O comportamento dos consumidores vem se transformando ao longo dos anos e, em uma realidade em que uma linha tênue separa o mundo do varejo digital do ambiente físico (se é que é possível afirmar que há uma distinção entre os dois canais), as pessoas hoje em dia demandam cada vez mais das inovações das empresas para que elas sejam conquistadas e fidelizadas, nos mais variados canais, nas mais variadas formas.
No cenário atual, os consumidores não se contentam com as ações generalizadas que as empresas promovem: o que eles querem é a personalização das ofertas. Afinal de contas, por que uma pessoa vegetariana irá receber oferta de carne? Ou seja, o varejo necessita cada vez mais lançar mão de ferramentas para atender os consumidores da forma que eles querem e não da forma entendida como sendo a ideal.
“É importante se colocar no lugar do cliente, pensar nos fatores humanos, perceber aquilo que impacta o emocional das pessoas”, discorre o professor de varejo e diretor executivo da Foco Gestão Consultoria, Roberto Nascimento.
Nesse sentido, a lição que muitas empresas do setor varejista já aprenderam é que é preciso seguir com a estratégia de colocar em prática o Big Data, ou seja, utilizar as informações que têm disponíveis dos seus clientes para o desenvolvimento de ações que possam incrementar as vendas (quem ainda não investe nisso está perdendo tempo e dinheiro).
Mas já estamos em outro momento do Big Data. Os dados captados dos clientes, somados a outras tecnologias, trazem diversas oportunidades às empresas para atender às demandas dos clientes.“Com as novas possibilidades que temos hoje, é possível criar experiências extraordinárias aos consumidores. Hoje, nós conhecemos mais o nosso cliente, vemos cada movimento dele, podemos entender a ação dele”, explica a gerente geral da divisão da IBM para Watson IoT, Comércio e Educação, Harriet Green.
Nos dias atuais, Harriet mostra que os anseios dos consumidores ultrapassam a questão da personalização das ofertas, porque eles desejam as ofertas “sob medida”, mas na hora que eles querem. E, tendo a tecnologia da informação como aliada, isso já é realidade, como aponta a executiva. “Hoje, é possível fazer a identificação do comportamento dos consumidores e a personalização em tempo real”, acrescenta.
Essa personalização em tempo real é também defendida pelo CIO da Yoox Net-a-Porter Group, empresa de varejo para internet, parceira de marcas de luxo, Alex Alexander. “É preciso engajar os consumidores, proporcionar a eles a melhor experiência. As pessoas estão mais mobile e querem as coisas no momento delas. A personalização tanto das ofertas como da comunicação que se tem com os clientes é a forma como enxergo o futuro”, afirma Alexander.
O professor Nascimento compartilha da mesma opinião de Harriet e Alexander, dizendo que a customização precisa cada vez mais ser entregue ao consumidor. “As redes varejistas que investem nesse sentido saem na frente. Os supermercadistas têm que entender a necessidade do consumidor para entregar a ele aquilo que ele deseja, da forma que ele quer”, defende o especialista em varejo.
O professor de varejo e presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), Eduardo Terra, concorda com esse direcionamento do mercado, mas entende que a realidade ainda está distante. “A tendência da oferta personalizada para os clientes é o estado da arte da relação do varejo com os consumidores. É algo que se percebe, mas raramente é feito na prática”, comenta.
Para Terra, a questão da disponibilidade de ferramentas para tornar essa estratégia possível é recente e não é tão simples como aparenta. “A mecânica para que isso aconteça em larga escala é difícil. É um grande desafio a tecnologia colocar as informações para funcionar. É uma jornada relativamente longa”, discute.
O poder dos sistemas cognitivos
A dúvida sobre a capacidade de desenvolver uma estratégia exatamente do modo que o cliente quer ficou no passado, pois hoje isso é possível a partir dos sistemas cognitivos, que simulam os sentidos humanos, a exemplo do Watson, da gigante IBM, uma das empresas que lideram nessa área de estudos.
O Watson processa e organiza informações a partir de dados não estruturados e gera insights, se mostrando como uma grande revolução para as empresas dos mais variados segmentos, possibilitando assim a personalização de estratégias a serem adotadas com os clientes, na velocidade que eles desejam.
“Os sistemas cognitivos são uma mina de ouro de informação, proporcionando a análise de dados em tempo real. São sistemas que entendem a linguagem do usuário, processam os dados e não têm limites. Eles permitem descobrir novos caminhos e impactos para as empresas. Dessa forma, as companhias podem avançar no relacionamento com os clientes”, ressalta Harriet.
Com total interação com o usuário, o Watson entende não só a voz das pessoas como também interpreta e processa as informações e conversa por meio da linguagem oral e escrita, gerando, em questão de segundos, os dados de acordo com os comandos que lhe são dados, resultando em uma infinidade de ações.
Esse tipo de sistema permite aos profissionais das áreas de marketing e varejo o desenvolvimento de ações muito mais assertivas, pois, ao cruzar a série de informações dos clientes, consegue até mesmo prever o comportamento deles e engajá-los em cada passo na jornada de compra que eles encontram pela frente, seja no ambiente físico ou on-line.
Nascimento explica que o varejo precisa prestar atenção nos sistemas cognitivos, pois cada vez mais os supermercadistas devem ser mais objetivos na personalização das campanhas. “O varejo precisa investir em sistemas que proporcionem esse tipo de resultado. O ideal é colocar esse investimento no radar, fazer um planejamento, para focar nessas plataformas a médio e longo prazo”, explica o professor.
Porém, ao analisar o atual momento político-econômico pelo qual o Brasil atravessa, as implicações para investir em ferramentas como os sistemas cognitivos são inúmeras. “A maior crise da história do país atrasa a nossa jornada em buscar soluções como essa. Para que esse tipo de projeto aconteça, são necessários investimentos pesados ao longo de três a quatro anos, sendo que o retorno é no longo prazo. No momento, os investimentos de longo prazo estão suspensos nas empresas”, analisa Terra, da SBVC.
Não existem limites para os sistemas cognitivos, como apontam os profissionais da área de tecnologia da informação. Além de proporcionar a personalização de ofertas em tempo real, os sistemas cognitivos têm a capacidade de condensar as informações dos clientes, e, como já citado, fazer com que as empresas possam antecipar aquilo que o seu público vai querer.
Isso acontece com base nas informações que as pessoas deixam em contas nas redes sociais, tais como Facebook e Twitter, buscas na internet, somadas aos dados observados no ponto de venda (a exemplo das informações da frequência do cliente na loja e o histórico de compras), uma vez que os sistemas cognitivos interpretam e processam uma gama intensa de informações. Ou seja, todos os passos das pessoas, aquilo que é postado na internet e identificado no PDV podem ser utilizados a favor das companhias e dos supermercados no momento de desenvolver uma campanha.
“O supermercado identifica que o cliente sempre vai à loja no mesmo dia e horário da semana. E, em uma conta em uma rede social, esse mesmo cliente provavelmente posta algo sobre as marcas e todas as informações ficam aí, soltas. O sistema, então, faz cruzamentos que, aparentemente, não fazem sentido, mas que resultarão na oferta que é o desejo do cliente. E, assim, ele identifica e oferece ao cliente o que ele vai querer comprar, o que pode ser, por exemplo, uma caixa de ovos tipo caipira com 12 unidades e uma planta”, exemplifica a líder da unidade de IBM Commerce no Brasil, Mariane Firmino.
Assim, os sistemas cognitivos aprendem com os dados que as empresas armazenam dos clientes, sendo atualizados de forma contínua, e então norteiam as empresas para a tomada de decisão para os mais variados tipos de ações. Esses sistemas auxiliam também a identificar se determinada ação é correta por meio da visualização de padrões e dados do passado, mostrando, por exemplo, o desempenho de determinado alimento em dada ação já realizada.
“Como os dados vão sendo acrescentados constantemente, eu vejo esses sistemas com grande potencial de longa data. São inúmeras informações armazenadas, com dados de ponto de venda, com programas de fidelidade, dados de localização, entre outros. É um sistema que vai ajudar a entender o caminho correto a seguir”, conta o vice-presidente de estratégia e gestão de produto da IBM, Christopher Wong.
Dessa forma, os sistemas cognitivos permitem que as ofertas sejam desenvolvidas sob medida para os clientes, não apenas nas lojas virtuais como também nas lojas físicas. “Com as ações direcionadas no ambiente físico, o cliente sai satisfeito da loja, porque, além de tudo, ele consegue ter uma economia de tempo, que é algo que ele dá valor. Essa é a capacidade do Watson, que antevê o que o cliente vai querer”, diz Mariane.
De acordo com o responsável pela área de Commerce da IBM para a América Latina, Maurício Sucasas, o sistema cognitivo preenche a necessidade do cliente, que deseja que as empresas entendam quais são as demandas dele. “O consumidor quer que as empresas infiram o que ele está desejando, e esse tipo de individualização por escala só é possível ter com os sistemas cognitivos”, finaliza Sucasas.