Publicitário mais conhecido do País, Washington Olivetto diz que a crise do novo coronavírus vai acarretar uma reinvenção da publicidade em todo o mundo. “É um cenário difícil para todos, mas especialmente difícil no Brasil, onde a situação é um pouco pior por causa da defasagem em relação ao resto do mundo.” Como não dá para ignorar que o ano de 2020 será “perdido”, diz Olivetto, as marcas precisam se posicionar do jeito correto – e deixar as expectativas de crescimento temporariamente de lado. “É hora de informar o cliente, e não de persuadi-lo a comprar, de tentar vender alguma coisa.”
Vivendo em Londres desde que deixou o dia a dia da WMcCann, em 2017, o publicitário acompanha de perto o comportamento das marcas. Nesse cenário de coronavírus, ele lembra que algumas companhias conseguiram agir rapidamente. Ele destaca o caso da Coca-Cola, que suspendeu as campanhas relacionadas a produtos em todo o mundo. No Brasil, ele lembra ações de O Boticário, Ambev e Alpargatas, que agiram para tentar dar sua contribuição em um momento em que o mundo todo deve se unir para combater uma pandemia.
O publicitário também fez uma analogia entre a quarentena atual e os quase dois meses em que ficou confinado ao ser sequestrado, entre o fim de 2001 e o início de 2002, no Brasil. “Eu tenho me comportando de maneira semelhante à que me comportei naqueles 53 dias. Estou me preocupando e tomando todas as precauções, mas sem medo. Porque o medo baixa a imunidade.”
Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista de Olivetto ao Estadão:
Confinamento
“Tenho certa experiência em ficar confinado. Tenho me comportado de um jeito parecido com o que eu me comportei nos 53 dias do meu sequestro, entre 11 de dezembro de 2001 e 2 de fevereiro de 2002. Estou me preocupando e tomando todas as precauções, mas sem medo. Porque o medo baixa a imunidade.”
Posicionamento de marcas
“A Coca-Cola, por exemplo, já tomou a atitude de cancelar todas as campanhas de produtos. Vai investir todos os recursos em informação ou até em doação das verbas de publicidade para causas. Esse é o momento em que as empresas devem investir em informação e não em persuasão. É hora de informar, não de persuadir. Não é hora de vender.”
Solidariedade
“Eu vejo que essa onda de solidariedade chegou ao Brasil, com ações de empresas como Alpargatas, Ambev e Boticário. As empresas de telefonia vêm investindo em informação. E, com todas as críticas que temos às escravidões tecnológicas, não dá para imaginar hoje um mundo em que a gente não possa conversar com parentes ou amigos pelo WhatsApp.”
Ano perdido
“Sob o ponto de vista de negócio não há como esconder 2020 que será um ano perdido. Curiosamente, eu leio algumas coisas no sentido contrário – mas isso é tapar o sol com a falta de peneira, ou é gente se fazendo de Poliana. A verdade é a seguinte: a publicidade mundial que já ia mal. E no Brasil ia pior ainda, porque precisava se reinventar. Agora, ficou claro que vai ter de se ‘re-reinventar’.”
Ineditismo
“Comecei a trabalhar muito cedo, e essa crise é totalmente diferente do que eu já vivi. E eu já vivi todas as circunstâncias de euforia e crises que minha atividade ofereceu. Nunca tinha visto algo igual. Nem no trabalho nem na vida.”
Saúde x economia
“À distância, no Brasil, o que me assusta é que a saúde não pode ser transformada em um problema político. Não se pode culpar a saúde pelos problemas econômicos já existentes. Poucas vezes houve um momento em que se precisasse tanto de bom senso. De saber equalizar as coisas bem. Precisamos ter a formulação correta para resolver o problema.”
Algo de bom?
“Meus filhos têm me mostrado exemplos de renascimento da natureza, como em Veneza, na Itália. Os veículos de comunicação e os artistas estão se mostrando unidos e generosos. Na Itália, em meio à peste, as pessoas cantaram nas janelas. Acho que, de vez em quando, a natureza precisa nos dar uns sustos.”
Fonte: Estadão