Mobly Usados funciona como marketplace peer to peer e tem como diferencial o serviço de retirada do móvel na casa de quem vende e entrega na casa de quem comprou
Por Marcelo Satake
O dilema é recorrente. Quem já não comprou um sofá ou uma mesa nova e se deparou com a questão: o que fazer com o móvel que será substituído? Vender? Doar? Descartar? E o principal: como colocar em prática qualquer uma das decisões sem dor de cabeça?
O que para muitos é sinônimo de “abacaxi” se transformou em uma oportunidade milionária de negócios para o maior marketplace de móveis novos do país. Com ganhos de sinergia para o seu core business.
A Mobly (MBLY3) lançou uma startup, a Mobly Usados, em que busca resolver as dores de quem pretende se desfazer de um móvel. E de quem pretende adquirir um usado.
“Pensamos: vamos entender o consumidor e identificar onde está a oportunidade. Fizemos pesquisas na nossa base de clientes e elas revelaram que nove em cada dez já haviam considerado comprar móveis usados em algum momento”, disse Victor Noda, CEO e cofundador da Mobly, em entrevista à EXAME Invest.
“E a principal razão apontada como obstáculo foi a falta de uma operação logística que garantisse a entrega do móvel usado em sua casa de modo confiável.”
Com a informação em mãos, ele e os demais sócios, Marcelo Marques e Mário Fernandes, partiram para estruturar a operação. Para liderar a startup dentro da startup, escolheram Lucas Andrade, Head de Novos Negócios da Mobly e profissional que estava antes no PicPay.
“Lançamos uma plataforma que tem um sortimento de móveis usados com descrição, fotos etc. e que passaram pela nossa curadoria antes de serem anunciados, para melhorar a experiência do usuário; realizamos a transação financeira garantindo a sua segurança. E o diferencial: retiramos o móvel na casa de quem vende e entregamos na de quem comprou”, disse Noda. É um marketplace peer to peer.
A operação de retirada e entrega só se tornou possível, com números que fecham a conta, porque a empresa tem dentro de casa a sua própria unidade de logística, a MoblyLog.
O mercado de móveis usados tem tamanho estimado entre 8 bilhões e 10 bilhões de reais no país, fragmentado e em boa parte informal, com grupos no Facebook e no WhatsApp para a negociação. E ganha apelo crescente como representante legítimo da necessária economia circular.
“Muitas pessoas elogiam a proposta da sustentabilidade, contando que haviam decidido jogar o móvel no lixo e que agora poderiam dar um uso prolongado para ele. Elas enxergam valor na proposta”, disse Andrade.
Existem já players grandes players do e-commerce também atentos ao segmento: OLX, Mercado Livre (MELI) e Enjoei (ENJU3) transacionam móveis e objetos de decoração de segunda mão, mas nenhuma atende o consumidor em todas as etapas da jornada.
No caso da OLX, a transação financeira fica nas mãos das partes envolvidas, fora do marketplace, bem como a entrega em si – e não há verificação de procedência dos móveis usados. Mercado Livre e Enjoei cuidam da transação, mas não da logística de retirada e entrega dos móveis.
Nos Estados Unidos, é um mercado que já conta com startups, como a AptDeco, mas sem ligação com uma operação de produtos novos, como é o caso da Mobly.
Na Mobly Usados, o vendedor – chamado também de seller – decide o preço de negociação, com uma taxa de desconto em relação ao preço pago ou ao mesmo modelo novo, com referências como sites que vendem o mesmo produto.
Com o uso de inteligência de dados, a startup consegue apontar para o vendedor qual a probabilidade de venda e em que prazo conforme o patamar de desconto oferecido.
“O produto tem um giro rápido quando o desconto é de no mínimo 30% em relação ao preço de varejo”, afirmou o CEO da Mobly. “Com 50%, o giro é mais rápido ainda.”
O desconto médio tem ficado justamente na casa de 50%. “O objetivo de quem vende um móvel usado não é fazer dinheiro. Na maioria dos casos, a pessoa escolhe fazer a doação para alguém que se comprometa a fazer a retirada, contratando um carreto ou algo assim”, disse Andrade.
O take rate da startup, o equivalente à comissão, é de 30% sobre o valor da venda.
A Mobly Usados está no ar há pouco mais de seis meses e começa a ganhar tração de forma mais acelerada, tanto em sortimento como em venda. No ano passado, o volume de vendas chegou a 1,4 milhão de reais, e a projeção é que atinja 5 milhões de reais neste ano.
O negócio opera atualmente na maior parte da região metropolitana de São Paulo e na região de Campinas, no interior paulista, mas há planos de expansão geográfica.
Estoque do móvel usado
O tempo reduzido em operação já permitiu que a Mobly entendesse melhor a dinâmica do mercado, a tal ponto que acabam de dar mais um passo – ousado – na logística.
“Começamos a oferecer também o serviço de retirar o móvel de quem quer vender e ficar com ele em estoque até que a transação aconteça. É uma proposta de valor para o consumidor que não tem igual no mercado”, afirmou o CEO da Mobly.
O estoque resolve a necessidade do cliente de abrir espaço para móveis novos que vão chegar. Os dados de transação atestam o sucesso da solução: a maior parte dos clientes opta por pagar uma comissão maior para a Mobly Usados ficar com os móveis até que a venda seja concretizada.
A funcionalidade só não cresce mais porque a empresa avalia caso a caso se tem condições de fazer o armazenamento de uma maneira que a conta feche no fim do dia.
A solução também ameniza um dos desafios aprendidos na prática: a ausência do móvel colocado à venda. Explica-se: a pessoa que coloca um móvel usado para vender em geral o faz não só na Mobly como em outras plataformas. E, ao concretizar a venda, raramente se dá ao trabalho de retirar o anúncio em cada uma das demais plataformas.
Best sellers dos móveis usados
Os best sellers da Mobly Usados são, nessa ordem, sofás e conjuntos de mesa e cadeiras. Mas a startup vende também quadros, tapetes, cortinas etc.
“Tem sido um aprendizado porque é um mercado muito informal”, disse Andrade. “Muitas pessoas dizem que têm muito medo de comprar e sofrer um golpe. Quando acessamos grupos no Facebook ou no WhatsApp para captar vendedores para a plataforma, muitas delas ficam desconfiadas e perguntam se é a Mobly mesmo”, afirmou Andrade.
A captação de vendedores que possam ampliar o sortimento da plataforma é um dos principais desafios para sustentar o crescimento. Existem empresas menores dedicadas à compra e venda de móveis usados e que sobem todo o seu estoque na plataforma, mas pessoas físicas respondem por algo entre 75% e 80% das vendas da Mobly Usados.
Integração das duas plataformas
Além do ganho de escala projetado, a Mobly planeja desenvolver novas ferramentas desenhadas para o negócio em 2022. Hoje a startup já oferece serviços relacionados ao produto de segunda mão vendido, como higienização do sofá.
Também faz parte dos planos uma integração entre as plataformas, que hoje operam de forma independente. “Queremos juntar os dois negócios e integrar a Mobly Usados à experiência de compra da Mobly. No limite, o cliente poderá navegar no site da Mobly e escolher se quer olhar móveis novos apenas ou só usados”, afirmou Noda.
“E se o cliente estiver saindo do site depois de olhar um sofá novo poderá aparecer uma notificação dizendo ‘eu tenho o mesmo sofá 30% mais barato, mas usado. Quer dar uma olhada?’ Ou seja, acaba sendo mais um argumento para manter o cliente dentro da plataforma.”
Atualmente, da nova base de clientes da Mobly Usados, uma fatia de 15% a 20% veio da plataforma da Mobly dedicada a produtos novos.
A integração das plataformas endereçaria o que Noda classifica como o maior desafio do novo negócio: a logística. E abriria caminho para a expansão geográfica.
“Se eu retiro um móvel na casa do cliente em São Paulo e vou entregar no Rio de Janeiro, ou isso entra em um volume grande transportado ou a conta não vai fechar”, explicou.
A unidade de negócios de usados pode servir também como embrião de uma funcionalidade nova da plataforma da Mobly: oferecer para quem pretende comprar um sofá novo na plataforma, por exemplo, um desconto junto com a possibilidade de retirada do sofá atual na casa do cliente. O projeto ainda está em fase de desenvolvimento.
“Existem muitas sinergias entre os dois negócios”, resumiu Noda.
Fonte: Exame