Por Alexandre Rodrigues | Carioca e flamenguista, o atual líder da Amazon Brasil, Daniel Mazini, trocou o Rio por Londres e passou pelos EUA como executivo da gigante americana do e-commerce até parar em São Paulo para liderar a operação brasileira da companhia fundada pelo bilionário Jeff Bezos.
Em cinco anos disputando para valer o comércio eletrônico brasileiro como marketplace (shopping virtual que também exibe produtos de parceiros), a empresa já conta com dez centros de distribuição e 78 mil vendedores no país, conta o executivo em entrevista ao GLOBO.
O desafio agora é aprofundar no Brasil o modelo já disseminado nos EUA, no qual os vendedores entregam os produtos para a própria Amazon estocar e entregar, chamado internamente de FBA.
É assim que a empresa busca fidelizar seus clientes Prime com frete grátis e entrega em um dia, além do seu serviço de streaming. Com emprego e renda em alta, Mazini se diz otimista com o Brasil, mas não detalha números por se tratar de um grupo de capital aberto nos EUA. Veja a seguir os principais trechos da entrevista.
Qual é o tamanho da Amazon no Brasil?
Temos a parte AWS (serviço de computação em nuvem) e a de loja, que começamos no Brasil a partir de 2012 com o nascimento do Kindle (dispositivo eletrônico de livros digitais). Em 2014, lançamos a loja de livros físicos. Começamos os primeiros passos no marketplace em 2017, com eletrônicos, produtos de casa, mas começamos mesmo com uma pegada maior no Brasil em 2019, com nosso primeiro centro de distribuição próprio, com a nossa tecnologia. Antes usávamos de terceiros.
Foi uma mudança muito grande, expandimos muito para itens de consumo, roupas, etc. Foi também o ano em que lançamos o Prime e a Alexa (assistente virtual) em português. Então 2019 a gente considera mais como nosso ano zero. Tínhamos um centro de distribuição e hoje temos dez, em sete estados. Tínhamos um polo logístico em 2019 e, neste ano, estamos com mais de 100. E temos mais de 100 estações de entrega, que são menores e permitem entregar no mesmo dia ou no seguinte (à compra).
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Passamos de algumas poucas centenas de funcionários, em 2019, para 18 mil, sendo mais de 10 mil em operações. Colocar produtos na caixa, entregar ao cliente final, isso tudo é feito por pessoas. Em tráfego (de internautas), em 2019, a gente estava possivelmente na quinta ou sexta posição no Brasil. Hoje, estamos na segunda (atrás do Mercado Livre).
Que lugar tem o Brasil na Amazon como um todo?
É cada vez mais importante na Amazon mundial. Temos uma subdivisão de países emergentes, que não se referem ao estágio da economia, mas onde a Amazon está começando a operar. Inclui Austrália, Índia, Egito, Emirados, Arábia Saudita, Brasil, México e, recentemente, África do Sul. Nós só ficamos aquém da Índia, que tem 1,8 bilhão de pessoas. Então a operação brasileira já é bem parruda.
Há espaço para crescer no Brasil, que tem emprego em alta e crescimento do PIB, mas ainda tem renda média baixa?
Tem bastante espaço. O e-commerce no Brasil ainda é responsável por apenas 12% das vendas do varejo. Posso considerar isso ainda baixa penetração. Os EUA têm de 17% a 20%, a China, mais de 30%. Temos uma oportunidade muito grande no Brasil. Além de a economia crescer e as pessoas terem maior poder de consumo, o e-commerce é uma parte do varejo que acelerou muito na pandemia, mas ainda tem muito a fazer na experiência do cliente, bons preços, entregas rápidas.
Isso tudo fará cada vez mais parte do dia a dia das pessoas, parte grande das compras delas vai passar pelo e-commerce. Outra coisa que indica isso é a quantidade de competidores no Brasil, que tem muitas opções. As pessoas compram eletrônicos em um lugar, roupa em outro. Queremos ser a loja em que as pessoas possam encontrar tudo.
Estamos otimistas com esse futuro no Brasil. Continuamos olhando para o e-commerce no geral como um oceano azul (estratégia de negócios para ampliar mercados definida em best-seller de mesmo nome) de oportunidades.
Como o FBA consegue entregar em um dia e por que aqui a adesão dos vendedores não é tão grande quanto nos EUA, onde está consolidado?
Temos algumas modalidades para os vendedores parceiros aqui. Podem vender através da nossa loja e entregar eles mesmos, com suas tarifas e transportadores. Tem a opção Delivery by Amazon, em que buscamos na loja ou no armazém do parceiro e entregamos, e tem o FBA, em que armazenamos e entregamos.
A mágica neste último está no fato de que a gente sabe que o produto está em estoque disponível para entrega. Entra numa fast track, uma promessa firme de entrega para o cliente, que dá um valor muito grande a isso. Conseguimos fazer essa entrega muito mais rapidamente que um vendedor individualmente tentando ligar para uma transportadora ou usando o correio.
No FBA, o produto de um parceiro acaba com o mesmo tratamento de um nosso, porque já está dentro da nossa network e ganha o selo Prime. A gente cobra fee (taxa paga pelo vendedor) no FBA, que já considera que todas as entregas Prime serão gratuitas (para o consumidor), mas aumenta muito a conversão (venda), por isso vale muito a pena para os vendedores.
Os que mais crescem hoje são os que entraram no FBA. Muitas vezes o consumidor entra na plataforma para procurar um produto e filtra para ver só ofertas Prime.
Isso significa que vocês vão precisar de mais centros e polos de distribuição?
Estamos sempre revisando a estrutura, mas não construímos muito acima ou antes da demanda. Só quando ela vem. E, com mais clientes, o giro aumenta. Então talvez a gente precise de menos espaço para a mesma quantidade (de itens).
Com entrega mais rápida, o produto fica menos tempo na prateleira. Vamos balanceando. Conseguimos crescer de um Prime Day para o outro com a mesma logística praticamente porque ficamos mais eficientes. Mas, agora, para a Black Friday, sentimos que precisaríamos de um centro novo, e abrimos o de Recife.
A Black Friday e o fim deste ano serão mais fortes em vendas que o ano passado?
Sim. Vimos uma semana do consumidor e um Prime Day mais fortes (neste ano). Tivemos um setembro de mais vendas. Esperamos a Black Friday seguindo a tendência.
O senhor é embaixador da Copai, uma coalizão de executivos que defende a licença-paternidade em todas as empresas. A Amazon dá seis semanas aos funcionários homens quando nascem seus filhos. Por que se engajou na causa e como ser pai afetou sua carreira?
Na área pessoal, tenho um antes e depois. Quando tive minha primeira filha, hoje com 9 anos, não tinha licença estendida. E avisei meu chefe na época: estou saindo, vou ficar três semanas fora, contate-me por e-mail. Era um momento muito especial para nossa família.
Com o segundo filho já tive as seis semanas, que dividi. Fiquei três semanas pós-parto com minha esposa em casa e mais três quando ela voltou a trabalhar para ajudar na adaptação de creche. Foi uma diferença gritante na qualidade de conexão como família, com os filhos. Eu me apaixonei pelo tema. Ser pai me deixou um profissional melhor, com mais empatia.
Participar da maternidade da minha esposa me fez entender como é difícil esse trabalho que mulheres enfrentam quase sempre sozinhas. É muito difícil, por isso estou apoiando bastante essa ideia. Na Amazon, temos bom engajamento. Não tem mais discussão se alguém vai tirar a licença-paternidade. Só avisa: meu filho está nascendo, vou sair seis semanas.
Estamos revendo para ver se aumentamos a licença. O feedback dos homens é muito positivo. Quantas quantas vezes um homem vai ter filhos durante a vida? Todo ano precisa ter 30 dias de férias, não pode tirar seis semanas quando tem um filho? Então é uma coisa que não compromete tanto.
Lógico que tem discussões diferentes quando estamos falando de um ambiente fabril ou do corporativo. Isso a gente tem falado bastante na Copai, mas os homens aqui veem de maneira muito positiva, alguns dizem que é o melhor benefício que Amazon deu. Voltam pessoas melhores.
Sou bem orgulhoso de apoiar esse tema e acho que os homens aqui dentro da Amazon valorizam muito isso. Se for um casal do mesmo sexo e o funcionário é o primeiro cuidador, ele pode tirar os quatro meses mais dois meses previstos para a licença maternidade. A gente tenta equalizar bastante essa discussão para tirar esse peso sobre a mulher, de ter de cuidar da família, ser profissional de sucesso e ainda tomar conta da casa. Muitas têm de fazer esse jornal tripla, que é bem injusta.
Temos uma diversidade grande aqui, com muitas mulheres no corporativo e nas operações. Dos 10 mil operacionais, mais da metade é de mulheres. Operador de empilhadeira virou um cargo praticamente de mulher na Amazon. Elas são cuidadosas, dirigem superbem, são treinadas. A gente gosta muito que as pessoas que tenham famílias possam ser bem-sucedidas aqui.
Fonte: O Globo