Por Adriana Mattos e Monica Scaramuzzo | Os planos em discussão por redes varejistas brasileiras, para se ajustar à realidade de imposto de importação zerado para produtos de até US$ 50, variam segundo a estratégia de cada uma. Produzir no Mercosul e aumentar importações da Ásia são alternativas em estudo.
O Valor apurou que a rede Riachuelo já vem aumentando neste ano, em relação a 2022, o recebimento de mercadorias por meio de sua joint venture com a paraguaia Texcin, maior fabricante de vestuário daquele país, com 400 empregados. A rede brasileira tem acordo com a Texcin desde 2015 e 35% do que vende vem do exterior.
“O que ouvimos deles é que eles [Riachuelo] estão procurando aumentar a produção no Mercosul”, diz um fornecedor brasileiro de moda de Santa Catarina.
O grupo Soma, dono da Hering e da Farm, vai criar uma plataforma de comércio eletrônico no Uruguai para vender produtos importados da China para o Brasil. Produtos asiáticos serão importados pelo marketplace, que poderá vendê-los no mercado brasileiro, dentro do modelo “cross border”.
Mercadorias podem ser produzidas no Uruguai ou nos países do bloco, e enviadas de lá aos consumidores no Brasil, dentro do ambiente das normas do Mercosul.
A Soma já está procura centros de distribuição na região de Montevidéu. A dona das marcas Farm e Hering deve ter sua operação estruturada entre 6 e 12 meses.
A Renner produz no Peru, por meio de parceiros, utilizando algodão daquele país, e no Paraguai, também com algodão local, e o Valor apurou que a empresa tem feito contatos com fabricantes para ampliar o envio de itens desses países ao Brasil, respeitando as regras locais de importação. Uma fonte próxima da Renner afirma que a rede sempre busca oportunidades e as ações não têm relação com a isenção de imposto de importação para itens de até US$ 50.
Ainda afirma que um modelo de “cross border” criaria um venda pouco representativa à Renner, de remessas individualizadas, e que a questão não está na mesa hoje.
A Petz estuda, nos últimos meses, trazer mercadorias, como acessórios e roupinhas para cães e gatos, da China.
“Há muitas redes, de todos os portes, de capital aberto e fechado, analisando alternativas num cenário em que vamos ter que passar Black Friday e Natal com as plataformas estrangeiras com imposto zero, já depois de dois anos fracos para o varejo”, diz o diretor de uma associação industrial.
Pela Lei da Maquila, regulamentada no ano 2000 no Paraguai, 40% do valor agregado de um bem enviado daquele país deve ter origem paraguaia ou de países do Mercosul (como insumos, energia, mão de obra etc). Em contrapartida, a empresa tem um tributo único de 1% sobre o valor agregado.
É possível instalar ou subcontratar empresas paraguaias para produção, sendo que da entrada do insumo até a manufatura e sua exportação não se pode ultrapassar 24 meses.
Há 278 empresas no Paraguai usando os benefícios da lei, gerando 25 mil empregos, segundo Ministério da Economia paraguaio. “Não queremos tirar empregos dos brasileiros. Só queremos substituir alguns bilhões que importam da China. É um ganha-ganha” disse o ministro da Economia do Paraguai, Carlos Valdovinos, em entrevista ao Valor em agosto.
No caso do Mercosul, as regras são um pouco diferentes. Empresas que fazem comércio entre países do bloco têm que respeitar limites de importação para usufruir do imposto zero.
Para comprar mercadorias do Paraguai com a isenção, é preciso respeitar um limite de insumos importados de 60%, e do Uruguai, de 50%.
A partir deste ano, as empresas que fazem comércio entre os países do bloco podem fazer a autodeclaração de origem, necessária para definir a taxa de nacionalização, dispensando a necessidade do Certificado de Origem emitido por entidades habilitadas.
Para um fornecedor de roupas femininas de Santa Catarina, com fábrica do Paraguai, isso pode ser preocupante. “Eu produzo aqui e no Paraguai, e para mim, não há efeito, mas com a autodeclaração, uma empresa vai dizer que respeita as normas, e quem vai checar?”
Procuradas, Riachuelo, Renner, Soma e Petz não comentaram o tema, assim como o IDV, entidade que reúne varejistas no Brasil.
A pedido de Renner e Riachuelo, a Abvtex, associação que representa o varejo têxtil, encaminhou nota ao Valor em que informa que “não faz sentido conceder benefícios fiscais a fábricas instaladas em um país que é o segundo maior PIB mundial, no caso da China, e que já oferece subsídios à produção local e exportação, em detrimento da produção brasileira”.
Afirma que a medida “coloca em xeque cadeias produtivas e 1,7 milhão de empregos estabelecidos no Brasil”. E confirma que há empresas começando a reavaliar suas estruturas e condições de produção. Ainda afirma que o programa Remessa Conforme desequilibra as condições competitivas. Procuradas, as empresas não se pronunciaram.
Fonte: Valor Econômico