Funcionários das lojas da Burberry Group PLC assumiram novas funções: organizar festas de aniversário, jantares e visitas a galerias de arte para clientes que gastam muito com a marca.
A grife britânica está ampliando um exército de vendedores especiais – ou “private client associates”- que estabelecem uma relação pessoal com uma elite de clientes para fazer com que voltem sempre à loja e gastem mais. São vendedores que não se limitam a falar sobre o produto, mas buscam saber que tipo de atividade interessa ao cliente e se a Burberry pode ajudar a programá-la, disse um executivo da grife.
Depois de anos investindo alto na abertura de novas lojas, algumas das grifes mais conhecidas do mundo reduziram ou até interromperam a expansão física. A ideia, agora, é tirar o máximo de lojas existentes na nova realidade do mercado, de baixo crescimento.
Na última década, o setor de luxo abriu lojas a torto e a direito na Ásia – especialmente na China. Mas a demanda por bolsas caras e outros artigos de luxo no país asiático caiu após uma campanha contra a corrupção. Na Europa, atentados terroristas reduziram a receita produzida por turistas – e o crescimento arrefeceu também nos EUA, pois um dólar forte limita o gasto de estrangeiros.
O crescimento das vendas de artigos pessoais de luxo como bolsas, calçados e relógios deve se manter em uma taxa anual de 2% a 3% até 2020 – bem abaixo da média de 6% ao ano registradas nos 20 anos entre 1995 e 2015, segundo a consultoria Bain & Co.
A reação do varejo de luxo tem sido frear a expansão no número de lojas. A carteira de lojas do setor de luxo cresceu apenas 0,4% nos 12 meses encerrados em julho. Em comparação, o crescimento no mesmo período do ano passado, segundo dados da firma de pesquisa de investimentos Bernstein, foi de 5%.
“A expansão ficou para trás, e nossas lojas estão sentindo um grande potencial para melhorar, e estamos fazendo o possível para explorá-lo”, disse em fevereiro François-Henri Pinault, diretor-presidente da Kering SA. A empresa francesa é dona de grifes como Balenciaga, Bottega Veneta e Gucci.
Hoje, clientes como Naoko Kawachi, uma executiva de comunicação de 39 anos que mora em Tóquio, são cada vez mais importantes para o mundo do luxo. Em fevereiro, a Burberry levou Kawachi a Londres para ver o desfile da grife, pagando a passagem na classe executiva e cinco diárias em um hotel cinco estrelas, o Claridge’s.
Em Tóquio, Kawachi frequenta a loja da Burberry na opulenta avenida Omotesando, onde sempre é recebida com uma taça de champanhe e um bate-papo, ainda que não compre nada. “Às vezes, entro só para dar um oi a todos”, diz. “Sinto que são como uma família”.
Muitas grifes estão se concentrando em coletar dados sobre o cliente e em alocar mais espaço para produtos de alta demanda. A Hugo Boss AG aumentou a oferta de roupas masculinas formais, sua categoria de maior margem, para tentar maximizar as vendas por metro quadrado. “O desempenho concreto da loja vai ser a única diretriz para a alocação de espaço no varejo”, disse o diretor financeiro da Hugo Boss, Mark Alexander Langer, em março.
Na Burberry, os vendedores visualizam o histórico de compras em lojas físicas e na internet de mais de dez milhões de clientes com um aplicativo no iPad. Informações sobre as preferências do cliente – numeração, cor, estilo – permitem que eles deem conselhos mais personalizados. Cifras internas mostram que clientes que recebem atendimento personalizado têm 20% mais probabilidade de voltar a comprar da grife e gastam 35% a mais, em média.
“Esperamos que metade do nosso crescimento até 2019 venha de melhorar a produtividade do varejo tradicional, então, o significado e potencial disso para nossos negócios não devem ser subestimados”, disse o diretor-presidente da Burberry, Christopher Bailey, em uma teleconferência em novembro.
Embora a indústria do luxo tenha sido, ao longo da história, a árbitra da alta moda, ditando tendências em vez de seguir as pistas do cliente, as grifes hoje estão mais atentas àquilo que o consumidor quer.
Segundo Bailey, a Burberry vai “adotar uma abordagem mais científica no ‘merchandising’, para garantir que o sortimento seja mais condizente com as necessidades e as preferências específicas dos clientes em cada lugar”. Esse sortimento de produtos, que até aqui dependeu basicamente do porte da loja, agora vai levar em conta aspectos como o clima de cada lugar e o perfil da clientela.
À medida que limitam a expansão de lojas, certas grifes estão melhorando alguns dos espaços que já têm.
Há pouco, a Gucci reformou por completo sua loja de mais de mil metros quadrados em Pequim. A grife – que fechou um total de oito lojas no mundo todo no ano fiscal encerrado em julho, segundo a Bernstein – trocou tudo, do carpete aos móveis, na tentativa de atrair novos clientes e despertar o entusiasmo da clientela existente.
No começo do ano, a Gucci adotou a meta de aumentar a “densidade de vendas”-um termo do setor para vendas por metro quadrado – em até 50%.
“Hoje, como não é possível abrir mais lojas, sobretudo para megamarcas, todo mundo fala de densidade de vendas”, disse em junho o diretor-presidente da Gucci, Marco Bizzarri.
As grifes também estão investindo mais no treinamento do pessoal das lojas e até alterando suas funções.
Jean-François Palus, diretor-gerente da Kering, disse em fevereiro que a empresa cortou “grande parte” das tarefas administrativas realizadas por gerentes de lojas da Gucci e outras grifes da Kering, permitindo que eles dediquem mais tempo a orientar vendedores e trabalhar para o crescimento das vendas.