Pode ser que o apelo sustentável tenha surtido efeito e mais brasileiros queiram se tornar consumidores conscientes. Ou pode ser mais uma consequência da recessão. O fato é que a moda de compartilhar está ganhando espaço também entre os milionários. No último ano, surgiram dezenas de empresas, aqui e no exterior, especializadas em atender endinheirados interessados em dividir a propriedade de iates, aviões, imóveis, cavalos, obras de arte e até campos de golfe e vinícolas.
Para convencer quem tem dinheiro de que é possível dividir sem parecer desesperado ou sem passar vergonha perante os pares, as empresas especializadas nesse segmento criaram modelos diferentes dos que existiam no passado. Em vez de entrar num grupo que reúne dezenas de desconhecidos que se organizam para compartilhar o uso de quartos de hotel ou de helicópteros, hoje essa turma faz parte de pequenos grupos que escolhem o que e como vão dividir.
Eles dizem o que querem ter — por exemplo, um apartamento em Nova York, uma aeronave ou uma casa na praia no Brasil — e empresas como iShare, One4Club e Avantto fazem uma seleção dos itens que estão à venda. Em seguida, essas empresas encontram outros clientes dispostos a dividir a conta e apresentam um projeto de compartilhamento. Quando todos concordam, os clientes fazem a compra em conjunto e o bem fica registrado no nome de uma empresa criada apenas para aquela sociedade, que também é responsável por cuidar da manutenção e, se for o caso, da contratação de funcionários e da decoração.
Outra empresa que atua nesse mercado, a Prime Fraction Club, que tem a corretora Planner entre os sócios, dispõe de um modelo um pouco diferente: primeiro compra o que quer e depois encontra os interessados em compartilhar (como os tempos não estão fáceis para ninguém, a companhia oferece financiamento em 120 meses. Assim as parcelas cabem nos gordos bolsos de sua clientela).
O cálculo que as empresas de compartilhamento fazem para os clientes é o seguinte: em vez de gastar 15 milhões de reais na compra de um avião para alguns poucos passageiros, por que não ter ainda um barco, uma casa no campo e um helicóptero gastando a mesma coisa? “O proprietário de uma lancha ou mesmo de um imóvel no exterior paga por esses bens 365 dias no ano, mas usa, no máximo, 30 dias”, diz Marcus Matta, fundador da Prime Fraction. O desafio é fazer com que o cliente pense que o bem é só dele.
“Quando ele chega à casa que compartilha, o porta-retratos na cabeceira da cama é o dos filhos dele, o vinho na adega é o que ele escolheu e o chef vai preparar o que a família gosta de comer”, diz Zeca Rudge, ex-vice-presidente do banco Itaú e um dos fundadores da iShare, que foi criada neste ano e prevê faturar 20 milhões de reais em 12 meses (as concorrentes não divulgam as receitas). Essas empresas ganham dinheiro, principalmente, intermediando a compra dos bens, quando recebem uma comissão que varia de 5% a 10% do valor da aquisição. Também são remuneradas se ajudam a organizar festas e jantares e a decorar barcos e imóveis.
Até agora os ricos brasileiros têm compartilhado basicamente imóveis (aqui e no exterior), aeronaves, iates, helicópteros e aviões. No exterior, onde esse tipo de serviço existe há mais tempo, a diversidade de opções é muito maior — vai de ternos e bolsas de grifes a campos de golfe e vinícolas. É possível, por exemplo, comprar uma vinícola de forma compartilhada no sul da França.
Cada proprietário tem direito a se hospedar num imóvel dentro da propriedade por algumas semanas no ano, receber 20 garrafas do vinho produzido ali e uma participação nos lucros das vendas de vinhos. Cursos de francês e de produção de vinhos também podem ser agendados com os produtores. Custa 1,6 milhão de reais por pessoa, fora os custos de manutenção. Se você achou barato, é o tipo de cliente que as empresas de compartilhamento querem ter. Se achou caro, há sempre um vinho no supermercado para chamar de seu — e só seu.