A pandemia foi um momento de virada na relação com entregadores, diz Sérgio Saraiva, presidente da Rappi para o Brasil.
As medidas de distanciamento social fizeram a quantidade de pedidos no aplicativo triplicar nos meses com maiores restrições. A alta, porém, não gerou demanda suficiente para manter satisfeitos os muitos entregadores que passaram a prestar serviço para a empresa como alternativa à perda de renda, afirma.
O executivo diz que, após o desequilíbrio, a Rappi buscou aproximação com os entregadores e a relação melhorou. Em julho, os profissionais fizeram paralisações por melhores condições de trabalho e mais segurança.
A Rappi conseguirá manter o avanço que teve na pandemia? Crescemos três vezes no número de pedidos no pico da pandemia. Também vimos que o engajamento dos usuários aumentou. Eles estão comprando em mais de uma vertical. Entram para comprar no restaurante, mas usam também supermercado.
Para aumentar o engajamento, buscamos entender melhor o usuário o tempo todo. No mundo, as pessoas usam 4 ou 5 aplicativos por dia. O resto fica esquecido. Queremos ser um desses cinco. Por isso, precisamos criar novas situações de consumo. No pós-pandemia, vamos investir em novas frentes para que o app continue prioritário.
Por que ter um braço financeiro? Oferecemos crédito a pessoa jurídica com taxas abaixo das cobradas pelo mercado. Isso porque estamos financiando um parceiro, não adianta cobrar o que o banco cobra e deixar ele em dificuldade. Não queremos ganhar com produto financeiro. O serviço viabiliza o crescimento do ecossistema.
Para o consumidor também é possível reduzir taxas? As taxas ainda estão em estudo. Nosso cartão terá o maior cash back (dinheiro de volta) do mercado. Isso é possível porque seremos banco e emissor e vamos gerenciar o ecossistema de compra e venda.
Como avalia os questionamentos às relações da empresa com entregadores? No início de março, muita gente estava trabalhando na economia informal. Com a pandemia, Esse pessoal veio buscar trabalho nos aplicativos.
Os pedidos do Rappi cresceram três vezes, mas o número de entregadores subiu de forma desproporcional. Aprendemos a regular, porque não adianta você ter uma entrega por dia por entregador.
Se acontecer, ele sai para trabalhar e volta para casa com um valor muito baixo. Esse desequilíbrio foi com todas as empresas de delivery porque isso nunca tinha acontecido na história. Agora gerenciamos de maneira mais saudável.
A relação com o grupo mudou? Melhorou bastante. O que fazemos é ter uma escuta ativa, avaliamos o que está dando certo e o que podemos melhorar. Queremos cuidar desse equilíbrio.
Os entregadores reclamaram que não tinham seguro. Mas já oferecíamos o produto desde 2019 e vimos que comunicávamos mal, reforçamos isso. Eles também pediram convênios e descontos com parceiros. A gente tinha, mas não na demanda deles, então aumentamos a quantidade.
Tínhamos um sistema de pontos que rankeava os entregadores. A implantação não foi bem feita. Tiramos e voltaremos gradualmente, reformulando juntos.
Há espaço frequente de interlocução? Nós já tínhamos um canal de comunicação e ele foi intensificado. Temos “focus groups” (grupos de conversa), participamos de grupos de WhatsApp para saber o que está dando certo e errado. Já vínhamos construindo isso, mas precisou desse momento de virada.
Como acompanharam a segurança dos entregadores na pandemia? No final de fevereiro, montamos um plano de ação. Fizemos conferências com empresas da Coreia, China e Itália para saber o que deu certo e mapeamos nossos processos para verificar pontos de contaminação.
Criamos a entrega sem contato. O entregador deixa a encomenda no chão, dá passos para trás e espera o cliente pegar. Passamos a dar vídeos com orientação de segurança.
Fizemos acordo com a Cruz Vermelha. Entregadores com suspeita de Covid-19 foram orientados a procurar um médico, enviar atestado para serem afastados, recebendo a mesma média de comissões.
Restaurantes vêm reclamando das taxas dos aplicativos e buscando alternativas independentes. Como afeta a empresa? Como buscamos saúde do ecossistema, não temos problemas com taxas. Não temos as taxas mais altas. Ficamos 30% abaixo dos maiores níveis do setor. Não adianta cobrar uma taxa alta se o restaurante vai morrer. Esse movimento nos impacta em raríssimos casos. E penso que é saudável a discussão.
Financeiramente, a pandemia foi período de investir ou de colher resultados? Estamos ainda em fase forte de investimento. Acreditamos que o Brasil é prioritário, com muito para crescer, avançar em novas verticais e consolidar aquelas em que estamos. Além disso, não há um superapp (aplicativo que reúne grande volume de funções) no Brasil ainda e queremos nos posicionar como o principal da América Latina.
Fonte: Folha de S. Paulo