Depois de comprar a rival Avon Products e tornar-se a quarta maior empresa do setor de beleza do mundo, a Natura, que completa 50 anos neste mês de agosto, prepara o terreno para ampliar o portfólio, reorganizar a produção e reduzir, cada vez mais, o prazo para criar e lançar produtos.
O presidente da companhia, João Paulo Ferreira, observa que os últimos dez anos foram difíceis. “A complexidade no país aumentou. Teve a entrada de mais marcas na primeira metade da década e a expansão de outros canais de compra e distribuição”. Durante algum tempo, a capacidade de inovação da Natura foi alvo de questionamento de analistas.
Com as multinacionais e marcas locais menores conquistando fatias relevantes do setor de beleza no mercado brasileiro, a Natura compreendeu que era preciso ser mais ágil na inovação. A empresa perdeu mercado nos últimos anos. Dados da Euromonitor mostram que a Natura tinha fatia de 15% em 2009, mas caiu a 11% em 2016. No ano passado, subiu para 11,9%.
A companhia vem acelerando o ritmo de lançamentos. Ferreira, que recebeu o Valor em uma ampla sala na sede da companhia em São Paulo, rodeada de árvores e espelhos d’água, faz questão de levantar-se e dirigirse a uma bancada para mostrar novos produtos. Esmaltes e uma linha para tratar os cabelos estão entre eles.
O executivo observa que a Natura “não era forte em cabelos”, um mercado em que as vendas são lideradas por Unilever (22,3%), L’Oréal (2,01%) e Coty (7,8%), segundo dados da Euromonitor International. Agora, com a nova linha, a Natura pretende atrair mais consumidores.
Na categoria de esmaltes, a companhia retorna à categoria da qual havia saído há cerca de 15 anos. Agora, os produtos são fabricados sem insumos químicos controversos como parabeno, eliminado do portfólio há alguns anos. Os principais concorrentes nessa área são Coty, dona da Risqué, e a marca Colorama, da L’Oréal.
Ferreira lembrou que a estratégia atual da Natura resulta da decisão dos sócios-fundadores Luiz Seabra, Guilherme Leal e Pedro Passos de redesenhar o modelo de operação. “Via de regra, uma empresa longeva precisa passar por desafios com criatividade, empolgação e inovação para se preparar para os próximos ciclos de expansão”, disse o executivo.
Há pouco mais de três anos a Natura abriu um novo braço de negócios: lojas próprias em shopping centers. Atualmente, são 46 unidades no Brasil. No Nordeste, a marca chegou neste ano. No exterior, são nove pontos. Além disso, existem mais de 200 franquias da “Aqui Tem Natura” comandadas por revendedoras, localizadas no comércio de rua ou galerias.
Parte das mudanças para ser mais ágil foi concluída há um ano e meio, quando a Natura inseriu os consultores e consumidores no processo de criação de produtos. A ideia de ficar trancado na sala e criando um produto durante três anos para depois descobrir que não funciona é ultrapassada. Ferreira diz que o chamado “protocolo ágil” permite descobrir antecipadamente os erros.
Ao adotar essa nova metodologia, a Natura, que dependendo do produto poderia levar um, dois, três ou mais anos para criar algo novo, encurtou esse prazo em 30% a 40%. “Já é um salto importante, mas queremos continuar reduzindo”.
No ano passado, a marca lançou pouco mais de 200 produtos. Manteve um ritmo de inovação perto de 60% nos últimos cinco anos — ou seja, a cada ano o portfólio era renovado nesse percentual. Dois terços da receita vêm de itens com menos de 24 meses de idade. O percentual da receita líquida investido em pesquisa e desenvolvimento no país ficou em 2,2% no ano passado, ou R$ 185,83 milhões.
Para este ano, a Natura ainda planeja relançar a Todo Dia, a principal marca da companhia e que reúne produtos de higiene pessoal, fragrâncias e cremes. A linha, cuja última alteração foi feita em 2014, terá embalagens 100% recicladas. A linha Mamãe e Bebê, outra marca clássica da companhia, foi relançada em julho deste ano.
Nessa nova fase, a América Latina e o Sudeste Asiático recebem uma atenção especial. Nesta semana, a empresa começou a vender seus produtos na Malásia. “A América Latina ainda tem um potencial enorme para crescer. Representa um terço da receita, mas pode dobrar. As operações no México e na Colômbia são jovens e crescem muito. Vamos levar a marca para todos os países [da região] a partir de 2020”, disse Ferreira.
Com a aquisição da Avon, a Natura reforçou a presença na América Latina, maior mercado da empresa americana. A transação, que aguarda avaliação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), deve ser concluída no primeiro trimestre do ano que vem.
Ferreira observa que há “uma série de restrições e muitas informações não podem ser compartilhadas [neste processo]. Começamos a nos conhecer”. A consultoria McKinsey foi contratada e coordena os estudos para identificar oportunidades de ganhos para a Natura.
No Sudeste Asiático, a marca Natura chegar neste semestre — as vendas na Malásia já começaram a ser feitas. O plano é estrear pela internet e com venda direta. Mais adiante, uma loja física será aberta — o local não foi informado. Para isso, a Natura vai se valer da presença e da experiência da australiana Aesop e da britânica The Body Shop na região. A The Body Shop, comprada pela Natura em 2017, está na Malásia, Filipinas e Tailândia. A Aesop, adquirida em 2012, opera no Japão, Coreia do Sul e Hong Kong.
Nos últimos dois anos, o comando da Natura tem estudado como obter sinergias com a marca britânica, especialmente na compra de insumos. Ferreira disse avaliar, por exemplo, produzir os sabonetes da The Body Shop no Brasil. Isso pode deixar o produto mais competitivo. “O desenho ficará pronto este ano. Os produtos poderão ser fabricados pela Natura ou por empresas terceiras”, afirmou.
Fonte: Valor Econômico