Sergio Zimerman diz como empresa tem preservado margens em ambiente de inflação e revela alívio dos preços do setor no 2º tri
Por Marcelo Sakate
“Não vai ser o rabo que vai abanar o cão, mas o contrário.” Com uma metáfora alinhada ao business, Sergio Zimerman, CEO e fundador da Petz (PETZ3), descreve a receita para guiar os negócios da maior rede de produtos e serviços para pets do país, no momento em que a ação negocia nas cotações mínimas de sua curta história de quase dois anos na bolsa brasileira.
“Sabemos que temos que cuidar do NPS [Net Promoter Score, métrica de satisfação] dos clientes, do crescimento, da rentabilidade. Não é o preço da ação que faz uma empresa ser boa, mas ter uma empresa bem administrada se reflete no preço da ação no médio e longo prazo”, disse em entrevista à Bloomberg Línea.
O papel da Petz encerrou a sexta-feira (22) negociada a R$ 9,87 e queda acima de 50% em 12 meses. Apesar da desvalorização, a ação é uma das preferidas de analistas no setor de varejo, com recomendações de compra e preços-alvo com upside acima de 100%.
O empreendedor e executivo, que fundou a companhia há 20 anos, conta a estratégia para tentar conciliar dois objetivos que nem sempre dialogam: crescimento acelerado e rentabilidade. E isso com pressões de custos de curto prazo diante da inflação mais alta em duas décadas. Nesse sentido, Zimerman revela que os números do segundo trimestre, que serão divulgados em 10 de agosto, devem refletir uma notícia positiva: a estabilidade dos preços do setor de pets.
Outra informação que ele e a CFO da Petz, Aline Penna, que também participou da entrevista, citam como relevante para investidores é o que descrevem como sacrifício menor da margem: ela deve ceder 50 pontos base no ano em um ambiente não só de pressão de custos como de investimentos com o plano de expansão de lojas físicas, com 50 novas unidades. “Estamos on track [no plano]”, diz o CEO.
A avaliação sobre a margem atualiza uma sinalização que havia sido dada em teleconferência sobre o primeiro trimestre.
“Às vezes o mercado olha para um indicador de forma isolada e acha que é ruim. Um exemplo é o same store sales [vendas de mesmas lojas], que pode estar baixo. ‘A operação está esgotando’, dizem. Isso está longe de ser verdade. Como temos essa estratégia agressiva de expansão, às vezes o same store sales de uma praça pode estar negativo. Mas a combinação com as lojas abertas naquela praça revela um ganho de share fantástico. A combinação de negócios faz muito sentido”, diz o CEO.
O segundo semestre também marcará o lançamento do projeto-piloto de um plano de saúde para pets, com um modelo verticalizado, ou seja, em que a companhia cuidará da operação de clínicas e hospitais da rede própria. Zimerman explica que será um momento de aprendizado para entender o que pode gerar mais valor e fazer sentido para os donos de pets, mas já antecipa o que será evitado.PUBLICIDADE
“Os planos hoje existentes operam com mensalidades mais baixas e um nível de serviço mais baixo também, com baixa cobertura. O que pretendemos fazer é oferecer mais valor para cada tutor.”
É um mercado potencial que nasce com a referência dos 300 mil clientes recorrentes da Petz, o dobro do número de vidas com cobertura de plano de saúde em todo o mercado. Em todo o país, são cerca de 90 milhões de animais de estimação, segundo os executivos. E que pode alimentar ainda mais os gastos do cliente com seus pets na companhia, ampliando o chamado share of wallet.
“Serviços trazem muita lealdade, e também do ponto de vista de produto. Nossos clientes que consomem serviços compram de 2 a 3 vezes mais produtos da Petz”, diz Penna.
Veja a seguir a entrevista com Sergio Zimerman, CEO da Petz, e Aline Penna, CFO:
Como a inflação tem impactado a Petz, dado que há pressão nas duas pontas: no custo de produtos e no poder de compra da população?
Sergio Zimerman: Acompanhando o setor há mais de dez anos, o segmento pet se mostra mais resiliente do que outros do varejo em momentos como o atual. Alguns insumos subiram bem acima da inflação e isso já ao longo de 2021. Mas, em 2022, observamos a desaceleração da inflação do segmento pet, o que a coloca alinhada ao IPCA, por exemplo. Foi o que aconteceu no segundo trimestre.PUBLICIDADE
Do lado do comportamento do consumidor diante da inflação, observamos que ele manteve a compra do pet food com as marcas habituais. Mais do que alimentação, o consumidor entende que a ração envolve uma questão de saúde do pet e, portanto, decide não fazer um corte de despesa optando por marcas mais baratas, porque há efeitos perceptíveis nos pêlos ou na disposição, por exemplo.
O consumidor acabou fazendo corte de despesas discricionárias: em compras de brinquedos ou petiscos, passou a dar um intervalo maior antes de trocar a casinha ou a caminha do pet. Tudo que não impacta diretamente a saúde foi postergado ou teve a quantidade de compra reduzida.
E como esse novo mix está impactando o resultado da Petz?
Zimerman: Olhando o mercado como um todo, a ração tem muito menos margem do que os itens discricionários. Isso acontece porque esses itens geralmente são abastecidos pela indústria aos pet shops, enquanto a ração passa por um intermediário, que é o distribuidor.PUBLICIDADE
No caso específico da Petz, como nos relacionados diretamente com a indústria, essa margem do distribuidor não existe. Portanto, a margem de ração é menor, mas não muito menor do que a de itens discricionários. Graças a esse equilíbrio, temos assistido nos últimos trimestres o avanço do mix em favor do pet food sem uma deterioração significativa da margem. Mas varejistas pequenos devem estar sofrendo mais com a queda das vendas de itens não essenciais.
Aline Penna: O pet food oscila entre 60% e 65% [das receitas], mas não é que os demais 40% são discricionários. Medicamentos respondem por quase 10%, e outros 10% são de artigos de higiene e limpeza, como tapetes. Ou seja, 80% do mix são mais resilientes e recorrentes, e 20% são dos acessórios discricionários em geral.
E qual tem sido a estratégia para manter as vendas de produtos com margens mais altas?
Zimerman: Trabalhamos com estratégias promocionais e temos um aplicativo totalmente personalizado para o e-commerce, que busca estimular a compra desses itens. É paradoxal: apesar da inflação mais alta em duas décadas, é o melhor momento da percepção de preço do consumidor da Petz em termos de NPS [Net Promoter Score]. E isso acontece principalmente porque este é o momento em que mais intensificamos a personalização da oferta customizada.
Oferecemos 10%, 15%, 20% de desconto em cima de produtos relacionados ao perfil de compra ou, muitas vezes, apresentando itens que ele já comprou no passado, posicionando a Petz como um one stop shop. É uma estratégia que teve o roll out [lançamento] no meio desse cenário de inflação, mas não por causa dela, e que tem funcionado muito bem. A percepção de preço, que era ruim, passou a melhorar.
Penna: Por exemplo, sabemos que um cliente tem um cachorro e que faz muito tempo que não compra uma caminha nova. Conseguimos saber qual foi a última vez ou qual a frequência de compra e ofereço 20% de desconto. Ou sabemos que compra um determinado snack. Oferecemos desconto para que o upsell, para que essa pessoa compre o produto de uma categoria acima. Adotamos essa estratégia tanto para que o cliente experimente novas categorias como para fazer o trade up.
Zimerman: Muitas pessoas pensaram que, neste momento de inflação, poderia ocorrer o trade down, como a troca de ração super premium por premium. Isso acontece, mas o que os dados mostram é que o mais frequente é que o consumidor deixou de fazer o trade up, algo que fazemos em maior grau em momentos de normalidade econômica.
Mas, como disse antes, os dados de inflação do setor no segundo trimestre são animadores. Embora o índice em 12 meses esteja em quase 12%, em abril, maio e junho quase não houve aumento de preços. Essa estabilidade talvez tenha sido a melhor notícia que podemos dar sobre o trimestre.
Penna: É impressionante. Nesses três meses, voltamos a ver o upsell acontecer.
Quais são as principais apostas pensando em novas avenidas de crescimento?
Zimerman: Essa expansão tem três pilares: estamos on track para chegar ao fim do ano com as 50 novas lojas. O segundo pilar é a lição de casa de fazer a integração das quatro aquisições que fizemos, em termos de governança, processos, aspectos fiscais, financeiros e de estratégias. E tudo isso mantendo a motivação dos empreendedores das empresas adquiridas, porque complementam o nosso negócio.
E o terceiro pilar é continuar a fortalecer o nosso ecossistema, especialmente na frente de serviços com a marca Seres. Temos avançado na abertura de hospitais e nos estudos para entrar em laboratórios. Isso já se tornou um plano de ação em que decidimos atuar de forma orgânica.
No segundo semestre, esperamos lançar um piloto de plano de saúde para que possamos colher aprendizamos e, na sequência, fazer o roll out no mercado.
Como vai funcionar esse plano de saúde para pets?
Zimerman: Será um plano de saúde totalmente verticalizado, diferente de tudo o que tem hoje no mercado. Os planos hoje existentes operam com mensalidades mais baixas e um nível de serviço mais baixo também, com baixa cobertura. O que pretendemos fazer é oferecer mais valor para cada tutor que temos.
Penna: A penetração hoje é muito baixa. São cerca de 90 milhões de pets no país hoje e 150 mil vidas cobertas por planos de saúde. O potencial desse mercado é enorme se fizermos do jeito certo, sendo algo bom para ambas as partes. E temos os clientes da Petz como o público-alvo potencial, sem contar os que já são da Seres – temos hoje 15 hospitais e 140 clínicas. Na Petz, são 300 mil clientes recorrentes que podemos acessar primeiro antes de atacar para fora.
Como será esse projeto-piloto?
Zimerman: Acreditamos muito em ter cabeça de startup para desenvolver.Vamos testar, aprender, errar, e se isso acontecer no piloto, vamos corrigir rapidamente. Uma vez que tenhamos um modelo que funcione, vamos levantar mais dados para ter muito mais segurança do que vamos encontrar. Por exemplo, se em cada 100 clientes da Petz, 10% optem pelo plano de saúde, extrapolamos para a base.
Agimos assim em outros projetos. Mas uma característica nossa é não ter pressa. Não entregamos só para entrar no mercado e depois correr o risco de não ter perspectiva de crescimento.
Um grande exemplo de que podemos demorar um pouco mais para entrar, mas, quando o fazemos, é da maneira certa, é o nosso modelo de omnicanalidade. Em 2015, o canal online no segmento pet era praticamente inexistente no Brasil, embora já tivesse representatividade no exterior.
E a Petz decidiu não entrar em e-commerce e preferimos estudar mais o mercado para entender qual modelo seria rentável. E depois entendemos que esse modelo exigia uma plataforma digital em que os pedidos fossem expedidos a partir das nossas próprias lojas. Mas, para chegar a esse ponto, precisávamos de uma operação física de funcionasse muito bem. Colocamos o piloto para funcionar em 2018 e completamos o roll out [lançamento] no ano seguinte.
Conquistamos a liderança do setor em vendas no digital em dois anos, atingindo R$ 750 milhões.
E o investidor não pressiona para que entrem rapidamente em determinado segmento?
Zimerman: Investidores nos provocam e perguntam: ‘Por que vocês não têm hotel, e os concorrentes, sim?’. Mas se o cliente tiver algum problema com o hotel, terá que resolver com o hotel, porque o concorrente vai dizer que só opera a plataforma que faz a intermediação. Não concordamos com esse modelo, porque se o cliente contratar um hotel será porque confia na nossa marca. Temos que nos responsabilizar. Antes de entrarmos em hotel, precisamos aprender como credenciar; e, se houver problema, como vamos resolver.
Penna: Serviços trazem muita lealdade, e também do ponto de vista de produto. Nossos clientes que consomem serviços compram de 2 a 3 vezes mais produtos da Petz. Ou seja, no final do dia, se eu desagrado o cliente, posso acabar prejudicando a venda do que é core.
O investidor pergunta muito dos principais diferenciais competitivos, dado que o mercado pet cresce tanto e todo mundo quer pegar um pedaço maior. Tem marketplace entrando, Cobasi e Petlove fortes… todo mundo acaba ganhando share em cima de players menores, que estão com menos condições de competir, e crescendo acima da média do mercado.
O primeiro diferencial são os serviços: tudo se faz pelo app, como agendamento de banho e tosa, agendamento de consulta, acesso a histórico de vacina… não vale a pena por qualquer outro atributo de um marketplace ou do concorrente sair do ambiente em que você já está inserido.
E outro ponto são as marcas exclusivas, e as aquisições têm tudo a ver com isso. O fato de termos a Zee.Dog, a Super Secão, da Petix, que é a principal marca de tapetes higiênicos, tudo isso faz com que possamos nos diferenciar em termos de produtos e de branding. Foram quatro aquisições, uma em uma categoria – em serviços, indústria, gatos etc. – e a melhor que tinha na categoria.
E qual indicador vai refletir melhor o sucesso dessa estratégia? Receita por cliente?
Zimerman: Perseguimos sempre duas direções: ampliar a quantidade de clientes e ampliar o share of wallet dos clientes. Temos uma quantidade enorme de dados e sabemos que muitos clientes não são exclusivos da Petz. Eles gastam em outras empresas do setor. Buscamos estratégias para fazê-los gastar mais com a Petz.
Qual a importância estratégica do espalhamento das lojas, como você mencionou?
Zimerman: Hoje aproximadamente um terço das nossas vendas são digitais, e as nossas 188 lojas funcionam como hub de distribuição dessas vendas. Quase 90% de tudo o que é vendido na plataforma digital é expedido pelas lojas. Na medida em que espalhamos as lojas, ficamos mais eficientes. Combinamos o melhor nível de serviço com um custo mais baixo de serviço: nos aproximamos da casa do cliente e entregamos em até duas horas com o custo apenas do last mile.
Vou dar o exemplo de Manaus, onde abrimos uma loja há poucos meses. O frete chegava a valer de 30% a 40% do valor da mercadoria e a entrega demorava 30 dias. O frete passou a custar de R$ 6 a R$ 7 para entrega em duas horas e ficou gratuito para entrega no dia seguinte. Não raramente em praças assim, as vendas do digital são multiplicadas em dezenas de vezes.
E isso se torna uma barreira para os marketplaces, como Amazon (AMZN) e Magazine Luiza (MGLU3). O Magazine Luiza pode ter mil lojas no país, mas não tem ração em estoque nessas lojas para distribuir.
Estamos em 20 estados, devemos chegar a 22 até o fim do ano e queremos ter presença nas 27 unidades federativas do país até 2025. E, ao mesmo tempo, vamos também adensando, ou seja, abrimos uma segunda ou terceira loja em regiões onde a demanda comporta unidades além da já existente. São movimentos simultâneos.
Às vezes o mercado olha para um indicador de forma isolada e acha que é ruim. Um exemplo é o same store sales [vendas de mesmas lojas], que pode estar baixo. ‘A operação está esgotando’, dizem. Isso está longe de ser verdade. Como temos essa estratégia agressiva de expansão, às vezes o same store sales de uma praça pode estar negativo. Mas a combinação com as lojas abertas naquela praça revela um ganho de share fantástico. A combinação de negócios faz muito sentido.
Como têm sido as conversas com investidores neste momento em que as ações estão em queda?
Zimerman: Estamos felizes com o fato de termos aberto o capital. Temos mais de 100 mil investidores na companhia, evidentemente a imensa maioria pessoas físicas. Mas temos também grandes fundos nacionais e internacionais entre os acionistas. Há um diálogo muito franco e há a percepção de que a ação está sendo penalizada pelo cenário macro, especialmente pelo cenário de alta de juros, em que empresas de crescimento sofrem mais. Os investidores que estão mais próximos entendem o nosso negócio e estão confiantes sobre o médio e o longo prazo. No curto prazo, não controlamos.
Sabemos que temos que cuidar do NPS dos clientes, do crescimento, da rentabilidade. Não é o rabo que abana o cachorro: ou seja, não é o preço da ação que faz uma empresa ser boa, mas ter uma empresa boa se reflete no preço da ação no médio e longo prazo.
Penna: Nossos investidores internacionais – que representam quase 50% do nosso free float [ações em circulação], com fundos robustos com participações relevantes, como o GIC [fundo soberano de Singapura] -, estão mais tranquilos com nossa estratégia porque têm esse viés de longo prazo. O investidor local está mais assustado. Eu brinco que as perguntas deixaram de ser sobre o trimestre e passaram a ser sobre o mês. Fazia tempo que não via perguntas tão de curto prazo, muitas sobre inflação.
Abrir 50 lojas – depois de 37 abertas no ano passado -, em cima de uma base que no começo do ano estava perto de 170, é crescer quase 30% da minha base em um único ano. São lojas que não maturam tão rapidamente, levam de quatro a seis meses para atingir o breakeven. Explicamos ao investidor que para atingir esse oceano azul, acessar melhores pontos, é preciso um custo de curtíssimo prazo, que é pressionar um pouco a nossa margem.
Falamos ao mercado em teleconferência do primeiro trimestre em 50 pontos base. Estamos crescendo mais de 30% no ano, contando as adquiridas, com uma pressão de margem menor que 100 pontos base, o que é um baita de um resultado, se pensarmos que estamos em um ano inflacionário, com dissídios altíssimos, reajustes de aluguel, de embalagens, de transporte, com metade da nossa base de lojas que não é madura, com menos de três anos, e isso significa que há um horizonte para melhorar a margem. Falamos muito do potencial dos produtos private label [marcas próprias], com margens mais altas.
Fonte: Bloomberg Linea