O grupo calçadista Paquetá, que pediu recuperação judicial na segunda-feira à noite, estuda a venda da rede de lojas próprias Esposende, com 67 unidades no Nordeste, para levantar recursos. Também estão em análise a divisão de outros ativos em unidades produtivas isoladas (UPIs) para posterior leilão e a entrada de investidores na companhia, que é dona de marcas como Ortopé, Capodarte e Dumont.
“Neste momento, o Grupo Paquetá conversa com dois fundos de investimentos brasileiros que estão interessados no negócio”, disse Márcio Carpena, da Carpena Advogados, que assessora a calçadista gaúcha ao lado da consultoria Galeazzi & Associados e do escritório de advocacia João Pedro Scalzilli.
O pedido de recuperação judicial foi apresentado no início da semana na 2 Vara Cível da comarca de Sapiranga, no Rio Grande do Sul, onde está sediada a fabricante de calçados. Controlada pelas famílias Leist, Strassburger e Bacher, a companhia fatura R$ 1,3 bilhão por ano, emprega 10,2 mil pessoas e acumula dívida total de R$ 638,5 milhões. No pedido de recuperação judicial estão débitos de R$ 393 milhões.
“A Paquetá estava com dificuldades de obter linha de crédito para suas operações. A geração de caixa da companhia não era suficiente para honrar os pagamentos no prazo necessário. Serão necessários alguns anos para conseguir pagar os débitos”, afirmou Carpena. Ele preferiu não adiantar qual prazo seria ideal.
Além das marcas próprias, o grupo fabrica calçados para Asics, Adidas e Nike, e acessórios femininos da grife americana Tory Burch. Cerca de 30% da produção do grupo é exportada para 14 países. No varejo, opera com 148 lojas próprias das bandeiras Esposende e Paquetá Esportes e 86 franquias das marcas Capodarte e Dumont.
A maior parte da dívida elegível à recuperação judicial está com fornecedores de matéria-prima. Esses débitos somam R$ 303 milhões, segundo Carpena. Os demais credores são bancos, com R$ 75 milhões, e há R$ 15 milhões provisionados para processos trabalhistas. Outros R$ 245 milhões da dívida referem-se a contratos de câmbio e alienação fiduciária, por isso não integram o processo.
No pedido enviado à Justiça, o grupo informa que enfrentava constantes ordens de bloqueio de valores nas contas das recuperandas Paquetá Empreendimentos Imobiliários Ltda, Paquetá Calçados Ltda e Companhia Castor de Participações Societárias. Segundo a empresa, esse cenário inviabilizava a administração do caixa, prejudicando “o esforço para reestruturação da dívida”.
Em entrevista ao Valor em novembro de 2018, o presidente do Grupo Paquetá, Henning von Koss, afirmou que a operação, que vinha em reestruturação, havia atingido um “ponto de inflexão” e previa que seria possível voltar a crescer de maneira mais sustentável a partir de 2019. Na ocasião, afirmou que as contas estavam em dia, assim como o pagamento de tributos e obrigações trabalhistas.
A companhia passou por uma reorganização operacional e financeira nos últimos três anos, para enfrentar a redução dos níveis de produção e vendas e um pesado endividamento. O processo gerou corte de 30% da força de trabalho e o fechamento de uma fábrica na República Dominicana, inaugurada em 2010 para produzir calçados para outras empresas nos Estados Unidos. As linhas foram absorvidas por unidades no Rio Grande do Sul, Bahia e Ceará. Atualmente, são 11 fábricas no país, distribuídas nesses três Estados.
O setor de calçados tem operado com capacidade ociosa no Brasil, diante da lentidão da economia. O nível de ociosidade subiu para 25% este ano, ante 24% no fim do ano passado, segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados).
“Até agora, os resultados frustraram. O que está ajudando neste primeiro semestre é a exportação, que melhorou refletindo [a guerra comercial entre os] Estados Unidos e a China. A economia está andando de lado”, disse Haroldo Ferreira, diretor da Abicalçados.
Questionado sobre o efeito do pedido de recuperação judicial do Grupo Paquetá no setor, o diretor-executivo da Abicalçados preferiu não comentar. “Não tenho expectativa de que mais empresas enfrentem problemas. Precisamos é que a economia comece a se movimentar.”
Fonte: Valor Econômico