O português José Neves, CEO do e-commerce de luxo, conta em entrevista como enfrenta a crise no Brasil e consegue crescer no País
Considerado um dos homens mais importantes do mundo da moda pelo portal inglês Business of Fashion, o empresário português radicado em Londres, José Neves, é um das grandes referências do setor de e-commerce de moda e beleza. Ele é o criador da loja online Farfetch, que permite ao consumidor brasileiro acesso a mais de 400 boutiques ao redor do mundo e a inúmeros estilistas que não chegam às nossas lojas.
Economista, Neves investe no Brasil há seis anos e vem recebendo retorno. No lançamento de um novo serviço, em que o cliente nacional pode comprar peças de luxo no exterior, pagar em reais e ainda parcelar em seis vezes (desde que retire suas mercadorias durante uma viagem), ele falou dos desafios de gerir um negócio global e de como faz para se manter atualizado em meio aos rápidos avanços tecnológicos.
O que você teve que mudar para adaptar seu modelo de negócio ao Brasil?
O modelo de distribuição de moda no Brasil é muito distinto em relação à Europa. No País, as marcas vão diretamente ao consumidor, diferentemente da Europa, em que as lojas de departamento têm um papel preponderante. Essa foi a grande mudança que tivemos que fazer aqui. Começamos a trabalhar diretamente com as marcas. Outras mudanças foram em relação ao comportamento do consumidor: aqui ele demanda muito mais serviços, como compras parceladas, personal shoppers entre outros. Tivemos que nos adaptar para oferecer uma experiência de luxo para nossos clientes.
Com esse novo programa de compras diretamente no exterior com as facilidades do varejo brasileiro, você acredita que irá aumentar as vendas?
O programa é oferecido desde o ano passado para um seleto grupo de clientes, e agora estamos abrindo o benefício a um maior grupo. Este programa vem para complementar o trabalho que já realizamos no Brasil. O comércio ‘cross-boarder’ é um dos setores que mais cresce em todo o mundo. E os brasileiros compram muita moda quando estão viajando. Estudos mostram que mais de 20% das compras são em vestuário. O que nós acreditamos trazer com este programa é um maior conforto e variedade para este cliente que já tem o hábito de comprar produtos de marcas internacionais fora do País. Não importa onde for, terá à sua disposição mais de 400 butiques com o melhor da moda internacional em um único site, com atendimento e todo suporte em português ou no idioma que preferir.
Trata-se de uma iniciativa audaciosa, pois desafia a burocracia no Brasil. Vocês estimulam os clientes a declarar os bens comprados no exterior?
O benefício foi instaurado visando a comodidade do cliente e, em geral, já é oferecido por outros e-commerces. A diferença é que a Farfetch oferece adicionalmente o pagamento parcelado em seis vezes. Em relação à declaração dos bens, a Receita indica que, desde 2010, produtos de vestuário, se para uso pessoal, não precisam ser declarados.
Falando de Brasil, você acredita no nosso mercado a longo prazo? Qual a estratégia da Farfetch para superar o ano difícil?
O Brasil foi a nossa primeira aventura fora da Europa. Ao longo desses seis anos de operação no País passamos por grandes desafios – o maior deles foi entender um mercado tão complexo. Tivemos a oportunidade de apresentar e trazer marcas não vendidas e nem representadas em território nacional e com forte apelo ao gosto dos brasileiros. O ano difícil vem sendo um grande desafio, porém continuamos crescendo e atingindo nossos objetivos, contratando e desenvolvendo os mais de 90 talentos que temos em nossa sede no Brasil.
Quais as marcas e estilos que mais atraem o consumidor de luxo brasileiro?
O brasileiro é muito antenado. Hoje o País é o segundo maior em engajamento e números de fãs em redes sociais como Facebook e Instagram. Por isso, as tendências chegam em tempo real, sem atraso de coleção em comparação à Europa ou aos Estados Unidos. Marcas como Fendi, Givenchy, YSL, Valentino, Jimmy Choo, Stella McCartney, Andréa Marques, Isolda e Forum Tufi Duek são marcas que podemos citar como algumas das preferidas de nossas clientes. Além de elegantes, as mulheres brasileiras são sexy, ousadas, coloridas e divertidas, por isso buscam também marcas como Dolce & Gabbana, Moschino, Aquazzura e GIG, que ressaltam estes atributos. O homem brasileiro que gosta de moda é bastante exigente e moderno. Para eles podemos destacar marcas como Dsquared2, Y3, Moschino, Alexander McQueen.
Com tanta inovação no universo digital, como se manter à frente do tempo e antecipar as tendências de mercado?
A nossa grande missão é revolucionar a forma como as pessoas consomem moda. Justamente por isso, temos que estar sempre buscando as melhores fontes de tecnologia e estar sempre à frente do nosso tempo. Foi assim que crescemos de forma exponencial nos últimos oito anos. Estamos constantemente ouvindo o consumidor para entender quais são suas necessidades. Ao mesmo tempo, não temos medo de arriscar e trazer ideias inovadoras, que às vezes nem mesmo os clientes sabiam que queriam. Um exemplo disso é o serviço de entrega em iates, que fazemos durante o verão, em todos os países mediterrâneos.
Em termos de e-commerce, quais são os focos de inovação mais importantes no momento?
Um dos grandes focos de inovação é a integração entre o varejo físico e o varejo online – a palavra que mais se escuta no mercado é omnichannel. Ano passado, adquirimos uma das boutiques mais tradicionais de Londres, a Browns, e estamos trabalhando para entregar para o cliente um novo modelo de integração jamais visto no varejo.
E como se mantêm atualizados em termos de novidades em designers e marcas?
Quem nos mantém atualizados são os donos das boutiques. Eles são as pessoas antenadas, que estão sempre buscando novas marcas e designers. Eles são a parte do ecossistema da moda que mais busca por novos designers e marcas. Como temos mais de 400 boutiques, temos conosco mais de 400 curadores de moda. Isto é o que faz a Farfetch única entre todas as empresas de moda de luxo.