Saber quem são os sucessores, o que pensam e seus projetos pode ajudar a garantir a perenidade das empresas fundadas por seus pais, tios e avós. É o que mostram dois estudos. Um deles foi feito por SM com 320 supermercados e traça um retrato da nova geração.Entre as constatações, 85% são filhos dos fundadores da rede e 44% têm até 24 anos.
Já outro levantamento, realizado pela PwC com 250 herdeiros de 31 países (incluindo o Brasil), aponta anseios, planos e desafios de quem vai suceder os familiares na companhia. O levantamento indica que os futuros líderes querem alçar a empresa a um novo patamar. E isso não é diferente no varejo alimentar, como você pode conferir nas próximas páginas. Nelas, você encontra os principais resultados da pesquisa da PwC e exemplos de sucessores que já estão implementando melhorias nos supermercados
Retrato dos herdeiros
Levantamento de SM com 320 supermercados identificou que, hoje, existem mais de 300 sucessores em processo de treinamento nas empresas do setor. Confira o perfil deles
Gabriel Barcelos
- 29 anos
- Gerente executivo de atacado
- Filho do fundador
- Começou na empresa aos 17 anos
- Graduado em Publicidade e Propaganda
Super Bom (RJ)
11 lojas Faturamento de R$ 743 milhões
“Já tinha quase 10 anos de empresa quando fui buscar experiências no mercado, logo após implementarmos o programa de sucessão. O clima era de ansiedade e eu queria conquistar meu espaço. Trabalhei como gerente regional de vendas em uma indústria.”
Cheguei com espírito de dono. Queria dar resultado rápido. Mas as coisas não funcionavam como na empresa da minha família. Precisei entender a política da companhia, me adaptar a uma nova cultura e ter jogo de cintura. Compreendi a importância de ter aliados. Em quase dois anos, as vendas passaram de R$ 8 mi para 12 mi. Recebi propostas de trabalho, mas em 2016 voltei para o supermercado da família.
Agora, com planos de fazer o negócio crescer mais”
“Trabalhar em outra empresa pode dar aos membros da futura geração uma experiência valiosa. Isso proporciona desenvolver uma visão mais objetiva dos desafios que a própria companhia enfrenta, o que é difícil para os que estão há muito tempo dentro da empresa da família. “Paul Henness y Líder de serviços para empresas familiares, na PwC Irlanda
73% trabalharam fora da empresa da família
Sandro Barbosa
- 44 anos
- Gerente financeiro
- Filho do sócio-fundador
- Começou na empresa aos 14 anos
- Graduado em Administração, Marketing (pós-graduação) e Negócios (MBA)
Supermercado Guarani (SP)
4 lojas Faturamento de R$ 160 milhões
“Aos 14 anos já ficava no pé do meu pai para ele me levar ao único supermercado que tínhamos na época. Como ele nem sempre concordava, decidi, um dia, dormir na sala para obrigá-lo a me acordar e me levar junto. Foi assim que passei a frequentar a loja três vezes na semana, após as aulas.
Dessa forma, aprendi a ser comerciante desde cedo. Quando o jovem demonstra interesse pelo negócio da família, precisa ser incentivado, inclusive no que se refere à área em que deseja atuar
O sentimento de dono e a paixão pela empresa são os primeiros passos na formação do sucessor”
58% dos herdeiros sempre desejaram trabalhar na empresa da família
“A sucessão é um processo, não um evento. Logo, precisa ser planejada com antecedência. Isso dará ao sucessor,à sua família e ao restante da empresa tempo para se adaptar e preparar a transição. Esse é um períodoimportante para ter certeza de que o herdeiro dispõe das competências necessárias e solucionar todos os gaps com um programa de desenvolvimento adequado. Em condições adequadas, trabalhar na própria empresa familiar pode ser uma incrível oportunidade. O sucessor poderá fazer parte de algo com que realmente se preocupa, tornar-se um guardião da organização e, talvez, um dia transmiti-la para seus próprios filhos.”Juliette Johnson Consultora londrina especializada em empresas familiares e parceira da PwC
Bruno Lohn
- 26 anos
- Comprador
- Neto do fundador
- Começou na empresa aos 18 anos
- Especialização em Gestão de Supermercados no IGA Coca-Cola Institute em Atlanta
Grupo Mundial Mix (SC)*
8 lojas Faturamento de R$ 553 milhões
“Os herdeiros entram como trainee e atuam em praticamente todos os setores, conforme nosso programa de sucessão. Antes desse processo, acreditava que tudo era simples de fazer e resolver. Hoje, vejo que é preciso ter muita dedicação. Já a fase final do programa de preparação prevê a escolha de uma área e o desenvolvimento de um projeto. Optei pelo comercial e fiz um trabalho envolvendo a produção de carne embalada a vácuo, que ainda estamos aperfeiçoando.”A ideia é colocar em prática nas lojas de cash & carry, formato em que entramos recentemente. É importante ainda para os sucessores contar com o apoio de pessoas mais experientes da família e aliar diferentes visões”
78% começam em funções mais básicas (trainee,gerência média, etc.)
“As gerações mais novas desejam atuar em áreas que correspondam às suas habilidades e nas quais conseguirão se destacar. Preferem não assumir um posto, ainda que do alto escalão, apenas para fazer número ou em que outras pessoas se sairiam melhor. Os sucessores entendem o que significará gerenciar a empresa nos próximos anos e se perguntam como podem ajudar a companhia a crescer. ”Jonathan Flack Líder de Empresas Familiares, na PwC Estados Unidos
* Dona das bandeiras Imperatriz e Brasil Atacadista
Murilo Savegnago
- 30 anos
- Gerente de marketing
- Filho do sócio-fundador
- Começou na empresa aos 18 anos
- Graduado em Administração, Marketing (MBA), Finanças (intensivo)
Savegnago Supermercados (SP)
37 lojas Faturamento de R$ 2,5 bilhões
“O plano de carreira fica mais claro para o herdeiro se a empresa tiver governança corporativa e planejamento sucessório. Desde que entrei na rede, atuei na operação e no administrativo. Passei a coordenador de marketing e hoje sou gerente da área. Ainda pretendo conhecer mais profundamente outros setores. E acredito que o sucessor também precisa investir em aprendizado. Deve saber focar uma área para buscar cursos de especialização. Além disso, para assumir cargos estratégicos, existem pré-requisitos. Eu, por exemplo, sinto que conheço apenas 30% do negócio. Embora não tenha ambição de chegar à diretoria, quero melhorar o meu trabalho”
25% apenas percebem que a empresa tem um plano de carreira claro
As novas gerações de sucessores exigem um plano de carreira muito mais estruturado. A demanda por clareza é uma questão bastante concreta. “Os que já estão na empresa entraram num esquema de ‘vire-se’. Hoje, esses líderes querem um programa que apoie seus filhos durante esse processo”.Paul Henness y Líder de serviços para empresas familiares, na PwC Irlanda
Gabrielle Valladares
- 29 anos
- Diretora financeira
- Filha do fundador
- Começou na empresa aos 18 anos
- Graduada em Administração, Logística e Finanças (pós-graduação), e especialização em Marketing
Real Supermercados (RJ)
6 lojas Faturamento de R$ 200 milhões
“Meu pai é o principal mentor que tenho. E embora ele me dê oportunidade de propor mudanças, sempre tive a preocupação de apresentar minhas ideias estruturadas em forma de um projeto, como se realmente quisesse vender um plano a um investidor.Faço estudo de viabilidade, retorno, investimento e concorrência. Também levanto prós e contras e faço uma análise de risco. Ao deixar claro que ele não vai perder tempo me ouvindo, faço um trabalho profissional. Assim, fica difícil ocorrer frustrações, seja da minha ou da parte dele”
33% sentem-se frustrados tentando convencer a família a aceitar suas propostas
“As gerações têm diferentes perfis, por exemplo, quanto aos riscos envolvidos, dependendo da fase da vida e da construção da carreira, o que causa tensão. Quando o herdeiro quer mudar o que seus pais construíram ao longo da vida, entram em jogo questões pessoais. É preciso respaldar as mudanças com argumentos sólidos de negócios.”Juliette Johnson Consultora londrina especializada em empresas familiares e parceira da PwC
Gladdys Albuquerque
- 25 anos
- Diretora de compras
- Filha do fundador
- Começou na empresa aos 14 anos Graduada em Administração, Gestão Financeira (MBA)
Center Box (CE)
10 lojas Faturamento de R$ 454 milhões
“Ninguém é insubstituível. Com bom treinamento, mentoria e comprometimento, é possível preparar profissionais para assumir novos postos a qualquer momento. Essa é uma das marcas que pretendo deixar na companhia e que estou implementando. Nos próximos anos, quero acompanhar mais de perto o trabalho do meu pai e participar de mais reuniões para entender melhor o negócio. Também me esforço para mostrar à equipe a importância de respeitar e ouvir o outro. Isso tem gerado, por exemplo, um ambiente de negociação mais saudável e produtivo entre compradores e fornecedores. O objetivo com tudo isso é fazer o negócio crescer de forma sustentável “
92% querem deixar sua marca e fazer algo especial para a empresa
“As empresas familiares precisam contar com administradores em vez de zeladores. Os primeiros constroem valor, que são transmitidos à geração seguinte. Já os zeladores mantêm o que foi criado, sem mudanças. São profissionais que não conseguem inovar, o que mata o negócio. Manter o status quo com a preservação das mesmas práticas de gestão não é saudável. É preciso expandir o negócio e transformá-lo.“ John A. Davis Diretor do programa Families in Business, da Harvard Business School
Fábio Coutinho
- 32 anos
- Gerente de inteligência de mercado
- Filho do sócio -fundador
- Começou na empresa aos 14 anos
- Graduado em Administração, Gestão comercial e Gestão estratégica de supermercados (pós-graduação)
ExtraBom (ES)
26 lojas Faturamento de R$ 871 milhões
“Continuo com muitas ideias para ajudar a empresa a crescer. Já contribuí para a criação do e-commerce da bandeira ExtraPlus, que atende mil pedidos por mês, e recentemente da marca Extrabom. Com esse novo canal, a expectativa é de atender 42 mil pedidos/ano.
Ajudei a desenvolver o mix de produtos importados e de marcas exclusivas e a automatizar o processo logístico, o que ajudou a tornar mais preciso o inventário e a reduzir em dois pontos percentuais (pp) a ruptura nas lojas. Criei o setor de precificação, que já no primeiro ano elevou em 1,2 pp a margem média. Também implantei a área de inteligência de mercado, que dá suporte ao comercial e que gerencio atualmente”
73% dizem ter muitas ideias sobre como impulsionar a empresa da família
“Não basta desenvolver um modelo de negócio bem-sucedido e esperar que ele funcione a cada nova geração. Donos, gestores e funcionários enfrentam sempre novos desafios. Apenas os que aceitam a mudança como uma norma da empresa são capazes de comandar uma transformação. Isso significa inovação verdadeira, modelos de negócios disruptivos e novas formas de trabalhar. “Dominik von Au Diretor da INTES Academy for Family Business e sócio da PwC Alemanha
Viviane Mazza
- 23 anos
- Diretora administrativa
- Filha do fundador
- Começou na empresa aos 19 anos
- Graduando Engenharia de produção
Maza Box (RJ)
1 loja Faturamento de R$ 28 milhões
“Quando comecei, dava suporte na tesouraria. Assim que entendi os processos da área, sugeri mudanças para elevar a produtividade e garantir dados mais confiáveis. Esse início foi difícil. Alguns funcionários pediram demissão, porque não aceitaram as sugestões. Isso acabou sendo positivo, pois ajudou a oxigenar a empresa. Desde que entrei no supermercado me sinto comprometida com melhorias. Com o tempo, as pessoas entenderam a importância disso e do meu trabalho. O respeito, a comunicação, saber ouvir e aprender com os colaboradores também ajudaram a conquistar a confiança deles e a provar o meu valor”
93% acreditam que, por ser um membro da família, precisam trabalhar ainda mais para provar seu valor
Em muitos casos, não basta o sucessor convencer os colegas de trabalho, mas também os familiares e outros membros mais distantes de sua competência. Essa tensão entre vida pessoal e profissional é difícil, um problema que afeta a família como um todo e o indivíduo. Aqueles que esperam administrar o negócio um dia sabem que, como parte dessa tarefa, precisarão profissionalizar a maneira como a família se governa. “Além disso, as novas gerações têm o importante papel de cultivar a mudança, pois estão mais atentas às novas tecnologias, às novas formas de se comunicar e interagir com o mundo”.Mary Nicoliello Diretora da área de governança de empresas familiares, na PwC Brasil.
Fonte: Supermercado Moderno