conquistar as áreas automotiva, de transporte, energia, segurança, saúde e seguros. Automatizados e ligados à internet, os dispositivos podem operar sem intervenção humana, em um mundo conectado conhecido como “machine to machine” (M2M).
Os números são gigantes e divergem por tipo de conceito. A Ericsson projeta 50 bilhões de dispositivos atuando globalmente como “internet das coisas” em 2020. A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) estima até 70 bilhões. Já a empresa de pesquisas Gartner prevê 26 bilhões de dispositivos. O estudo da Ericsson inclui automóveis, geladeiras, dispositivos de segurança, leitores residenciais de energia, instrumentos de medicina, enfim uma legião de máquinas que farão uma revolução, acendendo uma centelha do que será a sociedade do futuro.
Por exemplo, um sensor na residência pode gerar uma chamada para o celular do proprietário ou para uma empresa de segurança se detectar um movimento não programado ou uma invasão no imóvel. Já instrumentos de medicina podem medir a pressão arterial, sensação de fadiga, taxa de açúcar no sangue, entre diversos outros indicadores, e emitir alertas para o usuário, para médicos ou familiares, em caso de alteração.
Se o estudo sair do foco de equipamentos em geral e se concentrar só em dispositivos celulares, a Ericsson calcula 200 milhões de unidades M2M em uso, com expectativa de crescer de três a quatro vezes até 2019, para até 800 milhões. As receitas do serviço também são promissoras: 22,5 bilhões daqui a cinco anos.
O Brasil conta com 9,2 milhões de acessos M2M e a previsão é chegar a 23 milhões em 2016.
As aplicações M2M são consideradas a nova onda que vai levar bilhões de assinantes para as operadoras. Só que em vez de pessoas, são máquinas.
Um maravilhoso mundo novo na visão de alguns, uma temeridade que lembra os perigos da automação extrema que pode levar a uma revolução das máquinas, na visão de outros.
Mas a realidade é muito mais pueril. No Brasil, a principal aplicação, hoje, é para máquinas de cartão de crédito. Começa a se abrir um mundo mais amplo de iniciativas, disse Roberto Piazza, diretor de serviços digitais da Telefônica Vivo.
É o caso da rede de monitoramento de tráfego e segurança implantada pela Ericsson para a Prefeitura de São José dos Campos, interior de São Paulo. Segundo João Eduardo Yazlle, vice-presidente de estratégia e marketing da Ericsson para América Latina, o serviço, automatizado, reduziu de 12 para 9 o número de homicídios na cidade. A empresa também ajudou a Vivo a criar uma plataforma de estacionamento e semáforo inteligente para Águas de São Pedro (SP), a primeira cidade inteligente no portfólio da operadora.
“Já é um desafio conectar pessoas, imagine coisas”, disse Leonardo Capdeville, diretor de tecnologia da TIM. “A conexão de coisas é cinco vezes maior do que de pessoas. É um problema em relação a antenas.”
O assunto é complexo e já mobilizou o governo. O Ministério das Comunicações criou, neste mês, a Câmara de Gestão e Acompanhamento do Desenvolvimento de Sistemas Máquina a Máquina. A câmara é composta por representantes de quatro ministérios (Fazenda, Comunicações, Indústria e Comércio, e Ciência e Tecnologia) e BNDES. Nos próximos dias deverão ser escolhidos os representantes das teles, dos fabricantes e de desenvolvedores de software. A primeira reunião está marcada para novembro.
A Câmara de Gestão deverá formular políticas públicas para o desenvolvimento da comunicação M2M e acompanhar a evolução do setor, disse Maximiliano Martinhão, presidente do órgão e secretário de Telecomunicações do Ministério das Comunicações. Martinhão disse que é preciso assegurar a qualidade do serviço, já que “as máquinas não vão ao Procon”.
Em maio, as taxas cobradas sobre dispositivos M2M foram desoneradas em 80%. Ainda é considerado pouco. “Tem que ter política de redução fiscal, M2M não está no centro dos debates”, disse Marcelo Bechara, conselheiro da Anatel.
Segundo Martinhão, M2M cresce a uma taxa anual de 32%, índice que será muito maior futuramente. “Em 2020, cada usuário no Brasil terá sete interfaces M2M”, disse. São sensores na casa, no escritório, no carro, em pulseiras e relógios, em escova dental para detectar problemas na boca, sensores nas roupas que medem a temperatura do corpo.
“Seremos os X-Men no futuro. É a beleza da tecnologia”, disse John Xiong Yihui, presidente da área de redes de operadoras da Huawei no Brasil, referindo-se aos personagens criados pela Marvel, dotados de superpoderes.
Valor Econômico – SP