Pegos pela crise, grupos empresariais que inauguraram recentemente shoppings no Brasil, mas que vinham estruturando os planos desde antes da recessão, se viram obrigados a adaptar o negócio à nova realidade do varejo. Para atrair o lojista, a isenção da cobrança de ‘luva’ e preços de aluguel abaixo da média do mercado têm sido as estratégias mais adotadas.
“Estamos trabalhando com condições diferenciadas. Se o varejista não puder pagar a ‘luva’ (valor cobrado na assinatura do contrato e que dá direito ao uso do ponto comercial), por exemplo, ele faz um acordo de quatro anos, sem arcar com essa taxa, e só paga na renovação desse contrato. Não estamos cobrando o décimo terceiro aluguel, que a maioria dos centros comerciais cobra, e nem multa em caso de rescisão”, afirma o presidente do Grupo Del Rey, João Batista. A empresa inaugurou no dia 27 de outubro o Plaza Shopping Carapicuíba, na cidade de Carapicuíba (SP).
Segundo Batista, além desses aspectos, o valor cobrado pelo aluguel é outro atrativo, já que está muito abaixo dos valores praticados pelo mercado. “Se comparado ao shopping Barueri, por exemplo, que é o mais próximo do nosso empreendimento, o preço do aluguel que estamos cobrando é 20% inferior”, diz o executivo, acrescentando que todos esses benefícios foram a forma encontrada de atrair os lojistas e evitar uma alta taxa de vacância.
Atualmente, das 207 lojas que estarão presentes no shopping 110 já estão com o contrato assinado, o que representaria uma taxa de ocupação de 52%. De acordo com o empresário, os planos do lançamento do novo empreendimento iniciaram já em 2008, após uma reforma administrativa na empresa. “Tem coisa que você inicia e depois não tem como parar. A crise começou a afetar os centros comerciais em 2014. Nessa época, já estávamos com o projeto em andamento e não valeria a pena interromper”, conta Batista.
Realidade do mercado
O caso não é exclusivo do Grupo Del Rey, e, segundo dados da Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce), foram inaugurados em 2016 no Brasil um total de 16 centros comerciais. Mais quatro shopping centers devem ser inaugurados ainda este ano, e para 2017 a previsão é de 30 lançamentos. “Esses shoppings inaugurados em meio à crise foram planejados e viabilizados ainda nos tempos das ‘vacas gordas’”, afirma o sócio-diretor da consultoria GS&BW, Luiz Alberto Marinho. “Muitos têm buscado postergar as datas de inauguração, mas em algumas situações, isso não é possível”, disse ele ao DCI.
Outro empreendimento recém-inaugurado é o Morumbi Town, que foi lançado no dia 11 de outubro na cidade de São Paulo. Em linha com o Plaza Shopping Carapicuíba, os planos começaram a ser estruturados por volta de 2013, antes de a recessão atingir o País. “Calhou de vir a crise no meio do caminho, mas não acho que isso tenha nos prejudicado”, afirma o superintendente do centro de compras, Luiz Siqueira.
Apesar dessa visão, o empreendimento teve que se adaptar ao novo momento vivido pelo comércio nacional. “Tivemos que adequar os custos de ocupação à realidade do mercado, e colocamos um valor mais saudável para o lojista”, afirma. O executivo acrescenta ainda que, na contramão da maioria dos shoppings (que são muito focados nos segmentos de moda e eletroeletrônicos), a ideia do empreendimento é investir nas áreas de lazer e conveniência.
“Queremos trazer esse ramo social, ser o terceiro ambiente do consumidor (o primeiro é a casa e o segundo o trabalho). Conseguimos chegar nessa taxa de ocupação, em grande medida, por conta dessa estratégia que adotamos”, diz Siqueira. Atualmente, o empreendimento está com 97,7% dos espaços com contrato assinado.
Foco nas varejistas do Sul
Para chegar nessa taxa de ocupação, outra aposta foi investir na vinda de varejistas que tinham pouca ou nenhuma presença em São Paulo. É o caso da rede de supermercados Zaffari, que abriu no empreendimento sua segunda loja no estado; da drogaria Panvel, que inaugurou sua primeira operação em São Paulo; e da Tramontina, que também escolheu o centro comercial como sede para sua primeira unidade em território paulista. “O Zaffari foi o primeiro grande contrato que fechamos, e como ele tem várias lojas no Rio Grande do Sul, ele trouxe segurança para que outras operações do Sul do País também viessem”, afirma.
Em relação aos custos de ocupação o executivo diz ainda que em alguns casos pontuais eles também abriram mão da ‘luva’. “Depende do tamanho da loja: se for uma operação importante e que atrai bastante fluxo conseguimos não cobrar pelo ponto. Na negociação com a Tramontina, por exemplo, abrimos mão dessa taxa”, conta Siqueira.
De acordo com Marinho, da GS&BW Consultores, ambas as estratégias são assertivas diante do atual cenário. “Para atrair o lojista o shopping tem que provar que será um empreendimento de sucesso, através de sua proposta de valor, mix de lojas e área de entretenimento. Além disso, tem que oferecer um custo de ocupação menor e ser flexível em relação a isso, para que o lojista entenda que está fazendo um bom negócio em expandir agora ao invés de esperar a melhora da economia.”
A opinião do especialista é compartilhada pelo professor da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap), José Roberto Baldin, que também acredita que a flexibilização na negociação dos custos, somada a uma ‘venda’ que mostre para o lojista os benefícios que o centro de compras agregará para o cliente, são as chaves para uma boa prospecção. Segundo ele, no entanto, os shoppings precisam ter um cuidado grande na hora de definir os prazos.
“A negociação precisa ser bem feita e tem que ter essa noção de que a crise vai passar. Tem que ter uma tolerância, mas ter um prazo para terminar. É possível, por exemplo, fazer um contrato de aluguel com desconto, mas que vá gradativamente diminuindo ao longo do tempo firmado”, afirma.