O desempenho do varejo em maio surpreendeu ao vir pior do que o mais pessimista dos analistas projetava. Apesar de ser um dado relativamente antigo e muita coisa ter mudado no panorama macroeconômico brasileiro desde então, o número mostra que as vendas no comércio seguem voláteis e não há entre os economistas quem aposte em uma recuperação firme no curto prazo.
As vendas do comércio varejista caíram 1,0% em maio ante abril, resultado abaixo do intervalo das estimativas dos analistas ouvidos pelo Broadcast Projeções, que esperavam desde uma queda de 0,50% a crescimento de 1,00%, com mediana positiva de 0,40%. No varejo ampliado, que inclui as atividades de material de construção e de veículos, as vendas caíram 0,4%, quando as projeções iam de crescimento de 0,10% a 2,70%, com mediana de 1,20%.
Varejo
Estabilidade nas vendas do setor supermercadista mantém a descrença de analistas
Na comparação anual, a queda de 9,0% no varejo restrito foi o pior resultado para meses de maio desde o início da série histórica, em janeiro de 2000. Segundo a economista do Banco ABC Brasil Natalia Cotarelli, a maior decepção veio de segmentos que dependem mais de crédito e da renda disponível, como o de móveis e eletrodomésticos, que apresentou o terceiro mês consecutivo de queda. Ela diz não esperar melhora “substancial” das vendas do varejo até o fim do ano. A tendência, afirmou, é que os resultados continuem oscilando entre altas e baixas.
O economista-sênior do Haitong, Flávio Serrano, avalia que a estabilidade nas vendas do setor supermercadista – quando se esperava alta – pesou no resultado do varejo. “O setor de supermercados pesa bastante e o desempenho estável desse segmento pode ser explicado com a pressão da alta nos preços de alimentos”, afirma. Para o economista, após a restrição do crédito pressionar as vendas do varejo ampliado, o aumento do desemprego e queda na renda agora impactam nas vendas do varejo restrito. “Crescimento nominal negativo no crédito, piora no mercado de trabalho e a ainda incipiente melhora nas expectativas dos agentes devem continuar impactando negativamente o desempenho das vendas no varejo no final do primeiro semestre deste ano e começo do segundo”, resume o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, em relatório.
Se, por um lado, a deterioração no mercado de trabalho prejudica as perspectivas para o varejo, por outro a melhora da confiança dos consumidores poderia trazer algum alento. Desde o final de abril, quando Dilma Rousseff ainda estava na presidência da República, o índice de confiança já subiu 10,7%, segundo pesquisa da FGV. “Quando a gente analisa os indicadores de confiança, vê que de fato há uma recuperação, mas não podemos dizer que há uma inflexão no varejo”, comenta a economista da CM Capital Markets Jessica Strasburg.
De acordo com a economista-chefe da SPC Brasil, Marcela Kawauti, o varejo vai continuar negativo e deve fechar o ano em queda. “Embora a economia como um todo deva começar a se estabilizar no segundo semestre, as vendas devem continuar em queda. Só vão se estabilizar quando o mercado de trabalho começar a contratar. E o mercado de trabalho é sempre o último a reagir aos estímulos econômicos”, explica.
Se não há expectativa de recuperação das vendas no varejo este ano, pelo menos a retração pode ser menor do que se temia há alguns meses. A FecomercioSP acredita que o fechamento de postos de trabalho este ano deve ser menos intenso do que o esperado e por isso está revisando sua projeção para o comércio paulista este ano para estabilidade, de uma queda de 3% a 5% prevista antes. “Estabilidade para nós pode ser de uma queda de 0,1% a uma alta de 0,1%”, diz o assessor econômico Fábio Pina.
De qualquer forma, tendo em vista o desempenho decepcionante do varejo no primeiro semestre, já há quem acredite que o Banco Central possa ser convencido a reduzir os juros nos próximos meses. O sócio e diretor da MacroSector, Fabio Silveira, acredita que esse corte pode vir já em agosto. “Números como o que mostrou uma queda interanual de 9% no desempenho do comércio indicam que se não baixar o juro a economia, que já vem sendo destruída por política monetária equivocada, vai ser dizimada. Contra números não há argumentos, nem discursos”, diz./Álvaro Campos, Francisco Carlos de Assis, Gustavo Porto e Maria Regina Silva