Todos os dias somos impactados por novas tecnologias no varejo. Tecnologias essas que surgem como tentativa das marcas em atingir um consumidor cada vez mais exigente e volátil. Mas o quanto essas estratégias estão de fato alinhadas às novas demandas dos consumidores?
A pesquisa “consumidor ultradinâmico” (high-velocity consumer) foca nas experiências cotidianas do hoje para entender o futuro do varejo.
A WGSN é líder global em pesquisa de tendências de comportamento e busca avaliar as formas de pensar e agir para compreender as demandas de hoje e do futuro. O “consumidor ultradinâmico” busca mapear esse contexto de mudança e os principais motivadores de comportamentos ainda desconhecidos – ou pouco explorados – pelo varejo. Afinal, o mundo do varejo se move a uma velocidade nunca antes vista – e, diferente do que muitos pensam, o que está acelerando estas mudanças não é a tecnologia em si, mas as próprias pessoas.
Durante este estudo, encontramos seis grandes drivers que ditam condutas contemporâneas de consumo. Drivers relacionados à sociedade, tecnologia, indústria, meio ambiente, política e a criatividade. Nele, identificamos seis mudanças importantes no comportamento do consumidor e as principais estratégias a serem implementadas para continuar relevante a partir de 2020. São elas:
- A revolução das compras pelos dispositivos móveis
- A importância dos sentimentos
- A economia da confiança
- Preocupações climáticas
- A geração longeva
- O fim da posse
No mês passado, falamos sobre o impacto dos smartphones e as possibilidades que surgem a partir dessa nova forma de consumir. Este mês falaremos sobre o segundo tópico da lista: A importância dos sentimentos.
A importância dos sentimentos
Se, por um lado, todo e qualquer varejista se importa em investir em uma oferta cada vez mais tecnológica, voltada à inteligência artificial e experiências digitais, por outro a importância do contato humano se torna um diferencial competitivo fundamental.
De acordo com a pesquisa global “Future of Customer Experience”, feita pela consultoria PwC, cerca de 74% dos consumidores querem mais interação humana. Porém, 59% de todos eles acham que as empresas perderam a habilidade de criar um aspecto humano na experiência do cliente.
Interação humana x automatizada
Percentual de pessoas que dizem: “Quero interagir mais com uma pessoa real conforme a tecnologia avança”.
Fonte: Pesquisa “Future of Customer Experience”, feita pela consultoria PwC entre 2017/2018
Uma das principais queixas contemporâneas do mundo ocidental se sustenta no discurso da falta de tempo – ou seja, as pessoas estão sempre atrás de experiências que ajudem a otimizar suas vidas. Por outro lado, sabemos que quanto mais tempo em loja, maior a disposição a compras. Como conciliar essas duas realidades?
Diferenciando a experiência personalizada da experiência pessoal
Parece que hoje há uma preocupação crescente em se criar experiências personalizadas (recomendações de produtos com base em um algoritmo), mas ainda não há foco o suficiente para criar experiências pessoais (interação humana, que evoca emoções).
E a experiência pessoal é fundamental para uma decisão de compra. De acordo com o Relatório de Estado Global do Atendimento ao Cliente 2018, da Microsoft, 95% dos entrevistados consideram o atendimento como o serviço mais importante para tomarem decisões de compra e se fidelizarem a uma marca. O estudo reúne respostas de 5 mil consumidores e foi feito em cinco países – Brasil, Alemanha, Japão, Reino Unido e Estados Unidos. Somente no Brasil, 85% das pessoas consideram o atendimento como serviço determinante na sua relação com as empresas.
Enquanto varejistas e consumidores buscam experiências de compra fáceis e rápidas, a realidade é a seguinte: quanto mais tempo gasto na loja, maior é a interação entre clientes e vendedores, o que aumenta a propensão de vendas. Em Nova York, o aumento da interação com os vendedores na loja da NBA na Quinta Avenida levou a ganhos significativos. A loja descobriu que os clientes que ficaram por ali por mais de 10 minutos compraram 370% mais do que aqueles que ficaram por quatro minutos ou menos.
Enquanto isso, os clientes que interagiram com um vendedor aumentaram para 182% a taxa de conversão de vendas. E aqueles que interagiram diversas vezes, passaram mais tempo na loja e experimentaram os produtos, compraram de duas a três vezes mais itens. Ou seja, quanto maior a experiência pessoal, maior o resultado nas vendas.
Dentro da loja: invista nas pessoas e em tecnologias que aprofundem relações
Se estratégias voltadas à interação humana serão chave de diferenciação para as empresas do futuro, agora é a hora de entender como elas podem acontecer; essas interações podem ocorrer presencialmente, sem o uso da tecnologia, ou através da tecnologia como intermediadora das relações.
Invista nas pessoas
A loja de departamentos inglesa John Lewis & Partners (até o ano passado John Lewis) incluiu o “& Partners” como parte de sua estratégia de rebranding, voltada à capacitação do seu time de funcionários. “Enquanto outras empresas investem em drones, nós investimos em nossos funcionários. Enquanto outras empresas estão cortando custos, nós investimos naquilo que é o nosso principal ponto de diferenciação”. A eficácia do investimento nos funcionários se traduz nos resultados recentes da empresa: clientes que usam os serviços de styling personalizados da John Lewis gastam, em média, 30% a mais por ano do que os clientes que não usaram esse serviço. Fora isso, os seis consultores de estilo da loja do distrito de White City são responsáveis por um quinto das vendas de moda feminina da loja.
Invista em tecnologias que aprofundem relações
Outras marcas preferem investir na tecnologia como ferramenta de interação. A Nordstorm, cadeia americana de lojas de departamento de luxo, criou um serviço personalizado, o Nordstorm Local, onde o foco está nos ajustes das peças e no styling. Como funciona? Os produtos são escolhidos online e enviados ao local. Por meio do Style Board (serviço de curadoria), o espaço ajuda, através dos consultores de estilo, os clientes a experimentarem os produtos escolhidos. Os stylists da loja escolhem as peças de acordo com um questionário respondido online pelos clientes. O cliente recebe, enfim, um e-mail com as peças escolhidas – que estarão esperando por ele em um provador da Nordstorm Local.
O que vem por aí? Tecnologias que entendem como você está se sentindo
Esta conexão pessoal não precisa – e não deve – terminar na saída da loja. Embora os varejistas estejam apostando alto na IA para cortar custos ao criar processos de venda simplificados, é preciso também buscar estratégias criativas de longo prazo capazes de construir conexões emocionais com o público.
A Amazon, por exemplo, está desenvolvendo uma nova tecnologia para que a Alexa consiga identificar o humor das pessoas por meio do tom de voz. No paralelo, a empresa já patenteou uma solução que consegue reconhecer se a pessoa está deprimida ou doente e sugerir produtos de acordo com o problema encontrado – uma oportunidade em se criar um diálogo íntimo e mais personalizado. O Walmart também entendeu que poderia usar a tecnologia para criar soluções mais autênticas e personalizadas e patenteou uma tecnologia que escaneia os rostos dos clientes para identificar aqueles que estão mais agitados. Assim, o sistema consegue identificar caso o cliente esteja frustrado na loja e envia um vendedor para ajuda-la.
Se antes dependíamos do comércio de bairro para estabelecer relações íntimas e pessoais, os assistentes inteligentes agora aparecem como uma alternativa para criar esse tipo de relação entre marca-pessoas. Um ponto para se prestar atenção é em relação a quanto essas tecnologias podem ser intrusivas – enquanto na Ásia elas já são mais comuns e bem aceitas, no Ocidente ainda parece haver uma resistência.
Pontos de ação: o que já pode ser feito?
Para fechar, destacamos algumas ações que já podem ser colocadas em prática pensando nas interações humanas no varejo – sejam elas presenciais ou via tecnologia:
- Coloque o aspecto humano como ponto central na sua estratégia de loja. Procure criar experiências mais pessoais.
- Vá além do que o cliente diz que está procurando. Crie estratégias que explorem como ele quer se sentir.
- Desenvolva estratégias que reúnam o humano e o tecnológico para criar uma experiência de loja inesquecível.
No próximo mês, daremos continuidade aos tópicos tratados em nosso estudo sobre o consumidor ultradinâmico. Em junho, será a vez de discutir a economia de confiança.
Fonte: Novarejo