O varejo se prepara para o primeiro Natal no azul, após dois anos de crise. Mas a recuperação da economia e o aquecimento das vendas são sinônimos de preocupação para o setor que, para dar conta do crescimento da demanda, precisa superar desafios de infraestrutura e logística, em um cenário de disparada dos roubos de carga. Esse tipo de crime, cada vez mais frequente no Rio, compromete a distribuição e a entrega de produtos.
Este ano, houve 8.508 roubos de carga, entre janeiro e outubro, uma alta de 14,3% em relação ao mesmo período de 2016. Segundo um levantamento feito pela empresa de logística Intelipost, com base em cinco milhões de pedidos processados nos últimos três meses, 12,9% das entregas via Correios precisaram de alguma medida adicional de segurança, como escolta armada ou carro especial. O percentual é muito maior do que a média nacional: no país, a fatia de entrega diferenciada é de 1,6%.
— Além de custos adicionais de seguro, isso aumenta em sete dias o tempo de entrega. Para lidar com esse problema, a loja precisa informar ao consumidor quando ele se encontra nessas áreas (de risco), que muitas vezes pode estar a poucos metros de outro CEP com entrega regular. Isso pode ser motivo de frustração — disse Gabriel Drummond, diretor da Intelipost.
De acordo com consultorias, a Via Varejo, para minimizar o risco dos desvios de produtos, está ampliando a frota própria e abastecendo os centros de distribuição. A Magazine Luiza está deixando de entregar pedidos online para o Rio. Outras redes vêm ampliando o sistema de compre na web e retire na loja. Para especialistas em logística, a integração das plataformas online e offline tem aparência de inovação, mas ajuda o varejo a cumprir as metas de venda.
— Quando está na malha de uma transportadora, você não domina as rotas e pode estar sujeito a ataques — explicou Ana Paula Tozzi, CEO comercial da AGR Consultores.
‘Entrega livro, mas não entrega geladeira’, diz varejista de e-commerce
A Confederação Nacional do Comércio (CNC) estima que as vendas de fim de ano movimentarão R$ 34,7 bilhões no setor, uma alta de 4,8% em relação ao ano passado. Para Juedir Teixeira, de 65 anos, dono de duas redes varejistas — uma de material de construção e outra de moda —, o comércio já sente o aquecimento dos negócios.
— Os consumidores já estão voltando a utilizar o crédito parcelado. Nossa expectativa é de alta entre 5% a 8% em relação ao ano passado — disse Teixeira, acrescentando que os varejistas enfrentam um desafio logístico constante.
Segundo Alessandro Gil, diretor de experiência da VTEX, plataforma de e-commerce, o serviço mais procurado para lidar com os problemas de logística é o de geolocalização e restrição de entregas:
— Muitos varejistas têm um preparo logístico interno para fazer esse remanejamento de mercadorias entre centro de distribuição e loja. Restringir o modal (meio) de entrega é outra opção, usando motoboy, por exemplo. Ou ainda restringir produtos: em determinadas regiões, entregam-se livros, mas não geladeiras.
Depoimento: ‘Loja recusou meu CEP no Rio’, diz Jorge de Lima, técnico de tecnologia da informação, de 42 anos.
“Tentei fazer a compra de um monitor novo na loja virtual do supermercado Carrefour. Informei o endereço de entrega da minha casa, em Vila Isabel, na Zona Norte, mas o CEP foi recusado como fora da área de entrega da loja. Tentei a entrega no endereço da empresa onde trabalho, no Centro do Rio. Mas, para minha surpresa, também foi recusado, apesar de ser o centro financeiro da cidade. Achei estranho se recusarem a entregar no Castelo. Liguei, então, para perguntar qual o problema, e a atendente me informou que, em alguns lugares, eles não fazem entregas de produtos comprados pela internet. A última tentativa foi utilizar o endereço da minha sogra, que mora na Avenida Maracanã, na Tijuca, a dois quilômetros da minha casa. O CEP da residência dela foi aprovado na hora, mas com a cobrança de uma taxa de entrega de R$ 20 e um prazo de 15 dias. Eu sempre compro produtos pela internet, e essa foi a primeira vez em que encontrei uma restrição tão severa”.
Fretes mais caros para arcar com seguros
Entrevista: Samuel Gonsales, diretor da e-Millennium ERP Omnichannel
Que desafio o aumento da demanda representa para a logística do ecommerce?
Os lojistas buscam acordos com as transportadoras especializadas para diminuir os impactos e, em muitos casos, comunicam aos consumidores prazos maiores do que o normal, devido à grande demanda.
No caso do Rio, como lidar com questões de segurança?
O Rio de Janeiro é realmente uma exceção no momento. Os lojistas já investem valores de fretes mais altos para arcar com seguros. Porém, invariavelmente, os problemas de segurança acabam por provocar atrasos na entrega, e isso reduz a credibilidade.
Muitos varejistas têm restrições de entrega em alguns CEPs. Que riscos essas restrições impõem à logística de entrega?
As restrições de entregas são medidas adotadas pelas transportadoras, e não pelos lojistas. As transportadoras criam tais restrições para assegurar que as mercadorias estejam mais protegidas, evitando furtos e roubos em determinadas localidades. Para os consumidores que arcam com o valor do frete esperando receber as mercadorias em suas casas, é frustrante.
Natal digital diversifica canais de venda
Para Ulysses Reis, coordenador do MBA em Gestão de Varejo da Fundação Getulio Vargas (FGV), a característica marcante deste Natal é o uso de vários canais alternativos de compra e venda, especialmente por meio do smartphone, com integração dos canais online e físico, seja na pesquisa de preços e produtos, seja na aquisição pela internet com retirada em lojas físicas:
— Este vai ser um Natal mais digital. Os perfis de vendas e consumo mudaram muito, e os lojistas não estão investindo tanto em estoque. Os consumidores não vão só à loja e ao shopping; 85% dos consumidores vão navegar na internet para pesquisar preços tanto em lojas físicas quanto virtuais.
O professor da FGV lembra, ainda, que as mudanças de perfis levaram à adaptação das estratégias do varejo.
— Os lojistas também começaram a usar a internet como opção. Por isso, não precisam ter estoque. O risco é menor ao concentrar os produtos em um centro de distribuição que abastece as lojas sob demanda — afirmou Reis.
Cerca de 30% dos compradores anteciparam as aquisições de presentes para o Natal durante a Black Friday, que ocorreu em 24 de novembro.
Fonte: Extra