O varejo online de moda apresenta neste ano aumento de vendas expressivo, na faixa de 30%, bem acima da média do comércio eletrônico total e do varejo físico de roupas. Apesar da pujança no faturamento, as companhias dedicadas exclusivamente a vender roupa, calçados e acessórios pela internet não têm lucro.
Competição acirrada, exigindo contínuas promoções; gastos com frete grátis; e a estratégia de conquistar mais clientes agora, deixando o lucro para mais adiante, ajudam a explicar as contas no vermelho.
No primeiro semestre, o varejo de moda on-line cresceu 27,9%, chegando a 7,4 milhões de pedidos, em comparação ao primeiro semestre do ano passado. Em receita, o aumento foi de 37,8%, para R$ 1,35 bilhão, segundo a consultoria Ebit.
O comércio eletrônico total, no mesmo período, cresceu 3,9% em volume e 7,5% em valor. E o varejo físico de roupas teve alta de 5,8% em volume e de 8,2% em receita nominal, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O ritmo impressionante de vendas na internet, no entanto, não significa que a operação seja lucrativa. As companhias que vendem somente artigos de moda pela internet enfrentam dificuldades para deixar o balanço no azul. A Netshoes, dono dos sites Netshoes e Zattini, e a Dafiti, controlada pela Global Fashion Group (GFG), são dois exemplos.
No segundo trimestre deste ano, a Netshoes teve alta de 14,9% na receita líquida no Brasil, para R$ 407,5 milhões. O prejuízo líquido no país chegou a R$ 16,1 milhões, ante R$ 17,7 milhões no mesmo intervalo de 2016.
A Dafiti, no mesmo período, teve alta de 17,3% na receita líquida, para R$ 599,3 milhões. A empresa não divulgou seu prejuízo no Brasil. No mundo, a GFG registrou alta de 25,6%, para R$ 1 bilhão. O prejuízo antes de juros, impostos, depreciação e amortização de foi de R$ 42,4 milhões.
Em termos de lucratividade, as empresas de e-commerce perdem em disparado para as varejistas de moda tradicionais. Entre estas, apenas Marisa e Inbrands fecharam o segundo trimestre com prejuízo (ver tabela nesta página).
Otavio Lyra, diretor financeiro da Netshoes, disse que o prejuízo líquido é resultado principalmente de perdas nas operações de Argentina e México, países em que a companhia está em fase de expansão acelerada. No Brasil, o prejuízo líquido foi de R$ 16,1 milhões, ante uma perda de R$ 17,7 milhões em igual intervalo do ano passado.
A companhia, diz Lyra, optou no segundo trimestre por crescer em participação de mercado, abrindo mão de rentabilidade no curto prazo. Por isso, elevou gastos com marketing e ofereceu mais descontos para atrair consumidores.
“A Netshoes tem buscado um equilíbrio entre crescimento e melhora da rentabilidade. A operação no Brasil cresce de forma saudável. No México e na Argentina, o negócio está em um estágio diferente de maturação, mas todas as operações estão no caminho correto”, afirmou o diretor financeiro.
Ele observou que a concorrência no varejo on-line de moda está mais acirrada, o que exige da Netshoes mais ações de marketing e promoções. O diretor financeiro diz ainda que os gastos com frete são um fator que pesou sobre os custos da Netshoes no período. No segundo trimestre, a companhia ampliou a oferta do frete grátis no Brasil e no México.
As empresas de comércio eletrônico têm reduzido gradualmente as vendas com frete grátis, como forma de controlar custos, diz o presidente da Ebit, Pedro Guasti. Mas esse tipo de venda ainda é importante. No segundo trimestre deste ano, 38% das vendas on-line no país foram com frete grátis, ante 42% no segundo trimestre de 2016. O total de fretes pagos pelos clientes foi de R$ 1,03 bilhão no trimestre, com preço médio de R$ 29,93 por entrega. “As empresas que também têm operação em loja física conseguem diluir melhor os custos e ter uma operação positiva”, observa Guasti.
“A paciência do investidor no Brasil é menor. Por isso as empresas abrem capital no exterior”, diz Povel
Philipp Povel, presidente e sócio-fundador da Dafiti, disse que o custo de frete alto no Brasil, a demanda crescente de investimentos em automação nos centros de distribuição e em publicidade para atrair novos clientes pesam sobre os resultados. “O lucro líquido é algo que falta para a maioria das empresas e também vai faltar para a Dafiti neste ano”, afirmou Povel. A empresa tem se esforçado para aumentar a rentabilidade, cortando investimento para expandir o número de clientes ativos.
Mesmo no vermelho, tanto Povel quanto Lyra afirmaram que a Dafiti e a Netshoes estão com caixa saudável para dar seguimento às operações no Brasil e que as empresas não têm necessidade de captação nova de recursos no curto prazo.
“O Brasil não é diferente de outras regiões, não se destaca por ser um país menos rentável no comércio eletrônico. A questão é que a paciência do investidor no Brasil é menor. Por isso as empresas preferem abrir capital no exterior. Tanto a Dafiti quanto a Netshoes podem fazer lucro mês que vem se quiserem. Mas a consideração que se faz é que crescer hoje em vendas e clientes é mais barato do que crescer amanhã”, observou Povel.
O executivo observou que outras empresas gigantes de internet que estão no mercado há mais de uma década ainda apresentam prejuízo ou lucro muito baixo. A Amazon é um exemplo. Maior empresa de comércio eletrônico do mundo, a companhia apresentou no segundo trimestre uma receita líquida de US$ 37,9 bilhões para um lucro líquido de US$ 197 milhões. As despesas operacionais chegaram a US$ 37,33 bilhões, ou 98,3% da receita gerada. As despesas com vendas somaram US$ 23,45 bilhões, ou 61,9% da receita líquida da companhia no período.
Os problemas que afetam a lucratividade das empresas de moda exclusivamente on-line são os mesmos que afetam outros sites de comércio eletrônico, na avaliação do presidente da Ebit. “A competição é bastante acirrada no comércio eletrônico. E no Brasil, o mercado acostumou mal o consumidor com o frete grátis. A conta não fecha”, afirmou Guasti.
De acordo com dados compilados pelo Valor Data, no segundo trimestre, o custo médio de vendas das varejistas de moda Renner, Riachuelo, Cia. Hering, Marisa, Restoque e Inbrands chegou a 43,6% da receita líquida das companhias. Já entre as empresas de comércio eletrônico – Netshoes, Dafiti, B2W, Via Varej o, Magazine Luiza e Mercado Livre – o custo de vendas chegou a 64,4% da receita líquida.
As despesas operacionais, que incluem gastos com marketing e administração do negócio, das empresas de comércio eletrônico são mais baixas, chegando a 27,2% da receita líquida. No varejo físico, que emprega mais funcionários do que as empresas on-line e também gasta com aluguel de lojas, a despesa operacional corresponde a 41,3% da receita líquida alcançada.
As despesas financeiras são bem parecidas: no comércio eletrônico, elas equivalem a 4,8% da receita líquida. No varejo físico chegam a 5%.
O presidente da Ebit também citou como fator que pesa nos custos das empresas on-line as despesas com publicidade. E a disputa de preços na internet é mais acirrada do que no varejo físico. No primeiro semestre, os preços das roupas subiram em média 1,66%, segundo o índice oficial de inflação (IPCA), do IBGE. Já no comércio eletrônico, o Índice Fipe Buscapé apontou uma deflação de 4,51% na categoria de moda.
Fonte: Valor Econômico