A dona dos restaurantes inspirados na Austrália amplia sua atuação para o segmento de jantares finos com o elitizado Fleming’s, em mais um capítulo da história do libanês Salim Maroun, criador da primeira rede de fast food do Oriente Médio
Há duas coisas que caracterizam os restaurantes da rede Outback no Brasil: a famosa cebola frita em formato de alcachofra e a longa fila espera, sempre acima dos 40 minutos. Especializada em comida americana, mas com uma temática que remete à vida aventureira nos desertos do interior da Austrália, a rede, pertencente ao grupo americano Bloomin’ Brands, é um sucesso no País. A vinda da companhia para cá, em 1994, se deu pelas mãos de dois empresários com vasta experiência no setor de fast food: o americano Peter Rodenbeck, responsável, também, por inaugurar a operação brasileira do Mcdonald’s, em 1979, e seu sócio Salim Maroun.
A parceria durou 25 anos, quando, em 2013, Rodenbeck decidiu se aposentar, vendendo boa parte de sua parcela no negócio, seguindo como sócio minoritário. O libanês Maroun, por sua vez, tinha outros planos. Ele inaugurou, em abril, o primeiro restaurante da rede Fleming’s em São Paulo, localizado no prédio onde funcionava a concessionária Dacon, da Volkswagen, na esquina das avenidas Faria Lima e Cidade Jardim, endereço muito conhecido dos paulistanos e próximo a um dos principais centros financeiros da cidade.
Especializado em jantares finos, o Fleming’s representa um passo ousado na estratégia da Bloomin’ Brands de fazer do Brasil seu principal mercado internacional – a companhia atua em 22 países. Para ter sucesso, Maroun terá de ganhar espaço no competitivo segmento da alta gastronomia em um momento difícil para o setor de alimentação fora de casa, que sofre com a retração da economia. Cenários adversos, no entanto, são uma espécie de especialidade de Maroun. Sua estreia no mercado de alimentação se deu ainda na capital libanesa, Beirute, nos anos 1980.
Na época, o país vivia uma sangrenta guerra civil, que durou de 1975 a 1990, deixando um saldo de mais de 150 mil mortos e um quarto da população desabrigada. Nessas condições, ele fundou e comandou a Winners, rede de oito lanchonetes que servia hambúrgueres e batatas fritas. “Nós tínhamos de fazer um comboio para voltar para casa, depois do trabalho, por causa dos bombardeios”, conta Maroun. “Com o tempo, você aprende que a bomba chega a você antes do som da explosão. O melhor não é se locomover quando há silêncio, mas sim logo depois do barulho.”
Em 1988, ameaçado e temendo por sua segurança, ele decidiu vender a empresa e deixar o país. No Brasil, com a ajuda de Rodenbeck, se tornou franqueado do McDonald’s. Sua primeira loja foi aberta na Cidade de Deus, bairro de classe baixa no Rio de Janeiro, reduto do tráfico de drogas e palco de tiroteios constantes. “Acho que era um lugar que ninguém queria. Mas, perto do Líbano, não era nada”, afirma. Após o fim dos conflitos, Maroun foi convidado a levar o McDonald’s para o Oriente Médio, mas recusou.
“Recebi um relatório do board da empresa dizendo que eles estavam dez anos atrasados, pois já existia, no Líbano, uma cadeia de lanchonetes: a minha.” Em paz, Maroun tem pela frente não mais bombas e tiroteios, mas uma economia em recessão, que está desencorajando as idas aos restaurantes. O tráfego nas lojas vem caindo desde o segundo trimestre do ano passado, passando de 3,84 bilhões de visitas para 3,65 bilhões, neste ano. Os dados são do Instituto Foodservice Brasil (IFB), que representa as empresas do setor.
A receita cresce, porém, impulsionada pelo aumento de 7% no tíquete médio, o que, por outro lado, afasta ainda mais os clientes. “Há oportunidades, mas estão mais concentradas nas redes de menor custo”, afirma Alexandre Guerra, presidente do IFB. Maroun enfrenta também o desafio de tocar os negócios sem ter ao seu lado o amigo Peter Rodenbeck. Até 2013, a Bloomin’ Brands do Brasil era controlada, majoritariamente, pelos dois sócios. Com a saída de Rodenbeck, a matriz americana assumiu o controle, deixando as operações a cargo de Maroun.
A companhia, que fatura US$ 4,4 bilhões globalmente, passou a expandir as operações, trazendo novas marcas para o País. Nos últimos dois anos, foram inauguradas cinco lojas da rede Abraccio, de comida italiana, em São Paulo, Campinas e Brasília – nos EUA, ela é chamada de Carrabba’s. Atualmente, o grupo possui 75 restaurantes no País que faturam estimados US$ 280 milhões. Com o Fleming’s, cujo tíquete médio gira em torno de R$ 120, a empresa passa a competir com ícones da gastronomia como a rede Rubaiyat. “Depois de tudo que passei, cheguei à conclusão de que é possível fazer qualquer coisa”, diz Maroun. Não é uma crise passageira que vai tirar seu sono.