29/06/2015 14h50
A estratégia da varejistastem sido colocada em xeque pelo mercado, que aponta resultados financeiros considerados frustrantes
Depois de crescer vertiginosamente entre 2007 e o início de 2012, período marcado por uma ampla reestruturação de seus negócios, que incluiu lançamento e reposicionamento de marcas, diversificação de produtos e abertura de lojas, a Cia. Hering tem passado por um momento desafiador, que vai além da desaceleração do cenário macroeconômico.
A estratégia de uma das maiores varejistas do país tem sido colocada em xeque pelo mercado, que aponta resultados financeiros considerados frustrantes, relação estremecida com seus franqueados e até mau gerenciamento de estoques. Diante de todos esses desafios, analistas e especialistas do setor têm tentado responder a uma pergunta: qual é a proposta de valor da Hering? “Ainda não entendemos se a companhia é voltada para moda básica ou para moda fashion. Isso está muito nebuloso”, diz Tales Paes, analista do Banco Fator.
Os níveis de estoque da companhia também vêm sendo questionados. “Os estoques da Hering acumulam 130 dias (quando a média no varejo é de 80 dias). Com isso, ao desovarem coleções que não decolaram para queima de estoque, a empresa acaba perdendo margem”, afirma uma fonte. Quando, em 2007, a companhia – conhecida por suas camisetas básicas – se reposicionou, com coleção diversificada, como jeans e roupas de esportes, por exemplo, as vendas da Hering explodiram, impulsionadas pelo consumo da nova classe média.
Esse movimento foi aplaudido pelo mercado: o valor da companhia saltou de cerca de R$ 600 milhões, em 2007, atingindo o pico, de R$ 8 bilhões, em março de 2012. Depois disso, o valor de mercado da Hering despencou e é avaliado atualmente em aproximadamente R$ 2 bilhões. “No período do boom da economia esses problemas não ficavam tão claros”, observa Guilherme de Assis, do Brasil Plural, que também vê problema no direcionamento da marca. “Mas, nos últimos anos, desafios de gestão e com sua coleção, além da canibalização entre franqueados e lojas de multimarcas, se tornaram evidentes. Sem contar que concorrentes, como Renner e Riachuelo, se reposicionaram e avançaram. Hoje, a Renner, sem dúvida, destoa (em eficiência ) neste setor.”
Poder da marca
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Fábio Hering, presidente da varejista, diz que o mercado tem uma imagem equivocada da companhia. “A marca Hering é uma das mais valiosas do Brasil (ficou em 15º lugar em 2014, segundo a Interbrands). Nossa moda é um estilo casual e nossa marca é democrática, atendendo todas as classes sociais”, diz. “Lançamos seis coleções por ano.”
De fato, ninguém discorda do poder da marca Hering e da tradição da empresa, fundada há 135 anos. Mas só a marca não tem sido capaz de gerar bons resultados. Há pelo menos três anos a empresa registra queda de margens brutas: de 44,5%, no quarto trimestre de 2007, foi para 36,9% no primeiro trimestre de 2015.
“Essas margens já ficaram acima de 50% (a Renner encerrou o primeiro trimestre com 54,4%, a Riachuelo com 54,6% e Lojas Marisa, com 49,4%)”, diz Assis. Neste primeiro trimestre, a receita líquida da Hering caiu 12%, para R$ 394,4 milhões. As vendas das mesmas lojas recuaram 1,9% no período (abertas há mais de 12 meses). Na comparação com outras varejistas de capital aberto e que atuam nas classes A, B e C, as vendas das mesmas lojas da Renner subiram 16,5% em igual período, enquanto a Riachuelo avançou 5,8%. Já a Lojas Marisa, com apelo mais popular, recuou 4,8%.
O caso da Hering difere das demais por ter em sua estrutura franqueados – a companhia conta com cerca de 830 lojas, das quais apenas 60 são próprias. Esse modelo, se bem gerenciado, não traz problemas ao controlador, de acordo com o consultor Marcelo Cherto, um dos maiores especialistas em franquias do país. “O que torna a estrutura frágil é a falta de diálogo entre as empresas e seus franqueados.”
De acordo com fontes, a Hering tem enfrentado problemas com parte de seus franqueados. Segundo Paes, do Fator, a empresa enfrenta uma espécie de círculo vicioso. “A companhia diz que os franqueados não compram suas coleções. Já os franqueados argumentam que não conseguem desovar produtos de coleções defasadas. É preciso fazer ajustes.” Para Cherto, não se vive o varejo com planilhas. “Tem de ter conversa com o chão de loja, saber das necessidades.”
A Hering nega problemas com os franqueados. “Fazemos encontros anuais com todos e pesquisa de satisfação, além de uma boa relação há 20 anos.” Em 2013, a empresa fez uma mudança na sua estrutura de gestão, segregando executivos por marcas. Nos últimos meses, tem reforçado reposicionamento de marcas. Os investimentos para este ano estão previstos em R$ 101,2 milhões. Desse total, R$ 29,85 milhões serão destinados a lojas e R$ 30,1 milhões, em tecnologia da informação. Hering reconhece que o varejo está retraído, mas diz que a companhia tem trabalhado para entregar bons resultados. Já o mercado ainda está cético em relação às mudanças e espera os próximos resultados para cobrar as promessas da Hering.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo
Revista Época Negócios on-line – SP