José Carlos de Souza Filho[1]
Nas relações comerciais entre fornecedores e comerciantes (atacadistas e varejistas), existem várias formas de se concederem vantagens aos compradores em virtude de alguns fatores como fidelidade, volume de compras, pontualidade de pagamento, exclusividade, entre outras.
Pretende-se aqui conceituar e analisar as formas mais comuns de concessão destas vantagens e de que forma isto impacta a tributação existente nas relações comerciais. Sem querer entrar nos conceitos tributários em profundidade, mas colocando os determinantes das operações, alguns tributos são intervenientes nestas transações, sendo os mais importantes o ICMS (imposto estadual), que pode ser cobrado diretamente ou através de Substituição Tributária, e as contribuições federais PIS e COFINS (em alguns casos, também cobrados de forma monofásica).
O problema que se coloca é que os tributos mencionados estão inseridos nos preços das mercadorias e não cobrados “ad valoren” como ocorrem com os tributos sobre vendas no restante do mundo. E quando se consideram os benefícios concedidos nas transações comerciais, surgem questões de natureza tributária que demandam interpretações, análises e por fim, entendimentos por parte dos legisladores e gestores quanto à melhor (ou mais correta) forma de aplicação legal para se evitar evasão fiscal ou o contrário disto, o excesso de tributação.
A primeira grande diferenciação conceitual a se fazer é entre desconto incondicional e desconto condicional. O desconto incondicional é aquele concedido diretamente na nota fiscal e age como redutor do preço (e da base de cálculo dos tributos). Já os descontos condicionais são aqueles que dependem de evento posterior (ou paralelo) à emissão da nota fiscal. Em tese, estes não afetam a base de cálculo dos tributos.
Uma das principais características do comércio é seu dinamismo, com mudanças rápidas e respostas imediatas face às reações do mercado e da economia. Outra característica são as reduzidas margens líquidas sobre as vendas. Esses dois aspectos acabam por criar situações novas e inusitadas que demandam soluções de natureza comercial e tributárias urgentes. Além de levar os comerciantes a procurarem formas de, através dos benefícios comerciais, reduzirem seus custos operacionais.
Um importante fator de benefício concedido ao comércio é a bonificação. Sua definição, calçada no direito comercial seria a concessão de maior quantidade de produto de forma não onerosa, baseado numa certa quantidade adquirida (reduzindo assim o custo unitário do bem transacionado). A grande questão que emerge aqui é o fato de que a bonificação deve ser tributada da mesma forma que a mercadoria vendida. Alegam os governos que a empresa pode conceder bonificação, mas não pode “se isentar da obrigação tributária da transação (circulação de mercadoria), uma vez que esta se destina a venda”. E para agravar a situação, algumas bonificações são concedidas na forma de pagamento posterior ao evento da compra (embora relacionadas àquelas, portanto condicionalmente).
Entre os tipos mais comuns de bonificação praticadas no mercado brasileiro, podem-se destacar:
- • Bonificação por volume – a empresa recebe quantidade maior (ou valor correspondente) visando induzir maiores volumes de negócios e aumentando o ganho do comércio. Há muita controvérsia quanto à forma de tratamento deste como condicional ou incondicional pelo fisco.
- • Propaganda participada – tipo de bonificação para fins de campanhas e materiais publicitários (tablóides). Implica um bom acompanhamento e controle efetivo dos gastos a serem apropriados.
- • Enxoval e lançamentos – em geral são lotes de mercadorias enviadas aos clientes em ocasiões especiais (abertura de lojas ou lançamentos de novos produtos). Se os fornecedores recolheram os tributos de vendas, os créditos podem ser utilizados.
- • Bônus de display – são vantagens oferecidas por conta de uma melhor localização de produtos nas gôndolas. Aqui, usa-se a estratégia de apropriar como despesa de vendas ao invés de desconto ou bonificação.
- • Logística – ganho repassado ao varejista pelo envio total da mercadoria para um centro de distribuição (cabendo ao varejista o abastecimento dos pontos de venda). Aqui, ocorrem as duas formas: ou se trata de uma receita operacional ou se reduz o custo por meio de rateio, caso seja possível a clara identificação.
- • Desconto financeiro – quando destacado apenas no título para pagamento. Tem a vantagem de manter o crédito tributário pelo valor cheio..
- • Proteção de preço – são reembolsos concedidos para garantia de margens caso por alguma razão de natureza comercial (concorrência) haja a necessidade de reduzir o preço na gôndola após as transações e acordos.
Existem outras inúmeras formas de concessão de benefícios entre fabricantes e varejistas não detalhadas aqui, mas a questão mais importante é de que forma elas afetam o custo unitário (quando identificado) e qual o melhor tratamento fiscal a ser dado.
Assim sendo, algumas considerações importantes podem ser feitas:
- 1. Verificar e identificar os diversos tipos de bonificações existentes por conta dos acordos comerciais.
- 2. Analisar seus reais impactos, lembrando que na maioria dos casos existe o crédito tributário mesmo que tenha havido restituição, pagamento ou acréscimo de mercadorias não onerosas.
- 3. Lembrar que o tratamento fiscal entre condicionais e incondicionais são diferentes.
- 4. Manter de forma clara os registros de tudo o que puder ser apropriado a fim de facilitar as comprovações dos créditos, a manutenção dos ativos tributários e quando for o caso os valores exatos dos benefícios alocados.
Não se pretendeu aqui esgotar o assunto ou as possibilidades sempre inovadoras das relações comerciais, mas chamar a atenção para fatos relevantes nas diversas modalidades de negociação e no tratamento dos benefícios.
Bibliografia.
Fabretti, C., 2005. Contabilidade Tributária, 9ª Ed., São Paulo, Atlas.
Antunes, J e Sampaio, V.C.A., Bonificações no setor de Varejo – receita ou redução de custos?, artigo publicado na Revista ABCustos – Associação Brasileira de Custos – Vol. 2 n. 1 – Jan/Abr 2007.
Angelo, C.F., Nielsen, F.A.G. e Fouto, N.M.A.D., 2012. Manual de Varejo no Brasil, 1ª Ed., São Paulo, Saint Paul.
[1] Mestre e Doutor pela FEA USP, especialista em tributação no varejo, professor dos cursos MBA da FIA, FIPE, MAUÁ e consultor de empresas.