Em entrevista exclusiva à Época Negócios, François Le Gloan, CEO da La Prairie para as Américas, revela que nem a crise brasileira derrubou as vendas de seus cosméticos suíços à base de caviar – e, agora, com infusão de ouro
Ostentar um carro esportivo que custa mais de R$ 1 milhão, um relógio suíço que ultrapassa esse valor, uma bolsa com produção limitada e lista de espera de mais de um ano ou um vestido que mal saiu das passarelas para as araras de uma boutique é um conceito que tem se distanciado da essência de quem realmente tem capital – e o hábito quase que natural – de consumir luxo no seu dia a dia. Se na China a política anti-ostentação partiu do governo, no Ocidente esse desejo veio de quem vê no luxo um prazer puramente pessoal. Um rótulo raro de vinho ou de um single malt exclusivo pode até ser compartilhado com um minúsculo e seleto grupo de amigos. Um potinho de creme formulado com extrato de caviar puro, nem isso.
Nem mesmo a crise que se abate sobre o Brasil foi suficiente para frear as vendas da marca suíça de cosméticos La Prairie, o suprasumo da indústria da beleza e criadora da The Skin Caviar Collection. Ao descobrir o poder das ovas de esturjão, ela criou, em 1987, um dos cremes faciais mais surpreendentes da história. Novos produtos com o mesmo ativo foram lançados, incluindo o novíssimo Skin Caviar Luxe Cream Sheer, com textura mais leve, ideal para países com clima mais quente. Hoje, 25% da receita mundial companhia com sede em Zurique e dois mil funcionários vêm dos produtos que levam caviar em sua formulação.
Outro produto que também anda fazendo barulho é o Cellular Radiance Perfecting Fluide Pure Gold, cosmético que contém infusão de ouro, uma inspiração que veio do Egito antigo e promete dar mais brilho à pele. Inclusive, para todas essas iguarias em forma de creme, há compradores brasileiros que chamam a atenção da marca não só em solo nacional, mas também nas compras que fazem em Miami, Nova York, Paris, Lisboa, onde consomem muito. Leia abaixo os principais trechos da entrevista exclusiva que François Le Gloan, CEO da La Prairie para as Américas, concedeu à Época NEGÓCIOS:
Quando a marca teve início e como se deu sua ascensão?
A história começa em 1930, com a criação de uma clínica em Montreaux, por um médico suíço que entregava alguns tratamentos faciais e ficou muito conhecido por celebridades daquele tempo, como Marlene Dietrich, Greta Garbo, Charles Chaplin e Winston Churchill. Eram tratamentos artesanais e exclusivos. Algumas décadas depois, nos anos 1970, foi lançada uma gama de produtos faciais antiidade. A primeira gama tinha 10 produtos e alguns deles existem até hoje. Depois, a marca separou-se da clínica e passou a fazer novos lançamentos. Em 1987, foi apresentado ao mundo o cosmético com caviar, que foi uma quebra de paradigma para o mercado e para a La Prairie. A partir de 1990, ela começou a expandir sua operação pelo mundo.
A La Prairie foi, provavelmente, a primeira indústria do mundo a usar o caviar como ingrediente de um cosmético. O caviar utilizado na formulação dos cremes faciais é natural ou reproduzido em laboratório?
É caviar mesmo, puro. Há regulação de offshore, com pesquisas e registros, no mundo. Embora nós não produzamos apenas cosméticos com caviar, a grande conexão da marca é com o caviar. Nosso time de pesquisa sediado em Zurique encontrou propriedades no ingrediente que beneficiam a pele, proporcionando firmeza e o efeito lifting. Hoje, o caviar aparece em seis ou sete produtos. Em termos de vendas, os cosméticos com caviar respondem pelo nosso maior percentual de vendas, com mais de 20% de todo faturamento da marca no Brasil e 25% no mundo.
O caviar vem de algum lugar específico?
Nós não mencionamos a fonte, mas é fato que não há caviar na Suíça.
Qual foi o impacto ao lançar um cosmético com caviar? Esse produto continua a impressionar até hoje?
No começo, após algumas pessoas comprarem e gostarem do creme, criou-se um rumor em torno da eficiência do produto. Em meses, ele tornou-se um enorme sucesso. Os consumidores passaram a falar sobre os efeitos para parentes e amigos. Não fizemos propaganda. A maior propaganda foi a indicação, o boca a boca. Temos várias gerações usando os cosméticos com caviar desde seu lançamento, em 1987. Hoje, suas vendas estão mais fortes do que nunca.
O mercado de luxo foi impulsionado nos últimos anos por países emergentes como Rússia, China e Brasil. Como ficou o desempenho da La Prairie com a política anti-ostentação na China e a crise econômica no Brasil?
Não abrimos o faturamento, mas o negócio está crescendo em todos os mercados citados. Somos bem-sucedidos na Rússia e China. Nossos produtos não são adquiridos por impulso, mas por sua eficácia. Se você olhar o mercado mundial de luxo, 90% dele está fora do Brasil. Mas também somos muito bem-sucedidos em vendas no país e entre os brasileiros que compram em Miami, Nova York, Paris e Lisboa. Estamos crescendo igualmente em mercados maduros como os Estados Unidos e Emirados Árabes.
O Brasil já faz parte dos 10 maiores consumidores da marca?
Ainda não. Hoje, os Estados Unidos são nosso maior mercado, seguidos pela China, Hong Kong, França, Coreia do Sul e Alemanha. Somos fortes no duty free dos Emirados Árabes. Você sabia que a La Prairie é a marca de cosméticos mais vendida de todo aeroporto de Dubai, ultrapassando até nomes famosos da perfumaria? No caso do Brasil, se você pensar nos brasileiros que adquirem nossos produtos também fora do país, o número é ainda mais alto, mas é impossível contar.
Mas o fato de brasileiros consumirem muito no exterior não reduz as compras da marca em território nacional?
Não, porque eles não viajam o tempo todo. Mas consomem o produto diariamente. Tivemos um grande crescimento nas vendas no Brasil em 2015 e a expectativa é a mesma para este ano. O produto mais vendido é o Skin Caviar Luxe Cream. Agora, até para atender países mais quentes como o Brasil, estamos lançando o Skin Caviar Luxe Cream Sheer, cuja textura é mais leve.
Esse mercado de luxo parece ser impulsionado não só pelo desejo, mas também pela ostentação. Como funciona no caso da La Prairie?
No nosso caso, cuja atuação é em tratamento de pele, é diferente de adquirir joias caríssimas ou carros velozes. A compra é feita para satisfação pessoal e não para exibição. Há um elemento estético aí. As mulheres ativas, que trabalham, desenvolvem suas carreiras e ganham o próprio dinheiro compram por conta da eficiência, do resultado que ele irá proporcionar à pele. O que é luxo, no nosso caso? É o prazer sensorial e o acesso a um cosmético com maior eficiência. O melhor que você pode encontrar e que é apenas para você.
No exterior, a presença da marca se dá primordialmente em lojas de departamento. Há boutiques próprias em algum país e qual o formato adotado no Brasil?
Lá fora, nosso grande canal são lojas de departamento [de alto padrão] como a Neiman Marcus, a Sak’s e a Bergdorf Goodman. Temos uma boutique em Paris, na rue du Faubourg Saint-Honoré, e algumas em Hong Kong. No Brasil, onde a marca está presente há cerca de 20 anos e oferece todos os produtos e linhas (totalizando 128 itens, com preços entre R$ 319 e R$ 3.710,67), trabalhamos com 17 pontos de vendas – perfumarias seletivas – e dois e-commerce de beleza (Época e Sepha).
La Prairie hoje também é uma marca usada pelos homens ou primordialmente pelas mulheres?
Não há diferença entre a pele do homem e da mulher, com exceção da barba e da textura um pouco diferente. Fisiologicamente falando, é a mesma coisa. Homens talvez gostem de texturas mais leves. Nós temos muitos homens comprando, até porque nossa embalagem também atende ao público masculino e não especificamente ao feminino. De qualquer forma, 95% dos nossos compradores são mulheres que se preocupam e investem na pele.
Hoje, das várias linhas de produtos da marca, o foco parece ser menos na idade e mais na necessidade da pele. Por qual razão?
Pelo motivo que você pode ter uma pele de 35 anos com apenas 26 anos, devido a hábitos como beber, fumar, dormir pouco, viajar muito, ficar bastante tempo no ar-condicionado. A idade da pele não é, necessariamente, sua idade.
O que esperar do futuro da La Prairie?
Nosso desafio é posicionar-se como uma marca de luxo e crescer sem, necessariamente, estar em centenas de endereços em todos os países. Para os próximos anos, a meta é estar à frente do “estado da arte do luxo”. Se você não investe em inovação, o consumidor tem o poder de trocar de marca. Se ele não estiver satisfeito, reclamará em blogs e nas redes sociais. Nossa filosofia é lançar os melhores produtos e estar à frente do tempo. Não produzimos cosméticos convencionais, só criamos itens únicos e de alta qualidade. Também não investimos em marketing. Nossos aportes são direcionados para a Pesquisa e Desenvolvimento.