Ainda não há clareza sobre a forma como a demanda deve se comportar no curto prazo e o cenário instável impede um início de processo de recuperação do consumo no país, na visão de Ronaldo Iabrudi, presidente do Grupo Pão de Açúcar (GPA), a segunda maior varejista alimentar do Brasil. “Há alguns sinais positivos, como a perspectiva de queda da Selic, a reforma trabalhista, as reformas do setor elétrico e de mineração, o que nos leva a ver uma tendência mais positiva. Mas, de maneira geral, o cenário ainda está muito difícil”, afirmou Iabrudi ao Valor.
“Temos trabalhado no sentido de gerar resultados menos dependentes do cenário externo e nossos avanços são fruto das ações internas que temos conduzido”, acrescentou.
Apesar de apresentar resultados considerados “sólidos” e “expressivos” por analistas de mercado no segundo trimestre, a varejista destacou em seu relatório de desempenho que sentiu os efeitos negativo da queda da inflação na divisão multivarejo, que inclui as bandeiras Extra e Pão de Açúcar e responde por 60% do negócio alimentar.
Nessas redes, a receita não cresceu de abril a junho, e ficou em R$ 6,4 bilhões. Segundo a empresa, algumas categorias de alimentos, como legumes e hortaliças, chegaram a apresentar deflação em junho, o que impactou o desempenho das lojas Pão de Açúcar e Extra Super, que têm a maior participação dessas categorias.
Já na rede de atacarejo Assaí, o grupo conseguiu compensar a queda de preço com maior volume vendido – a receita da cadeia subiu 28%, para R$ 4,3 bilhões -, mas alerta para risco de manutenção dessa pressão no próximo trimestre. “Ainda deveremos ver a questão inflacionária no terceiro trimestre, algo que deve ser amenizado no quarto trimestre e os fatores são excesso de safra, pouca demanda e dólar baixo, o que faz com que vários produtos tenham queda de preços acima do esperado”, disse Belmiro Gomes, presidente do Assaí, a analistas.
Quando os reajustes de preços diminuem, o varejo tenta compensar essa queda por meio de ações que turbinem o volume vendido. Há naturalmente um descompasso inicial nesse processo, especialmente se há queda muito brusca da inflação ou se há deflação, como ocorreu em junho. Esse movimento já afetou a operação das principais varejistas do país, segundo executivos ouvidos ontem – Carrefour e Walmart também tem verificado efeito negativo da queda acelerada da inflação.
Em relatório ontem, a equipe de análise do Credit Suisse diz que “inicialmente [o GPA] pode ter um impacto negativo nas margens, já que as despesas [operacionais] tendem a aumentar, com base na inflação passada”. O GPA descartou ontem efeito negativo da menor inflação em margem bruta.
Ontem, as ações do GPA fecharam o pregão em alta de 2,13%, em R$ 71,49. A ação do Carrefour teve queda de 1,95%, para R$ 15,10.
Analistas destacaram ontem que, apesar do certo descompasso entre inflação e volume em alguns negócios, o GPA conseguiu registrar números positivos. O grupo apurou lucro líquido de R$ 165 milhões (atribuído aos controladores), R$ 14 milhões acima da estimativa do Morgan Stanley (em 2016, a perda foi de R$ 277 milhões). O valor do lucro antes de juros, impostos, amortização de depreciação do braço alimentar, em R$ 551 milhões no intervalo, superou em 12% a estimativa do UBS.
A margem bruta aumentou de 24,5% para 26,9%, sendo que 1,2 ponto percentual dessa alta foram oriundos do reconhecimento de créditos tributários no montante de R$ 447 milhões no com Pão de Açúcar e Extra. Desconsiderando este efeito, a margem teria subido 1,2 ponto, para 22,7%, ressalta o relatório do BB Investimentos.
O destaque central do trimestre voltou a ser a operação do Assaí, que encerrou junho respondendo por 40% do braço alimentar do grupo (era 34% há um ano). Em relatório, o Credit Suisse ressaltou melhoras no desempenho do Extra e Pão de Açúcar (apesar deste último ter tido vendas em queda no trimestre), destacando um nova estratégia de preços e a redução das despesas nos negócios.
O banco destaca, porém que Extra e Pão de Açúcar ainda ficaram abaixo das expectativas iniciais (e mais otimistas) dos analistas, principalmente na margem bruta. “Os resultados também continuam atormentados por uma infinidade de itens não recorrentes, que, embora explicados, continuam exigindo vários ajustes”, destacaram os analistas Tobias Stingelin, Leandro Bastos e Antonio Gonzalez.
Fonte: Valor Econômico