Por Ricardo Patah
Estamos vivenciando dias difíceis no varejo, especialmente nos setores não alimentares, dada a retração no consumo, especialmente fragilizado pela perda de renda da população. As grandes e médias empresas estão sendo impactadas como um todo em função desta crise e, com isso, há uma retração ao acesso do crédito. Se voltarmos há 3 anos, o segmento acabava de entrar numa pandemia que afetou gravemente a saúde financeira das empresas.
O evento inesperado das Lojas Americanas levantou suspeitas em relação ao setor de varejo como um todo no Brasil. Com isso, o humor do mercado tem sido bastante negativo, gerando repercussão ruim em todo o setor.
Como resultado desta crise, ocorreu uma contrarreação do setor bancário e financeiro, que resulta num fechamento praticamente total do acesso à crédito. O estrangulamento dos varejistas asfixia de forma severa a totalidade da cadeia.
Percebemos no Sindicato dos Comerciários de São Paulo, com intensidade, uma piora rápida na condição de pagamento das empresas, que não conseguem rolar suas dívidas e se veem com dificuldade de honrar seus compromissos com fornecedores. Isso pode sinalizar um risco de não pagamento de seus trabalhadores.
Este impacto no varejo tem feito o governo demonstrar preocupação com o nível da taxa de juros básica da economia, que encarece de forma exponencial, em termos reais, o custo financeiro das operações de capital de giro simples para as empresas.
As instituições financeiras já sugeriram ao BNDES que haja funding do banco de desenvolvimento ou garantias do Tesouro Nacional para manter o crédito à cadeia de fornecedores das grandes varejistas. A sugestão foi feita no fim de fevereiro em reunião entre dirigentes da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e o BNDES, representado no encontro por Aloizio Mercadante, como um dos associados.
O fato é que o setor de varejo é muito grande. Especificamente, o de vestuário, calçados e têxtil conta com 130 mil lojas e emprega 775 mil funcionários. A cadeia de fornecimento conta com 3.800 fornecedores diretos e subcontratados e emprega 425 mil funcionários, de acordo com a Associação Brasileira do Varejo Textil. O estrangulamento dos varejistas asfixia de forma severa a totalidade da cadeia e uma eventual crise generalizada no setor pode trazer consequências inesperadas. O governo, infelizmente, não consegue agir e sair rapidamente do imobilismo. Não é fácil mesmo.
Trago aqui uma ideia talvez mais rápida para ser estruturada: oxigenar o setor e seus fornecedores por meio da disponibilização de linhas de capital de giro pelos bancos públicos federais e estaduais, mediante constituição de garantias com lastro em créditos fiscais, em nível federal e estadual, em processos já transitados em julgado, no âmbito do Judiciário.
Para finalizar, urge que o governo tome medidas para acabar com a concorrência desleal imposta pela “isenção tributária” que ocorre na prática na nacionalização de produtos importados via comercio eletrônico, no segmento varejista de vestuário, calçados e têxtil. Isso pode ser feito pela aplicação correta da legislação em vigor, quebrando a inércia irresponsável do governo anterior. Não se trata de proibir a importação, mas de promover equidade no tratamento tributário. Isentam-se todos ou taxam-se todos, de forma igual. Tanto os produtos importados como os fabricados no Brasil deveriam ter o mesmo tratamento tributário. Isentar apenas os importados é promover a exportação injustificada de empregos.
Fato é que nenhuma empresa quer fechar, nenhuma empresa quer falir e, junto aos mecanismos econômicos e de gestão, se faz necessário unir esforços para a reconstrução deste setor tão importante para o desenvolvimento do país e para a geração de renda do povo brasileiro. Vamos evitar a perda desnecessária de empregos e de arrecadação de impostos.
Fonte: O Globo