Nos últimos 12 meses, a Covid-19 foi a grande líder da transformação digital nas empresas, catalisando mudanças que vinham sendo germinadas e dando um “senso de urgência” para as iniciativas de inovação. Em todos os segmentos, o fechamento das lojas físicas exigiu repensar os negócios e criou alternativas que os consumidores abraçaram, modificando para sempre as relações de consumo.
Para Eduardo Terra, presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), essa é uma mudança que ganhou todo esse impulso porque a respostas dos clientes ficou acima das expectativas. “No primeiro semestre de 2020, tivemos 7 milhões de novos consumidores online, que se somaram aos 10 milhões de novos entrantes no ano anterior. Além disso, os e-consumidores passaram a comprar mais e com mais frequência, gerando novas expectativas e criando desafios com os quais o varejo precisa aprender a lidar”, comenta.
Na sexta-feira (05/02), ao discutir os grandes insights da NRF 2021 – Chapter One para o mercado brasileiro em evento da BTR-Varese, Terra e Alberto Serrentino, vice-presidente da SBVC, elencaram seis grandes pontos de atenção, que deverão nortear as estratégias do varejo a partir de agora:
1 – Aceleração do varejo
A pandemia fez a digitalização do varejo avançar vários anos em questão de meses. “A transformação digital saiu de vez da teoria e foi para a prática em empresas de todos os segmentos do varejo, até mesmo naqueles até então menos digitalizados, como materiais de construção e supermercados”, analisa Eduardo Terra.
O resultado é um crescimento da importância do e-commerce no varejo mundial. De acordo com uma análise da SBVC, no mercado brasileiro pelo menos 5% das vendas são online, excluindo os dados dos sellers dos marketplaces. Incluindo esses números, a estimativa é que até 8% das vendas do varejo já aconteçam online. “Na China, esse número já é de 45% e no Reino Unido, 36%. São mercados que servem como inspiração e como entendimento de para onde estamos caminhando”, diz Terra.
Uma grande transformação ocorrida em 2020, e que gera consequências fortes para o futuro, é o aumento da velocidade do varejo. “Empresas grandes adotaram mentalidade de startup e ganharam flexibilidade para encarar o mundo pós-pandemia”, afirma. Para Terra, conceitos como antifragilidade e cisnes negros (ambos de Nassim Taleb) são grandes referências para entender como se posicionar no mundo atual.
2 – Mudanças na jornada de consumo
O smartphone muda a dinâmica da relação do varejo com os consumidores: 83% dos clientes usam o WhatsApp em alguma parte de sua jornada de compra de produtos e serviços e, por isso, o aplicativo precisa ser incluído na estratégia do varejo. O mesmo vale para o uso de apps do varejo, que teve um aumento de 84% no Brasil no ano passado. “As redes sociais assumiram um papel adicional, de local de descoberta de marcas e produtos, reforçando a digitalização da jornada de compras e mostrando que é ainda mais importante pensar a jornada de consumo de maneira ampliada”, explica Terra.
Para o presidente da SBVC, isso não significa que a loja física não tenha mais seu papel. “O PDV continua sendo muito importante, mas ela precisa ser proativa: inverter o processo tradicional de esperar o cliente e passar a buscar o consumidor nos meios digitais para atrai-lo para a loja”, avalia.
3 – Novos modelos de demanda, gestão de produtos e fulfillment
Está na hora de repensar a maneira como o varejo realiza o planejamento de demanda, sua estratégia de abastecimento, a logística, a cadeia de suprimentos e o fulfillment. “A omnicanalidade exige que as empresas parem de distribuir ‘de 1 para n’ e passem a distribuir ‘de n para n’, o que derruba todos os modelos logísticos convencionais e o planejamento da distribuição”, explica.
O varejo já tem essa percepção. Um estudo divulgado pela NRF durante o Big Show 2021 – Chapter One mostra que 85% dos executivos de varejo acreditam que suas empresas precisam de mudanças estratégicas no supply chain para lidar com as novas necessidades do mercado. E isso se faz por meio de uma nova arquitetura de dados, composta por data lakes, cloud, Inteligência Artificial e machine learning. Acrescente a isso blockchain como uma tecnologia a serviço da rastreabilidade e cria-se uma avenida de avanço estratégico.
“A partir de agora, fulfillment e supply chain deixam de ser temas táticos e se tornam estratégicos para as empresas”, acredita Terra. Nesse processo, o uso de tecnologia ganha protagonismo, aliada aos dados para viabilizar a distribuição omnichannel de produtos.
4 – Novos canais e inovações em modelos de venda
A pandemia criou uma realidade que, no pós-crise, não desaparecerá. Parte do que foi incorporado às jornadas de consumo não será abandonado pelos clientes com o fim do isolamento social. “Redes sociais se tornaram marketplaces, os clientes também se tornaram promotores de vendas e influencers, e o varejo precisou estar mais perto dos clientes para responder às demandas por entrega rápida”, enumera Alberto Serrentino, vice-presidente da SBVC.
O desenvolvimento de formatos de loja focados em conveniência e proximidade é, com isso, uma resposta do varejo ao avanço dos apps de delivery, que se tornaram um atalho importante na crise para que marcas ampliassem sua capacidade de atendimento. “O novo jogo do varejo é ‘blindar’ o cliente e gerar receita recorrente”, diz Serrentino. “Houve uma explosão de modelos de assinatura de produtos e serviços, que estimulam a interação constante do cliente com a marca e o aumento do lifetime value desse consumidor. A recorrência permite que o varejo crie serviços que estimulam a fidelidade e mantêm a capacidade de escalar negócios, agregar parceiros ao ecossistema e impulsionar o uso de dados”, analisa.
Outro fenômeno importante na pandemia, e com influências de médio e longo prazo, é o live streaming, que permite que as marcas criem conexão com os clientes pela união de mídia, entretenimento e compras. “O live streaming se tornou uma alavanca muito forte para acessar os clientes, usando microinfluenciadores ou até mesmo transformando as lojas em estúdios de transmissão. Esse é um movimento que se disseminou pelo mundo e será parte do dia a dia do varejo do futuro”, declara.
Tudo isso impulsiona o varejo a evoluir para o desenvolvimento de ecossistemas, que escalam negócios a partir de parceiros e de serviços oferecidos para complementar as demadnas dos consumidores. “Os marketplaces se tornaram dominantes no e-commerce e desafiam o varejo a ter musculatura para desenvolver suas próprias plataformas ou para fazerem parte de ecossistemas de terceiros. Esse é um ponto fundamental das agendas estratégicas das empresas”, explica Serrentino.
5 – O novo papel da loja
Com a aceleração digital, a transformação da loja se tornou estratégica. O ponto de venda deixa de estar focado em produtos e passa a ser centrado no cliente e orientado a dados, com capacidade de aquisição e atração de clientes. “Lojas funcionam para capturar clientes a custo mais baixo, e esse é um aspecto fundamental em uma jornada que mistura, cada vez mais, digital e físico”, analisa Serrentino.
Além disso, as lojas, em um modelo integrado, se tornam hubs logísticos e de serviços, servindo como plataformas de fulfillment para vendas digitais. Com isso, muda o papel dos vendedores. “As equipes têm que ser proativas para ativar clientes, estimulando a interação no digital antes, durante e depois da compra”, diz. Isso exige que o desempenho da loja seja medido de forma diferente, com outros KPIs que levem em conta o quanto ela contribui para a conquista, manutenção e ativação de clientes. “Em um varejo digitalizado, não faz sentido medir o PDV pelo tíquete gerado, já que a loja tem uma série de outros papéis que não podem ser mensurados dessa forma”, explica.
Com isso, as lojas serão empoderadas por dados e pela digitalização dos negócios. “Isso permite explorar novos serviços e oferecer mais relacionamento e calor humano, que o digital não consegue trazer sozinho”, completa.
6 – Meio ambiente, responsabilidade social e governança
A agenda ESG vem ganhando muita relevância e se tornou ainda mais urgente. “É uma pauta obrigatória para as empresas, já que empresas baseadas em propósito têm mais capacidade de geração de valor e criam negócios orientados aos stakeholders”, explica Serrentino.
Para ele, ESG começa na cultura corporativa, que nasce na liderança e se fortalece pelo exemplo, nas atitudes do dia a dia. “Isso nunca foi tão importante quanto durante a pandemia. A postura das empresas de cuidar das equipes e dos fornecedores vem sendo recompensada”.
A visão mais ampla é que a empresa precisa ser responsável não somente por suas atividades de produção, distribuição e venda de produtos, mas por tudo que a cerca: cuidado com o meio ambiente, proteção aos stakeholders, inclusão, diversidade. “Isso molda uma nova visão de negócios, novos modelos de liderança e uma nova relação das empresas com colaboradores, parceiros, clientes e o mercado como um todo”, completa Serrentino.
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Fonte: Redação SBVC