CEO da marca inglesa de perfumes Jo Malone, que acaba de chegar ao País, o francês Jean-Guillaume Trottier fala dos desafios de começar uma operação em meio a um cenário de crise e dos resultados que espera obter – “a longo prazo”
Um dia antes do anúncio da queda do Produto Interno Bruto (PIB) e da maior recessão do País desde 1990, o CEO francês de uma empresa inglesa que acaba de chegar ao Brasil mostrava-se confiante e inabalável. À frente da Jo Malone, marca inglesa de perfumes cujos frascos custam até R$ 700, Jean-Guillaume Trottier diz que a crise não o assusta e que tem um plano ambicioso de expansão no País. “Sou francês, estamos sempre em crise”, afirma. “E, historicamente, nesses momentos o mercado de luxo performa muito bem”.
Criada em 1994, na Inglaterra, a Jo Malone ficou famosa exatamente pela exclusividade – durante muito tempo, era preciso ir até a pequena butique da Walton Street, em Londres, para conseguir comprar os perfumes incensados em revistas mundo afora. A empresa foi vendida em 1999 para o grupo de cosméticos Estée Lauder e, recentemente, iniciou um processo de expansão global – hoje há 540 lojas em 41 países. Um número considerado pequeno por Trottier, CEO da marca desde 2012, que já atuou como vice-presidente da M.A.C. para a Europa e gerenciou divisões do grupo L’Oreal na França. Durante visita ao Brasil para inaugurar a primeira loja paulistana, no Shopping Iguatemi, que abre ao público no próximo dia 15, Trottier conversou com o Estado sobre o mercado e as perspectivas do negócio.
O que motivou o investimento no Brasil neste momento?
Entrei na Jo Malone há quatro anos e, antes disso, trabalhava para a M.A.C. Já sabia que o Brasil era um gigante adormecido. Quando cheguei na Jo Malone comecei a pensar nisso. Muitos dos meus melhores amigos são brasileiros e eu conhecia o País. Fazia sentido porque, para mim, o Brasil é um dos principais países do mundo. E da perspectiva do negócio, o Brasil é o maior mercado do mundo consumidor de fragrâncias. Ainda que hoje seja de perfumes de massa, isso vai mudar em alguns anos. Sabemos que o consumidor brasileiro irá fazer um upgrade para a categoria prestige, e ultra prestige, onde se encaixa a Jo Malone. Fazia sentido no papel investir aqui. Além disso, nossa inspiração não vem apenas do Reino Unido. Buscamos muitas fragrâncias na Ásia e no Oriente Médio. No Brasil, vamos pensar na Amazônia, cheia de plantas, ervas e frutas únicas.
Há quanto tempo vocês vêm desenvolvendo o plano de negócios?
Minha primeira viagem com esse motivo para o Brasil foi há quatro anos e o business plan começou há dois anos e meio.
O cenário econômico e político do País mudou nesse tempo. Como é para uma empresa estrangeira chegar ao mercado brasileiro agora em que só se fala em crise?
Crise significa algo para mim. Sou francês e estamos sempre em crise. Além disso, tocamos negócios em muitos países em que há crise. Mas de certa forma a Jo Malone está protegida, por ser de altíssimo luxo e ter um posicionamento bem específico. O interesse na marca é tão alto que não me preocupo tanto. Muitos consumidores brasileiros já conhecem a grife e, mais que isso, esperavam por ela. Estamos trazendo uma nova oferta ao mercado, que ainda não existe. Estrategicamente, o Brasil é importante para nós no futuro. Vamos investir no mercado brasileiro, não importa o que aconteça. Não espero resultados para agora. Além do que sempre há um fim para a crise.
A crise pode ter um lado positivo?
Historicamente, quando há uma crise, o mercado de luxo performa muito bem. Sobretudo o de beleza. Nossos perfumes têm preços bem altos, mas considerando toda a tecnologia envolvida não são tão caros quanto os de um vestido ou uma bolsa de grife. E temos algo exclusivo para oferecer. Estou confiante. O Brasil é um País de celebração e a Jo Malone é uma marca de celebração – a compra de presentes corresponde a metade das nossas vendas.
Qual o plano de expansão no Brasil?
Além da loja conceito que inauguramos no Shopping Iguatemi, em São Paulo, pretendemos ter lojas em outras capitais. No segundo semestre abriremos no Rio. Estou pensando também na consumidora carioca, na que mora em Brasília. Claro que não teremos muitas filiais porque nossa marca também tem o perfil de exclusividade. Nosso modelo de negócio é baseado nisso.
Há poucos anos só era possível comprar Jo Malone na Walton Street, em Londres, e hoje a marca está em 41 países. Como expandir sem perder o caráter de grife superexclusiva?
Tenho um número simples para dividir com você: a marca opera mundialmente em 541 pontos de venda. O mercado de beleza como um todo tem 40 mil pontos de venda. Então dá para ver que ainda somos de nicho. Claro que estamos crescendo, mas você não encontrará uma loja Jo Malone a cada esquina. Somos como um clube fechado. Quem conhece a marca, adora e é fiel. Contamos histórias que são compreendidas por um grupo específico. A coleção de perfumes inspirada em chás, por exemplo, é muito vanguardista em termos olfativos.
E, com a expansão, a produção sofreu mudanças?
A produção ainda é no Reino Unido e não estou disposto a comprometer isso de maneira alguma. É nosso DNA.
De que forma a grife se conecta com o consumidor brasileiro?
Os brasileiros não são como os chineses. Aqui a individualidade é importante e, na Jo Malone, eles poderão customizar as próprias fragrâncias, combinando-as de maneiras diferentes. Também tenho certeza de que nossa perfumista chefe irá entrar na floresta em busca de ingredientes para novos perfumes. Mudamos o conceito de ter relevância local para ter inspiração local. Queremos nos inspirar no Brasil e tornar essa inspiração globalmente relevante.