A Caixa Econômica Federal diz que foi a falta de dinheiro para emprestar, e não o baixo apetite dos clientes para tomar crédito, que provocou a forte desaceleração nos financiamentos imobiliários em 2015. O banco oficial considera bem-vindas iniciativas para liberar mais depósitos compulsórios para o setor. Em meio ao debate sobre os instrumentos à disposição do governo para reativar a economia, a Caixa resolveu se posicionar em defesa da eficácia da liberação de mais recursos para o crédito.
Antes de deixar o cargo, o ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy chegou a afirmar que liberar compulsórios não funcionaria porque o problema é de demanda. Uma indicação disso é que, dos R$ 10,5 bilhões liberados para a Caixa pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) para o crédito habitacional, apenas metade foi efetivamente utilizada.
A Caixa, porém, disse que teve que racionar o crédito para não gastar os escassos recursos de uma só vez. “Ficou parecendo que a desaceleração do crédito imobiliário não se deve à falta de recursos, mas não é bem assim”, disse ao Valor o diretor de habitação da Caixa, Teotônio Rezende. “Teve uma queda na demanda, mas a restrição da oferta, por falta de recursos, explica a maior parte da freada.”
Em 2015, até maio, a média mensal de contratações de crédito à habitação com recursos da caderneta de poupança girava em torno de R$ 7 bilhões. O ritmo de desembolsos estava em linha com as contratações do ano anterior, que somaram R$ 73,3 bilhões.
Mas os saques na caderneta, o principal funding para o crédito imobiliário para a classe média, obrigaram a Caixa a tomar medidas já a partir do começo do ano para restringir a oferta de crédito. A primeira providência foi subir a taxa de juros, não só para desacelerar as contratações, mas também para cobrir os custos mais altos de captação com Letras de Crédito Imobiliário (LCI) depois da subida do juro pelo Banco Central (BC).
“A alta de juros cobrados nos financiamentos imobiliários não teve efeito nenhum para reduzir a demanda dos clientes”, afirma Rezende. “A média mensal de contratações não caiu nada.”
Em maio, a fuga de recursos da caderneta de poupança para outros investimentos tornou crítica a falta de funding para os financiamentos imobiliários. O Conselho Monetário Nacional (CMN) liberou, então, R$ 22,5 bilhões em depósitos compulsórios da caderneta de poupança para a habitação, dos quais R$ 10,5 bilhões beneficiaram a Caixa.
As estimativas da Caixa, porém, indicavam que os recursos extras seriam consumidos em menos de dois meses, já que o apetite da clientela se mantinha inalterado. O banco resolveu, então, fazer uma restrição quantitativa nas operações, apertando as condições para novas contratações.
A medida mais forte foi financiar apenas metade do valor dos imóveis usados. Antes, a Caixa financiava entre 80% e 90%. No caso de imóveis novos, a cota financiada caiu de 90% para 80%.
A ação surtiu efeito. Nos meses seguintes, o volume mensal financiado pela Caixa caiu para menos de R$ 1,5 bilhão. Uma parte da demanda por financiamentos, de R$ 1 bilhão mensais, foi deslocada para uma linha com recursos do FGTS, chamada Pro-Cotista, que tem condições semelhantes ao crédito com dinheiro da poupança.
Se falta de dinheiro não fosse um constrangimento, diz Rezende, provavelmente a Caixa estaria emprestando mensalmente na faixa de R$ 3,5 bilhões a R$ 4 bilhões com recursos da caderneta de poupança, sem contar a demanda de R$ 1 bilhão deslocada para o Pro-Cotista. Juntando tudo, haveria entre R$ 4,5 bilhões e R$ 5 bilhões.
Rezende diz que outra evidência de que a queda da demanda não é o principal fator por trás da retração da contratação de crédito imobiliário em 2015 é o bom desempenho da chamada faixa social. Esses são empréstimos com recursos do FGTS com juros mais baixos, que atendem imóveis até R$ 200 mil. Não estão incluídas as operações com forte subsídio do Tesouro Nacional do programa Minha Casa Minha Vida. O volume contratado na faixa social saiu da faixa mensal de R$ 4 bilhões no primeiro semestre para valores mais próximos de R$ 5 bilhões no segundo semestre.
Rezende não nega que, com a deterioração nas condições macroeconômicas, a demanda por crédito teve uma certa desaceleração. Mas pondera que esse é o terceiro fator mais importante que explica a queda das contratações em 2015. O primeiro é a falta de dinheiro. O segundo é um aperto prudencial feito pela Caixa nas exigências para contratar e uma maior seletividade da clientela, o que é normal em todos os bancos num cenário econômico mais difícil.
“A Caixa, assim como os demais bancos, vinha se preparando para uma desaceleração do crédito imobiliário, depois de crescer muito”, disse Rezende. “Mas a queda foi mais intensa e rápida do que todo mundo esperava, e isso não é nada bom.”
Valor Econômico – SP