O pequeno negócio é o primeiro a sofrer com o isolamento social e a paralisação da economia. Foi com essa visão que Guilherme Weege resolveu colocar em ação uma ideia que vinha alimentando: qualificar o varejo de pequeno porte para atravessar a tempestade do coronavírus e sair dela mais forte.
Em duas semanas de trabalho intenso, “até bem depois da meia-noite”, Weege, CEO do grupo catarinense Malwee, chamou um grupo de sete amigos, todos CEOs, estabeleceu contato com o Sebrae e, junto com eles, criou uma plataforma para oferecer qualificação gratuita a pequenos varejistas de todo o país e incentivar o consumidor a comprar perto de casa.
O programa Compre do Bairro entra no ar hoje, por uma plataforma na internet (www.movimentocompredobairro.com.br), além de Facebook e Instagram.
O conteúdo oferecido terá marketing digital, ferramentas de gestão e comunicação digital com o cliente, entre outros. “As pessoas à frente do pequeno comércio não contam com certas ferramentas, informações e metodologias de gestão que os ajudem a se reinventar e se estruturar para superar esse cenário. Por isso, nada mais justo do que compartilharmos com essas pessoas os recursos”, diz o CEO da Ambev, Jean Jereissati Neto.
A iniciativa é pessoal, sem vinculação com a empresa. Estão juntos no projeto, como pessoas físicas, os CEOs Fred Trajano (Magazine Luiza), Artur Grynbaum (Grupo Boticário), Jereissati Neto (Ambev), Marcel Szajubok (Embelleze), André Street (Stone), Alcione Albanesi (FLC) e Ana Fontes (Rede Mulher Empreendedora). Cada um deles será um “embaixador” do programa.
Aos 39 anos, formado em administração de empresas com especializações pelas universidades de Harvard, Wharton e da Califórnia e pela escola de negócios francesa Insead, Weege tem origem no varejo. “Cresci no meio do pequeno comerciante”, conta. A própria empresa começou em 1968 como varejista. “A Malwee era um pequeno varejo que resolveu ser indústria quando percebeu que não era atendida em suas necessidades.”
De acordo com o Sebrae, o varejo brasileiro é dominado pelos pequenos estabelecimentos: 95% são empresas de pequeno porte. Dos 9,2 milhões de empregos formais do comércio varejista, 6,7 milhões estão nas lojas menores. No total, incluindo proprietários e informais, o varejo emprega cerca de 13 milhões de pessoas no país.
Na Malwee, o comércio de pequeno porte responde por dois terços das vendas. “Alguns, são clientes há décadas: 30, 40, 50 anos”, diz. A empresa, por já ter tradição de apoiar essa clientela, funciona como uma referência. “Eles ligam pra gente pra tudo”, revela.
Inédita, a crise da pandemia de coronavírus tornou as dúvidas maiores. Os clientes passaram a levar a Weege e sua equipe questões como “devo demitir ou devo esperar?”. Por isso, a ideia inicial de fazer um programa “dentro de casa” se transformou em uma solução mais ampla. “Sempre tive o sonho de fazer algo, algum trabalho nesse sentido, de ressegnificar nossa relação com o bairro, com a vida em comunidade”, conta. “Com a crise, tive que antecipar os planos. A oportunidade é agora.”
“Apoiá-los é fundamental”, diz o CEO do grupo Boticário, Artur Grynbaum. “Dessa maneira, eles conseguirão passar por esse momento e sairão fortalecidos, visando um futuro mais estruturado e prospero para seus negócios.”
No primeiro momento, o foco da plataforma é oferecer capacitação gerencial e financeira para os pequenos comerciantes. Mas o canal vai se prestar também à difusão de informações e troca de experiências entre os participantes. É aí que entram os embaixadores. Eles vão funcionar nas duas mãos, ampliando a visibilidade da plataforma por meio de seus canais pessoais e suas networks, para chegar a todos os potenciais usuários da plataforma. Mas vão também levar experiências de suas bases para serem compartilhadas. “Um padaria que é cliente da Ambev pode ter encontrado uma solução que sirva também para um floricultura”, exemplifica o CEO da Malwee.
A segunda etapa, prevista para depois do fim da pandemia, é levar ao consumidor a ideia de compras locais. Comprar no próprio bairro, além de fortalecer os laços comunitários, ainda ajuda na retomada econômica, diz Weege. “Queremos que o consumidor entenda que aquela compra de R$ 30 ou R$ 50 que ele vai fazer no bairro dele e parece pequena, é na verdade muito importante. Esse pequeno negócio é que vai fazer a economia girar no momento da retomada.”
“Comprar produtos nacionais e de pequenos empreendedores é uma maneira de ajudar a economia e, ao mesmo tempo, de manter viva uma cultura de confiança e proximidade”, reforça Grynbaum.
A ideia do grupo é agregar outros parceiros. Para difundir as informações, distribuidores e atacadistas serão convidados a participar. Também haverá novos agentes de capacitação além do Sebrae, incluindo consultorias de negócios. Algumas negociações estão em andamento.
Weege, Jereissatti Neto e Grymbaum entendem que a inciativa terá efeitos para além da atual crise e vai ajudar a fortalecer não só o pequeno varejo como também o restante da cadeia econômica. “Ao fortalecermos o pequeno varejista, em qualquer segmento que ele atue, também estamos fortalecendo o nosso negócio”, resume Grynbaum. “Movimentamos a economia do país, aumentamos a capacidade de consumo das pessoas e isso é bom para todos.”
Fonte: Valor Econômico