Varejista reduz estoques em relação ao início do ano e tenta diminuir impacto de aumentos de preços na demanda
Por Adriana Mattos
A varejista Via, dona das redes Casas Bahia e Ponto, reduz estoques em relação ao início do ano e tenta amortecer o impacto de aumentos de preços na demanda, acelerando ações com o carnê. A expectativa é de um terceiro trimestre forte em relação a 2019.
“Com os ajustes aumentando, vamos acomodar isso no carnê para atender loja e on-line. Vendemos em até 24 vezes, com prazo médio de 14 parcelas. Mas o cliente consegue comprar em 16 vezes pagando a mesma parcela da operação em 14 meses. O cliente se aperta um tempo um pouco maior, mas a parcela não muda. Vamos usar muito o carnê digital para isso”, diz Abel Ornelas, vice-presidente comercial e de operações da Via.
Ao fim, o preço total a prazo sobe por causa dos juros mensais do carnê, o que poderia ter um efeito nas vendas, mas Ornelas diz que não há impacto porque a preocupação do cliente é a parcela “caber no bolso”. “Nós falamos [à indústria] que o salário das pessoas não aumentou. A TV, a geladeira, subiram mais que o salário. Não creio em muitos mais aumentos na segunda metade do ano”. Dados do acumulado de 12 meses, até abril, mostram alta de 17,7% nos preços de produtos eletrônicos, segundo dados do IPCA, o índice oficial da inflação medido pelo IBGE.
A Via vai começar a vender crédito por meio do carnê digital neste semestre. O grupo obteve, na semana passada, licença do Banco Central para que o seu banco digital BanQi atue como instituição financeira. Está em estudo um projeto de cartão múltiplo do BanQi para este ano. A rival Americanas lançou um cartão de crédito tradicional, do seu braço Ame Digital, no fim de 2020. E o Mercado Livre oferece linhas de crédito on-line a clientes e lojistas desde 2018.
No carnê da Via, a carteira teve uma alta de 30% de janeiro a março para R$ 4,6 bilhões. Cerca de 13% da venda da empresa veio dos carnês no primeiro trimestre. Essa fatia era de 11% um ano antes (sem alta no calote, mostra o balanço). Mas a venda com o cartão da loja e à vista perderam fatia no bolo.
Há outro efeito possível do carnê nas vendas. Tem ocorrido um aumento da competição entre os setores de comércio e serviços após o retorno da demanda reprimida neste ano, e a empresa deve usar mais o carnê como forma de dar um fôlego maior ao “marketplace” (shopping virtual), que vende produtos de diferentes segmentos. O crédito no carnê pode ser usado no marketplace, na loja e no site.
Com isso, não dependerá só da demanda por eletroeletrônicos. São 55 mil lojistas na plataforma da Via – eram 26 mil em março. Pouco mais de 50% usam o sistema Envvias, de entrega própria. A meta informada em abril, e mantida, é atingir de 70 mil a 90 mil lojistas até o fim de 2021. A Americanas, a maior para esse critério (excluindo Mercado Livre, que abriga pessoas físicas), tinha 97 mil em março.
Sobre o comportamento da demanda, Ornelas informou que as curvas de tráfego de clientes e de vendas ainda estão descoladas, mas isso ocorre porque parte da venda feita em lojas migrou para o aplicativo, pelo sistema “Me chama no Zap”, criado na pandemia.
De janeiro a março deste ano (inclui período de lojas fechadas), a venda total no canal on-line (da Via e de seus lojistas no marketplace) subiu 123%, em relação a igual período do ano passado. A loja física caiu 9,6%.
“O segundo trimestre foi muito bom, fechamos o resultado agora, e [acontece] em cima de uma base do ‘ecommerce’ que foi altíssima. No terceiro e quarto trimestres, o cliente ainda está voltando para loja, ele não voltou totalmente. O tráfego de loja ainda não é o mesmo, mas a conversão [em vendas] está mais alta”, diz o executivo.
“Com o ‘Me chama no Zap’, o meu fluxo migrou para o on-line […] Então, tenho um tráfego de clientes na loja menor, com o tráfego no on-line continuando o mesmo, muito parecido com o do ano passado”. A venda feita no aplicativo pelo vendedor da loja é incluída no resultado do canal on-line.
Para a temporada de vendas de fim do ano, os pedidos de Black Friday e Natal já foram colocados para a indústria. Ornelas não informa os volumes em relação a 2019. Diz que colocou pedidos equivalentes a “40%, 45% da produção”, a depender da indústria e do produto. Menciona a expectativa de um terceiro trimestre “muito forte” sobre 2019. Por região, São Paulo ainda cresce mais devagar, e Norte e Nordeste estão com desempenho acima da média.
“Se não aparecer nenhuma cepa nova e o país vacinar em massa [a segunda dose] até outubro, teremos um bom Natal”, diz Ornelas.
“O que está ficando mais forte é janeiro, com as ações comerciais do mês. O varejo conseguiu deixar o Natal morno, pois acabou no meio da Black Friday e da liquidação de janeiro. Hoje, existem as queimas de produtos novos em janeiro, porque o consumidor quer produto novo. Isso do apelo da liquidação, de troca de mostruário, morreu. Até existe isso, de sair com TV na cabeça, mas se ocorre em volume muito grande, é um sinal de que a rede girou mal seus produtos. E produto parado dentro de casa custa caro”.
Sobre a abertura de 23 unidades do Magazine Luiza, em junho, no Rio de Janeiro, onde estão 156 lojas de Ponto e Casas Bahia, a Via diz que reformou “todas as lojas” três a quatro meses atrás, mas nega alguma ação comercial específica por causa do rival.
“Quando chega um concorrente, o mercado todo melhora. Eu vendi muito mais do que eu estava vendendo [na semana antes do Magazine entrar]. Mas eu vou sentir mesmo o que vai acontecer daqui a algum tempo”, diz. “Eles [Magazine] planejam ter dois milhões de metros quadrados em 2023. Eu tenho 2,6 milhões “, disse Ornelas. “Eles entraram no Rio e eu entrei no Pará [no fim de 2020], e eles estavam sozinhos no Pará. Lá, eles tinham 50 lojas e eu 15. Daqui a dois meses, eu terei 50. Estou com 48 lojas contratadas lá”.
Neste ano, a Via vai abrir 120 pontos no país – 22 já foram inaugurados. Os 100 restantes (já contratados) equivalem a uma média de 20 lojas, até novembro. Em dezembro o varejo costuma reduzir o ritmo de aberturas.
Fonte: Valor Econômico