Por Beatriz Olivon
O Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu novamente o julgamento sobre os créditos tributários de ICMS na transferência de mercadorias, de um Estado para outro, entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte. O caso segue indefinido e foi destacado para o Plenário pelo ministro Gilmar Mendes, o que significa que vai recomeçar do zero.
Os ministros estavam divididos sobre a partir de quando a decisão teria validade e, mais importante para as empresas, sobre a edição de normas estaduais que disciplinem a transferência do crédito.
As dez maiores empresas do varejo correm o risco de perder R$ 5,6 bilhões de créditos tributários por ano com esse julgamento. O impacto estimado consta em um parecer da Tendências Consultoria Integrada contratado por companhias do setor. A projeção de perda anual de crédito tributário tem base no faturamento de 2019 – que soma R$ 234 bilhões – e a forma como elas se organizam.
Estão em julgamento os embargos de declaração com efeitos infringentes – para rever o mérito -, apresentados pelo Rio Grande do Norte (ADC 49). O recurso foi apresentado sobre decisão de abril, quando os ministros proibiram a cobrança de ICMS na transferência de mercadorias, de um Estado para outro, entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte.
A decisão, aparentemente, beneficia os contribuintes. Mas há um efeito colateral já que ela mexe nos créditos, utilizados pelas empresas para abater do pagamento do imposto.
O regime do ICMS é não cumulativo. Isso quer dizer que o que o contribuinte paga na etapa anterior da cadeia produtiva, ao adquirir a mercadoria para revenda, serve como crédito para abater na etapa subsequente.1 de 1 Gilmar Mendes, ministro do Supremo: pedido de destaque deslocou discussão para Plenário físico — Foto: Carlos Moura/SCO/STF
Gilmar Mendes, ministro do Supremo: pedido de destaque deslocou discussão para Plenário físico — Foto: Carlos Moura/SCO/STF
Com a decisão de abril, no entanto, o uso do crédito fica restrito ao Estado de saída da mercadoria. A empresa vai acumular crédito demais em um Estado, o de origem, e não terá nada no outro, o destino do produto. Isso gera desequilíbrio no fluxo de caixa porque pode sobrar crédito em um Estado e no outro a empresa ser obrigada a desembolsar, em dinheiro, todo o pagamento.
Estima-se que 40% das transações dos centros de distribuição das empresas varejistas sejam de caráter interestadual, tendo como destino a mesma titularidade. É para resolver esse ponto que os contribuintes apresentaram o recurso (embargos de declaração).
Votos
O relator, ministro Edson Fachin, votou apenas pela modulação temporal, sem mudar o mérito. Foi seguido pelos ministros Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski.
O ministro Luís Roberto Barroso divergiu parcialmente. Além de ressalvar, na modulação, os processos administrativos e judiciais pendentes de conclusão, votou para que os contribuintes possam transferir os créditos se encerrado o prazo sem que os Estados disciplinem a transferência de créditos de ICMS entre estabelecimentos de mesmo titular.
Além de conceder prazo para que os Estados adaptem a legislação para permitir a transferência dos créditos, Barroso definiu que uma vez exaurido o marco temporal sem que os Estados disponham sobre o assunto, os contribuintes tenham o direito de transferir os créditos, como a sistemática anterior permitia. O voto foi acompanhado pela ministra Rosa Weber.
O ministro Dias Toffoli, que havia pedido vista, seguiu em parte o entendimento. Ponderou ser o caso de se conferir prazo razoável para que lei complementar federal seja editada em harmonia com a tese fixada pelo STF. Por considerar curto o prazo até o fim de 2021, estipulou 18 meses a partir da publicação da ata do julgamento. Ficam de fora as ações judiciais propostas até a data de publicação da ata de julgamento do mérito.
Toffoli diverge de Barroso quanto à solução caso os Estados não disciplinem a transferência de créditos entre estabelecimentos do mesmo titular dentro do prazo. Para Barroso, nesse caso, as empresas terão o direito de transferir créditos, como a sistemática anterior permitia. Já para Toffoli, é melhor não estipular nenhuma consequência e aguardar o cumprimento. O voto de Toffoli foi seguido pelos ministros Alexandre de Moraes (que antes havia acompanhado o relator) e Luiz Fux.
Fonte: Valor Econômico