Decisão do TRF-4 criou a possibilidade de afastar tributações sobre tais práticas comuns no relacionamento com fornecedores. Especialista orienta como o varejista deve agir
Por Redação
Não é novidade para ninguém que são inúmeros os desafios diários que o varejista tem na condução dos negócios para garantir o correto funcionamento dos supermercados e, consequentemente, obter êxito na conquista das apertadas margens de lucro. Aliadas a isso, as ações que são resultado da parceria com os fornecedores contribuem positivamente para as mais diferentes iniciativas promovidas nas lojas, como forma de gerar, por exemplo, experimentação e compras mais atrativas ao público final, impulsionando assim as vendas.
Um cenário, no entanto, acaba impactando nessa relação entre o varejo e a indústria: o pagamento de PIS e Cofins sobre bonificações concedidas em mercadorias e descontos oferecidos pelos fornecedores. O ponto é que os varejistas argumentam que tanto as bonificações como os descontos devem ser classificados como redução do custo de aquisição e não podem ser classificados como receita, o que levou a questão a ser judicializada. Diante desta realidade, na penúltima semana de agosto, o setor obteve no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) um relevante precedente contra o pagamento de PIS e Cofins sobre as bonificações disponibilizadas em mercadorias e descontos concedidos pelos fornecedores. O fato se deu por conta de os desembargadores entenderem que tais ações não têm natureza de receita e, desse modo, não podem ser tributados. Trata-se do caso da rede Walmart, processo nº 5052835-04.2019.4.04.7100, cuja decisão foi veiculada como um dos primeiros precedentes de segundo grau que apresenta relevância e notoriedade por especialistas no assunto. É importante destacar, no entanto, que os desembargadores fizeram a observação de que o entendimento não é válido para o oferecimento de desconto por meio de devolução em dinheiro ao varejista, ação essa que é pouco praticada nos dias de hoje. O cenário atual de tais tributações Para melhor entendimento da realidade vivenciada atualmente no mercado, Amanda Neuenfeld Pegoraro, diretora do escritório Simões Pires Advogados, traz mais informações. “No que diz respeito ao impacto tributário de tais negociações, a dúvida que surge é se o PIS e a Cofins deveriam ou não incidir sobre as bonificações. Para a legislação tributária, esses descontos possuem previsões diferentes dependendo da forma em que são recebidos, sendo condicionais ou incondicionais, adicionados à nota fiscal e vinculados a venda ou não. Situações divergentes acabam alterando a forma de tributação pela interpretação da Receita Federal do Brasil (RFB) e dos tribunais, o que geram dúvidas e insegurança aos contribuintes, muitas vezes acarretando autos de infração”, detalha. Foi então, nesse sentido, como explica Amanda, que os contribuintes obtiveram o importante precedente judicial para as discussões sobre os descontos e bonificações e o recolhimento dessas tributações. Ela detalha a decisão do TRF-4, que apontou que, ao comprar com desconto, o contribuinte reduz o seu custo de aquisição e isso não tem a natureza jurídica de receita para efeitos de incidência das contribuições ao PIS/Cofins. Desse modo, o fato de a redução do custo de aquisição aumentar o patrimônio líquido não tem relevância, porque não se está diante de tributos que incidem sobre variação patrimonial positiva, mas sobre receitas. “O presente caso versou sobre contratos de fidelidade, os quais culminavam em descontos financeiros no momento do pagamento das compras pelo varejista, uma das práticas que geram divergência sobre a tributação pela RFB. Nesse sentido, tais precedentes e discussões demonstram a importância de o varejista estar atento à eficiência fiscal tributária, sempre atualizado sobre os temas, para conhecimento do que pode ser uma oportunidade de recuperação, redução de tributos ou mesmo um risco”, ressalta a diretora do escritório Simões Pires Advogados. As autuações aos contribuintes Em razão às divergências no entendimento sobre a natureza dos descontos e sua tributação, Amanda explica que as autuações aos contribuintes já ocorrem há alguns anos, em questionamentos e fiscalizações pontuais pela RFB. “A relevância do julgamento da última semana traduz a necessidade de o varejo discutir as situações e obter uma interpretação de acordo com e realidade da operação”, discorre. Para a profissional, os varejistas devem analisar e compreender os benefícios que recebem para calcular o impacto de tais operações na sua tributação, instrumentos específicos e a compreensão de qual melhor caminho de lançamento e recebimento dos benefícios que impactam o valor efetivo. A decisão do TRF-4, entretanto, é um importante precedente para que os varejistas tenham conhecimento dos impactos de suas decisões e possam negociar seus benefícios com um maior direcionamento no ponto de vista tributário, conforme descreve Amanda. “O conhecimento de que suas operações e decisões podem impactar na sua concorrência não apenas do ponto de vista da sua atividade econômica, mas também tributário, e que cada dia mais se confirma a necessidade de uma análise e acompanhamento detalhado”, acrescenta. Amanda deixa claro que a legislação tributária exige das empresas uma interpretação constante e atualizada, e a tributação deve ser analisada de acordo com a análise da operação. Isso significa que, caso se verifique que a tributação foi indevida, será possível realizar a recuperação dos valores (sempre dos últimos cinco anos, que é o período prescricional) e definir para manutenção ou não da tributação para os próximos períodos. “Ainda, de acordo com o tema se define se a implementação será administrativa ou judicial (ajuizamento de processo)”, esclarece. Ao receber um auto de infração, a empresa deve se aproveitar ao máximo a defesa na instância administrativa a qual, quando bem instruída, pode finalizar a discussão ou reduzir consideravelmente o auto de infração. “Ainda, cabe frisar que com a finalização da discussão administrativa, caso não se tenha êxito a empresa ainda poderá discutir judicialmente. Por isso, quanto mais elementos fáticos demonstrarmos administrativamente, aliados a precedentes judiciais, maiores a chance de êxito do contribuinte”, salienta Amanda.
Fonte: S.A. Varejo