Carrefour, Assaí e GPA estão reformando 90 pontos nos próximos cinco meses
Por Adriana Mattos
Nunca o varejo trocou tanta loja de uma marca para outra como agora. Consumidores devem começar a perceber que as fachadas de supermercados e hipermercados, além de toda a estrutura interna, mudarão em poucos dias ou semanas, numa das mais rápidas e silenciosas transformações de lojas já vistas no país. Num cenário em que o aumento nos custos de construção chega a dobrar o valor da obra de uma loja nova – e há necessidade de melhorar mais rapidamente retornos sobre os investimentos – converter lojas antigas ficou mais seguro e barato.
Nos últimos dias, o Valor levantou o tamanho das operações em andamento e detalhes do nível de complexidade de uma migração desse porte. Atrás de tapumes e avisos de reabertura aos clientes, milhares de pessoas vêm sendo mobilizadas nas reformas, lideradas por Assaí, Carrefour e GPA. Só o Assaí tem uma equipe de 12 mil pessoas envolvidas no projeto. Estima-se que, nas áreas em obras nas unidades, há entre 200 e 400 pessoas trabalhando, com gastos de R$ 8 milhões a R$ 45 milhões por conversão. Isso representa até metade do custo para abrir uma loja nova (sem incluir terreno).
Nos próximos cinco meses, quase 90 lojas de Assaí, Carrefour e GPA serão convertidas, totalizando investimentos de R$ 4,2 bilhões a R$ 5,35 bilhões, ao considerar piso e teto projetado em 2022 e 2023. O valor máximo estimado corresponde a quase duas vezes o total investido no ano passado no país pelo grupo Carrefour, a maior varejista da América Latina.
Desde o fim de julho até dezembro, serão, pelo menos, 40 conversões de Extra para Assaí, 12 pontos do Extra para as redes do GPA e 37 do Grupo Big (ex-Walmart) para bandeiras do Carrefour (a cadeia comprou o Big em março de 2021). Neste último caso, o cálculo se baseia em projeção do Carrefour de que, para este ano, serão abertas 30% das 124 unidades totais do Big a serem reformadas.
Ainda haverá um novo lote de migrações para 2023. Ao se considerar as reformas em 2022 e no ano que vem, serão 218 pontos sendo trocados pelas três varejistas – o GPA deve finalizar as trocas em 2022. Para este ano, devem ocorrer mais conversões em menor espaço de tempo do que em 2023. Sobram para o ano que vem 117 conversões até dezembro. Já em 2022, as 89 trocas equivalem a uma abertura a cada dois dias após julho. “É um reloginho que vão ter que seguir”, resumiu na semana passada a analista do banco Goldman Sachs, Irma Sgarz.
“O mercado está olhando atentamente as conversões nas três empresas, apesar de serem desafios diferentes. A questão é o quanto isso gera de aumento de volume, de escala e se efetivamente vai melhorar eficiência e produtividade”, diz João Soares, analista do Citi.
Esse movimento está acontecendo agora por questões de oportunidade e custo. As conversões se aceleram – e as aberturas de novas lojas perderão espaço até parte de 2023 – porque apareceu a chance de o Carrefour comprar o Big e o GPA quis vender o Extra, numa proposta colocada na mesa pelo Assaí. O GPA manteve o restante das lojas que não vendeu ao Assaí – e todos lançaram seus projetos mais ou menos ao mesmo tempo. “Mas não foi exatamente coincidência”, diz um executivo com 23 anos no atacado. “O Carrefour comprou Makro e Big desde 2020, e o Assaí se mexeu e viu espaço para o acordo com o Extra. Isso acabou levando a esse ‘boom’ de conversões nunca visto antes”.
Executivos e analistas são unânimes em dizer que, apesar da complexidade do plano pelo alto volume de obras simultâneas, e por obrigar as empresas a dividir o foco das equipes nos projetos, é menos arriscado do que levantar uma loja do zero. Nos locais já há estrutura prévia, como energia, drenagem de água e área de acesso das carretas, por exemplo. Por isso, chegam a custar até 50% o valor de uma loja nova. E as conversões ainda atingem todo o potencial do ponto em prazos mais curtos.
Apesar dos acertados alertas de analistas sobre o desembolso de caixa ao considerar obra e compra do terreno (o valor da aquisição negociado com o ex-dono), a loja alcança rentabilidade maior, mais rápido. No Assaí, o CEO Belmiro Gomes diz que pontos do Extra já convertidos, até 2020, tiveram vendas três vezes superiores ao apurado em loja tradicional, e a margem de lucro antes de juros, impostos e amortização cresceu 1,5 ponto.
“São localizações excepcionais. Das 70 lojas que compramos, 63 estão em capitais e regiões metropolitanas de alto fluxo. A conta tem que ser feita considerando que não há nada assim à venda hoje”, diz Gomes. Há 48 obras em andamento no Assaí hoje e duas unidades do lote de 70 foram abertas.
Dias atrás, Gomes esteve na reforma da loja da Asa Norte, em Brasília (DF). “Num dos pisos de obra, eram 340 pessoas, entre arquitetos, engenheiros, projetistas e pessoal da construção. É um mar de gente. Dependendo do ritmo, podemos fazer até mais de 40 neste ano, mas temos mantido o número porque dependemos de licenças e autorizações que não estão sob nosso controle” diz ele, da sede do Assaí, tendo ao fundo um mapa com marcadores das dezenas de lojas. Nas 70 obras podem ser gastos de R$ 2,1 bilhões a R$ 3,1 bilhões (até R$ 45 milhões por ponto), calculou o Valor, com base em estimativas da cadeia.
Como são pontos abertos em lojas já existentes, além do apelo de atrair maior volume de pessoas logo após a abertura, eles já têm consumidores fiéis no local. No Carrefour, que começou em junho a rodar o seu plano de integração com o Big, serão investidos R$ 1,9 bilhão nas 124 reformas, média de R$ 15 milhões por ponto.
O Carrefour tem obras em 16 lojas do Big, a serem transformadas em Atacadão (13) e Carrefour (3) numa primeira onda. Outras “ondas” virão em seguida. “Entre agosto e outubro as unidades que viram Atacadão vão fechando e reabrem entre novembro e dezembro”, disse na quarta-feira David Murciano, vice-presidente de finanças. As lojas que migram para Carrefour ficam cinco dias fechadas em setembro e reabrem no mesmo mês.
No fim das contas, pelo cronograma publicado até 2023, 70% das lojas alvo da migração no Carrefour ficam três dias fechadas. E 30% fecham por dois meses – um jeito de não afugentar o cliente com a reforma e perder venda.
Dos 80 hipermercados do Big, 47 viram hipermercados Carrefour até 2023. E outros 28 migram para Atacadão (além de mais 38 Maxxi Atacado, também do Grupo Big). Ou seja, há mais ponto do Big virado atacarejo. É nessa troca de hiper para atacarejo que está a maior dor de cabeça desse processo. “Os casos de ‘hiper para hiper’ são mais tranquilo de converter”, diz Manoel Araujo, diretor da consultoria Martinez de Araujo.
“O desafio maior é no atacarejo. Toda reforma para esse formato é mais complexa pelas questões estruturais. E se forem sofisticar essas novas lojas será um erro pelo risco de elevar despesas e acabar ficando com o mesmo custo de um hipermercado”, diz. As redes dizem que a intenção é melhorar serviços sem encarecer a estrutura, e diluir despesas com a alta nas vendas. “Nós só vamos saber se isso vai acontecer mesmo quando divulgarem os balanços após as conversões”, diz Soares, analista do Citi.
Nas conversões do GPA, a mudança em andamento envolve a transformação de 24 lojas do Extra em supermercados do Pão de Açúcar, Mercado Extra e Compre Bem. Como se tratam de “hiper” pequenos, de até 3,5 mil metros quadrados, conseguem criar um “super” grande, com estrutura maior de serviços e número maior de itens. As unidades estão sendo convertidas num modelo mais moderno, chamado de sétima geração.
As lojas convertidas em Pão de Açúcar nas últimas semanas tiveram os setores de bebidas alcoólicas, “pet” e utensílios ampliados. A cafeteria (Espaço Café) passou a incorporar pratos rápidos no cardápio. Foram 12 reformas de abril a julho e serão mais 12 no terceiro trimestre. O Valor apurou que no Pão de Açúcar, o gasto médio por reforma será de R$ 10 milhões a R$ 15 milhões, e nos outros modelos, de R$ 8 milhões a R$ 10 milhões.
Fonte: Valor Econômico