É impossível entender a transformação digital chinesa sem levar em conta os meios de pagamento. Especialista chinês explica essa revolução
A explosão dos meios de pagamento digitais é uma das grandes marcas da transformação do mercado chinês. Simplificando a tecnologia com o uso de QR Codes e contando com características muito próprias, como o salto direto das transações em dinheiro ou débito para o digital, a China mergulhou em uma nova maneira de relacionamento financeiro dos clientes com as empresas. E a concentração do mercado nas mãos do Alipay (do Alibaba) e WeChat Pay (da Tencent) fez dos meios de pagamento digitais a alavanca do desenvolvimento de ecossistemas.
Mas a pergunta que fica é: será possível replicar a experiência chinesa no mercado brasileiro? Para responder essa pergunta, o primeiro passo é entender a realidade chinesa. O Seminário Digital “China pós Covid-19: o papel da Inovação e Ecossistemas”, realizado pela BTR-Varese em 21 e 22/08, contou com uma apresentação de Zhaokai He, vice diretor da WALLYT, que mostrou como a China saiu do zero e chegou a mais de US$ 5 trilhões em transações digitais em cerca de cinco anos.
“Um conjunto de fatores explica a revolução dos pagamentos digitais na China”, analisa He. “O primeiro é o fato de que o governo chinês preferiu deixar o mercado amadurecer para somente então começar a regulá-lo, o que liberou a inovação e permitiu muitas experimentações. Com isso, duas empresas de tecnologia – Alibaba e Tencent – ocuparam esse espaço no mercado”, diz.
É importante ressaltar também que o sistema bancário chinês não contava com bancos como conhecemos no Brasil. “Existem várias instituições financeiras, mas com alcance local. Isso criava travas e levava 50% das transações do comércio a serem feitas em dinheiro vivo, especialmente no interior do país”, conta He.
A criação de carteiras digitais viabilizou a formação de ecossistemas. “É o que deu ao Alibaba e à Tencent a capacidade de conhecer a fundo os clientes e trazer conveniência a todos os momentos, aumentando a relevância do uso de seus apps e estimulando outras empresas a fazerem parte de suas plataformas. Em uma espiral positiva, isso estimulou ainda mais o crescimento das transações digitais”, explica o consultor.
Atualmente, 27% do valor transacionado em plataformas digitais está no varejo online e 29% em lojas físicas. “O chinês usa carteiras digitais intensamente para questões pessoais, como transferência de dinheiro para outras pessoas e pagamentos de contas. Isso representa 41% do valor transacionado nas carteiras digitais chinesas”, diz He.
Dessa forma, Alipay e WeChat Pay também têm grande relevância no relacionamento com os clientes fora das lojas e o uso dos dados dessas transações gera ainda mais conhecimento sobre os consumidores. “Alibaba e Tencent são as duas únicas empresas chinesas entre as 10 maiores do mundo em valor de mercado, e isso vem da construção de um ecossistema completo, presente em múltiplos setores e fortemente impulsionado pelo uso das suas carteiras digitais”, analisa o consultor.
Com a pandemia, surgiram novos desafios, pela dificuldade de circulação de pessoas. “As pessoas passaram a comprar ainda mais online e avançaram para muitos outros segmentos de mercado”, diz He. “Em Hong Kong, por exemplo, as transações online subiram mais de 50%, tanto no e-commerce quanto pelo uso de transações físicas contactless. As carteiras digitais já eram muito fortes entre os chineses quando viajavam para o exterior. Com o Covid-19, seu uso foi enormemente acelerado no varejo local”, completa.
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