Após aumentar os investimentos em marketing, a Lego teve dificuldades para atender a demanda e foi obrigada a pisar no freio. Agora, sob novo comando global, a empresa ajusta sua operação para brigar pela liderança.
O marketing é uma poderosa ferramenta de vendas. Mas, antes de oferecer um produto, é saudável ajustar a produção à demanda, caso contrário haverá problemas. Que o diga a fabricante de brinquedos Lego. Os icônicos bloquinhos de montar da empresa dinamarquesa se tornaram um sucesso tão grande, que ela precisou dar um tempo nos seus ambiciosos planos. Seus negócios e sua marca extrapolaram as lojas de brinquedos. Há alguns anos, a Lego investe, por exemplo, no cinema. Seu primeiro longa metragem de animação, “Uma Aventura Lego”, lançado em 2014, gerou US$ 468,1 milhões em bilheteria, ficando entre os 15 maiores sucessos do ano, no mundo.
Também foram feitos investimentos na área de parques temáticos (hoje existem seis deles), videogames e em uma rede de 125 lojas próprias, inclusive no Brasil. O aumento da visibilidade trouxe até ações de marketing espontâneas, como a exposição que está sendo exibida na Oca, no Parque Ibirapuera, em São Paulo, apresentando esculturas feitas com o brinquedo idealizadas pelo artista americano Nathan Sawaya. O resultado foi uma dificuldade em produzir os brinquedos e atender a demanda. “Sentimos que precisávamos investir, criar espaço para respirar”, afirmou John Goodwin, diretor financeiro da empresa, à agência de notícias Reuters.
Esse descompasso entre oferta e demanda acabou se traduzindo em uma desaceleração nos resultados do primeiro semestre deste ano. O faturamento global cresceu 11%, para US$ 2,3 bilhões (15,7 bilhões de coroas dinamarquesas), um desempenho satisfatório, mas aquém do registrado no ano passado (25% de alta) e também da média de crescimento dos últimos 12 anos, que foi de 15% ao ano. Já o lucro líquido caiu de US$ 532 milhões para US$ 520 milhões. A companhia não divulga números por regiões, mas a operação que mais sofreu com a falta de produtos foi a americana, a segunda maior, atrás da europeia.
Os ajustes já estão sendo feitos. Neste ano, a Lego adicionou 3,5 mil funcionários à sua força de trabalho, que era de 13,9 mil pessoas ao final de 2015. A empresa está expandindo sua fábrica em Monterrey, no México, praticamente dobrando sua capacidade, para atender aos Estados Unidos; e uma nova unidade de produção está sendo construída na cidade de Jianxing, na China. Por conta desses investimentos, Goodwin prevê que a lucratividade da fabricante seguirá em baixa neste segundo semestre. O ajuste acontece em meio a uma mudança no comando familiar do grupo.
Kjeld Kirk Kristiansen, neto do fundador da empresa e o homem mais rico da Dinamarca, dono de uma fortuna de US$ 13,4 bilhões segundo a lista da Forbes, deixou o posto de vice-chairman da Lego, dando lugar a seu filho, Thomas Kirk Kristiansen. Kjeld e sua família controlam a fabricante desde 2007, quando ele comprou as ações que pertenciam à sua irmã. A ascensão de Thomas conclui um processo sucessório iniciado em 2004, quando a família deixou a gestão da companhia (a presidência hoje está a cargo do executivo Jorgen Vig Knudstorp), para se concentrar na parte estratégica. O novo vice-chairman (trata-se, na verdade, do cargo mais alto) terá alguns desafios.
Além de ajustar a oferta e a demanda, ele ficará encarregado de encontrar uma nova matéria-prima para fabricar os bloquinhos. Em 2015, a Lego anunciou um investimento de US$ 150 milhões no desenvolvimento de uma tecnologia que a permitisse abandonar o atual plástico, oriundo do petróleo. Os primeiros resultados são esperados para o final deste ano. A Lego vem investindo, também, em sua operação no Brasil. Desde o ano passado, ela conta com um escritório próprio no País. Anteriormente, a operação era tocada pela sua importadora, a distribuidora paulista MCassab. O mercado de brinquedos nacional vem experimentando forte crescimento.
Segundo Synésio Batista da Costa, presidente da Abrinq, associação que representa o setor, a previsão para este ano é de uma alta de 12%. No ano passado, este mercado movimentou R$ 5,7 bilhões. As importações somaram R$ 2,5 bilhões. Os blocos de construção, no entanto, representaram apenas 4,1% das vendas. Apesar dos percalços, a Lego vem construindo, bloco a bloco, uma operação que tem tudo para se tornar a maior do mundo. No ano passado, ela chegou perto: US$ 5,2 bilhões de faturamento, ante US$ 5,7 bilhões da americana Mattel, fabricante das bonecas Barbie. A loira estereotipada ganhou versões “politicamente corretas” e está na briga com os descolados bonequinhos, agora astros do cinema. Quem vai ganhar?