Dono da única varejista do ramo farmacêutico presente em todos os Estados do País, o cearense Francisco Deusmar de Queirós diz confiar na recuperação do Brasil. Para transmitir sua mensagem de otimismo, publicou no fim do ano passado sua biografia, “O Tecedor de Ousadias”. Em entrevista à repórter Luiza Freitas, do Jornal do Commercio, o empresário fala sobre a sustentabilidade do setor e as perspectivas para o País.
JORNAL DO COMMERCIO – Como foi o processo de preparação do livro?
DEUSMAR DE QUEIRÓS – Demorou um pouco mais de três anos para ser escrito porque houve um trabalho grande de pesquisa. A origem do nome Queirós (com S), a fundação da cidade onde nasci, no interior do Ceará (Amontada), um pouco da minha infância e adolescência, entrevistas com alguns amigos. Também não tive tanto tempo para atender o escritor, o Juarez Leitão, que já escreveu dezenas de livros, mas fiquei muito satisfeito com o trabalho dele. O livro está bem, vendeu aproximadamente quatro mil unidades.
JC – O senhor começou a trabalhar aos oito anos, na mercearia do seu pai, e hoje é presidente de uma gigante do varejo farmacêutico. Durante esse percurso, estudou economia e trabalhou em outras áreas. O que levou o senhor a apostar no setor?
DEUSMAR – Entrei no mercado financeiro enquanto estava na faculdade de economia e, com o tempo, comecei a dar aula na universidade. Depois fui convidado a montar a Bolsa de Valores Regional (em 1976). Essa foi a minha grande sacada, já que mesmo ganhando metade do que eu ganhava, sacrifiquei o salário para aprender o que era realmente a bolsa de valores. Isso me abriu um horizonte muito grande. Montei uma corretora de valores, passei a operar. Foi o grande salto da minha vida em termos financeiros, de realização. E em 1981 é que nasce o dono da Pague Menos, do varejo. Porque eu nasci dentro do varejo. A minha infância foi dentro do varejo.
JC – Mas por que o ramo farmacêutico?
DEUSMAR – Um dos meus cunhados conheceu uma farmácia que estava à venda e me sugeriu: “Não acha que é um movimento interessante para você, que quer ir para o varejo?”. Eu tinha interesse de ir para qualquer setor do varejo. Poderia ser calçados, tecidos, eletrodomésticos, alimentação, e aí apareceu a oportunidade com os medicamentos. Fiz uma análise e entendi que era um segmento importante. Saúde, higiene e beleza não têm muita crise. Quem é diabético ou hipertenso tem que se medicar. E o medicamento você não substitui.
JC – Em 2012 a Pague Menos abriu capital. O que o senhor pretendia com essa movimentação?
DEUSMAR – Abrimos só com debêntures. Ainda não fomos para a Bolsa, ainda não fizemos a oferta inicial de ações (IPO). Isso planejamos lá pra 2019, 2020, quando o Brasil estiver melhor, o pessoal estiver acreditando mais no País. Mas não muda muito não. Continuamos abrindo lojas: em 2016 foram 140, em 2017 abrimos 170 e este ano planejamentos abrir 200. Vamos continuar crescendo e acreditando no Brasil.
JC – Fora do Brasil, o segmento farmacêutico está sendo afetado por modelos disruptivos de negócios. Nos Estados Unidos, uma rede que nasceu na internet cresceu tanto que chegou a comprar uma tradicional rede física de farmácias. Como o senhor está se preparando para isso?
DEUSMAR – Nós todos estamos acompanhando, investindo bastante nessa área. Acreditamos que o e-commerce vai ter uma importância cada vez maior – e já está crescendo –, mas a loja física não vai desaparecer. O que deverá acontecer é o cliente fazer o pedido pela internet e retirar na loja física. Sempre haverá alguém atendendo. Gente atendendo gente. Fechamos o ano passado com mil lojas e agora vamos para duas mil lojas até 2022. Nos EUA, existem redes com oito mil lojas, nove mil lojas. Então no Brasil pode haver rede com três mil, quatro mil. Sabemos que o e-commerce vai crescer, mas existem movimentos interessantes. A Amazon, que é pioneira do e-commerce, comprou um supermercado. Então ela também está acreditando que a loja física vai continuar existindo.
JC – Mas esta semana houve a notícia do fechamentos das lojas da rede Big Ben em Pernambuco, Bahia e Pará. Como o mercado reagiu a isso?
DEUSMAR – Já era uma morte anunciada. Todo o mercado já sabia que ia acontecer. Foram compradas várias lojas, de várias redes, não souberam administrar tudo como varejistas e acabaram passando por dificuldades. Não foram administrados profissionalmente. Isso ia acontecer mais cedo ou mais tarde. As lojas já estavam desabastecidas. Existem lojas de sucesso e lojas que não têm sucesso. Depende muito da liderança, da forma como você administra. Nós já esperávamos isso.
JC – O envolvimento do BTG Pactual, que tinha o controle da Brasil Pharma, grupo ao qual a Big Ben pertence, foi determinante nesse processo?
DEUSMAR – Não acho que isso tenha influenciado. Antes da Lava Jato, eles já estavam mal. André Esteves já tinha saído da Brasil Pharma. Então não acho que tenha sido por isso. Foi só uma questão administrativa mesmo. Foi uma estratégia de negócio que não deu certo.
JC – O mercado hoje está bem estruturado?
DEUSMAR – As principais redes estão bem estruturadas. São redes com muitos anos e que estão de olho no futuro. Realmente acredito que os concorrentes também estão bem estruturados. Um dos motivos pelos quais quis escrever o livro foi para transmitir uma mensagem de otimismo, porque eu realmente acredito no Brasil. Mas, é claro, se não tomar cuidado com o negócio, a vaca vai para o brejo.
JC – Existe uma piada que circula nas redes sociais que diz fazer medo sair de casa e, quando voltar, descobrir que construíram uma farmácia no lugar. É uma brincadeira com o crescimento do setor.
DEUSMAR – É verdade. Somos um setor que não caiu na crise. Sustentamos o crescimento. Se você for na esquina, vê os paulistas chegando e nós aumentando. E realmente ainda estamos de olho nas boas esquinas.
JC – Como é ser um nordestino e liderar uma rede nordestina dentro desse mercado de redes do Sudeste?
DEUSMAR – Em 2002 entramos em São Paulo. E só agora eles estão vindo para cá, estão atrasados. Os paulistas nunca acreditaram no Nordeste. Agora é que estão vendo que o Nordeste tem espaço. Nós estamos no Sul, Sudeste. A concorrência não é só de lá pra cá. É daqui pra lá também. Eles estão sentindo que nós sabemos administrar.
JC – Olhando para a economia do País como um todo, quais as suas expectativas para 2018 como economista e empresário?
DEUSMAR – As pessoas e as empresas devem estar mais animadas. Com a queda dos juros, as empresas que aplicam e vivem de renda vão procurar investir no setor produtivo, fazendo mais dinheiro circular. Com a inflação controlada, as pessoas vão passar a consumir mais. Eu acredito na retomada da economia. O grande problema do Brasil hoje são as questões políticas, econômicas e morais, que se refletem na segurança, educação e saúde. Por isso, em outubro, devemos ser inteligentes o suficiente para eleger um time que pense na melhor forma de combate à desigualdade social. É importante que voltemos a ter mais empregos. Sem consumo, sem renda, o País não cresce. Podemos ter um saldo bom na Balança Comercial por conta da exportação, mas só isso não se sustenta. O governo precisa controlar mais seus gastos, investir mais em infraestrutura. Montar um esquema em que o brasileiro confie e consuma.
JC – E o senhor acha isso possível?
DEUSMAR – É possível e precisa ser feito ou vamos perder mais oito, dez anos de progresso. As coisas estão retomando o rumo, mas ainda muito devagar porque se não houver emprego a pessoa que não tinha dinheiro para comprar no ano passado também não vai ter este ano.
Fonte: Jornal do Commercio