A equipe econômica do governo e senadores acertaram a estratégia para criar os fundos de compensação de perdas e de desenvolvimento regional, necessários para que finalmente saia do papel a aguardada reforma com unificação das alíquotas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Na reunião de terça-feira à noite, que durou mais de três horas, os senadores Romero Jucá (PMDB-RR), Delcídio do Amaral (PT-MS) e Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), acompanhados por Heleno Taveira Tôrres, professor de direito financeiro da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), estiveram com o ministro da Fazenda, Joaquim Levy; o secretário-executivo adjunto, Fabrício Leite; e o secretário da Receita, Jorge Rachid, para tratar do tema.
Hoje a proposta será apresentada a outros senadores. Ficou acertado que o processo se dará em três frentes: a repatriação de recursos do exterior será feita com a aprovação de um substitutivo apresentado por Delcídio, baseado no projeto de Randolfe, que por sua vez foi elaborado pelo professor Heleno Tôrres.
O governo editará, nos próximos dias, uma Medida Provisória prevendo que os recursos provenientes de repatriação serão usados para constituir dois fundos: um de compensação financeira de perdas dos Estados e outro para melhora de infraestrutura regional. E o Senado aprovará uma Resolução que definirá a divisão desses fundos entre os Estados. Com isso, estará dado o cenário necessário para que as alíquotas do ICMS migrem, de maneira escalonada nos próximos anos, para 4%.
A tramitação das matérias, espera-se, será rápida: como Delcídio é presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), a proposta de repatriação ganhará prioridade para ser aprovada na CAE já na próxima terça-feira. A ideia é levar o texto para o plenário na quarta-feira, antes portanto do recesso parlamentar, que se inicia a partir do dia 17.
Com o voo de volta e aula marcada ontem em São Paulo, o professor Heleno Tôrres acabou adiando compromissos diante do pedido da equipe econômica para que permanecesse em Brasília e ajudasse nos retoques finais ao pacote de medidas.
O contato entre Tôrres e o senador do PSOL foi estabelecido a partir de uma audiência da CPI que investiga irregularidades praticadas pelo HSBC na abertura de contas na Suíça. Nela, o professor estimou que só neste caso correntistas teriam movimentado aproximadamente US$ 7 bilhões à margem do fisco brasileiro, o que levou Randolfe a convidá-lo para elaborar um projeto para regularizar bens não declarados mantidos no exterior.
Os números ainda não estão fechados, mas pela proposta que está sendo alinhavada, sobre o valor repatriado incidiria alíquota de 17,5% a título de Imposto de Renda e outros 17,5% como multa, totalizando 35% em relação ao valor total.
O texto da MP também estabelece regras de proteção para que empresas e pessoas físicas que aceitarem a repatriação dos recursos não sejam alvo de futuros processos judiciais. A possibilidade de questionamentos judiciais, segundo técnicos da Receita, poderia inviabilizar ou trazer montantes muitos baixos com repatriação.
Uma fonte envolvida nas negociações destacou ainda que haverá uma vinculação de recursos para o fundo, mas não será constitucional, como queriam parlamentares e governadores do Nordeste. A vinculação de recursos do orçamento para os fundos de compensação dos Estados pela reforma do ICMS tem sido o principal entrave para que os Estados, em especial os nordestinos, apoiem a unificação da alíquota do ICMS no país.
Desde meados de junho, Levy já recebeu oito governadores, sendo seis do Nordeste, em seu gabinete para tratar da reforma.
Além da repatriação, outra proposta colocada na mesa é utilizar parte dos recursos que devem entrar nos cofres do governo com a reforma do PIS/Cofins. Neste desenho, a repatriação bancaria apenas um dos fundos, e não os dois.
As negociações chegaram ao conhecimento do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que tratou do tema hoje com o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), a quem recebeu em almoço em sua residência. “O Congresso Nacional aceita que haja qualquer coisa nova, inclusive repatriação de capitais, desde que tenha regras claras, critérios de transparência”, disse Renan, mostrando-se favorável à medida. “Conversamos com senadores da comissão [do pacto federativo] e com governadores”, contou.
Alckmin também falou a respeito. “Acho que fechando essa equação, tem boa possibilidade disso avançar. Desde que haja esse fundo de compensação é perfeitamente possível se fazer um bom entendimento, com uma redução das alíquotas interestaduais, o que é bom para o país, evita a guerra fiscal”, apontou Alckmin.
Valor Econômico – SP