Entre os legados que a pandemia deixará, um dos principais para os negócios é a importância que os consumidores passaram a dar à responsabilidade e ao propósito das marcas.
Em março, um em cada quatro brasileiros esperava que as marcas se envolvessem no combate à pandemia, segundo o “Barômetro covid-19”, da Kantar Brasil. Cinco meses depois, essa proporção tinha aumentado para um em cada três. Dados também de agosto mostram que 23% dos entrevistados querem que as marcas mostrem que a crise pode ser derrotada, e 16% querem que elas sejam práticas e realistas.
“A pandemia e todas as suas dificuldades confirmaram que os consumidores procuram muito mais em uma marca do que apenas descontos. O modo como uma marca se comporta em relação à comunidade à sua volta e, por consequência, a seus problemas diários, determina o nível de engajamento que as pessoas têm com ela”, diz Luciana Piedemonte, diretora e líder de brand strategy da Kantar Brasil.
Propósito das marcas como guia de compras
A tendência é global, conforme mostra levantamento feito pela consultoria Deloitte com 2.477 pessoas em oito países. O estudo “2021 Global Marketing Trends” mostra que os consumidores estão cada vez mais atentos ao propósito das marcas como guia de suas preferências de compra. E que isso se torna mais importante se a empresa atua em um setor que atende a alguma das necessidades essenciais que ganharam importância na pandemia, como os setores bancário e varejista.
Mais do que sair fortalecido depois da crise, o conceito de responsabilidade social empresarial deve se tornar determinante para a diferenciar as marcas que vão sobreviver e as que vão naufragar por conta de inércia ou oportunismo.
“A sociedade começou a exigir um posicionamento de compartilhamento de valor e geração de impacto positivo que vai além da transação de produtos e serviços. Essa demanda virou determinante para o sucesso de uma empresa. Com a pandemia e todas as questões sociais, ambientais e econômicas que ficaram escancaradas, isso se faz ainda mais urgente”, afirma Mônica Gregori, cofundadora da Cause, agência especializada em ajudar marcas e organizações na identificação e gestão de causas.
Três casos recentes exemplificam essa tendência: o da Natura, com a campanha de Dia dos Pais estrelada por Thammy Miranda; o do Magazine Luiza, com seu programa de trainees apenas para candidatos negros; e o do Carrefour, com a morte de um consumidor agredido por seguranças em uma de suas lojas.
Nos dois primeiros casos, as empresas foram atacadas por uma parte do público, mas muitos tomaram sua defesa e elas chegaram a ganhar valor de mercado. Já as ações do Carrefour caíram mais de 5% após o incidente, fora o prejuízo à imagem da empresa.
Consumidor é vigilante de erros e advogado de causas
Segundo Mônica, com as redes sociais, tudo ficou mais transparente e não há mais como esconder ou manipular o que chega para o público.
O consumidor passou a ser um vigilante, mas também um advogado das empresas e das causas com as quais se identifica. O momento é de transformação, com pequenos negócios que já nascem imbuídos de um propósito e grandes empresas começando a se adaptar à nova realidade.
Mas entre a intenção, o discurso, e a prática, existe um longo caminho. “Ainda há muito ‘cause washing’ [envolvimento falso ou superficial com uma causa], porque tem gente que não entendeu que isso não é uma ação de marketing, uma moda. É o novo modelo de negócios, de desenvolvimento”, disse Mônica.
“A mudança está na sociedade e, como consequência, as instituições —e as empresas são instituições— precisam mudar. São os consumidores que estão fazendo as empresas serem mais responsáveis”, afirma a executiva.
Fonte: UOL Economia