Por Sergio Ripado
Após reportar um prejuízo de R$ 47 milhões e uma dívida líquida de R$ 595 milhões em 2022, a Espaçolaser (ESPA3) ambiciona alcançar novo patamar recorde de vendas a fim de melhorar a geração de caixa e reduzir o nível de alavancagem em 2023. Para atingir esse desempenho, a companhia tem cortado despesas, reduzido prazos em operações de antecipação de recebíveis e cogita uma futura rolagem de vencimentos de dívida. A maior competição no segmento de estética e o impacto dos juros elevados nas despesas financeiras são outros desafios no caminho da companhia.
Em entrevista à Bloomberg Línea, o CEO da Espaçolaser, Paulo Camargo, que trocou o comando da rede de fast food norte-americana McDonald’s no Brasil – por meio das Arcos Dorados – para assumir a companhia em junho de 2022, disse que o “turnaround” já começou e que seu objetivo é preservar o caixa, melhorar as margens operacionais e reduzir a alavancagem de um nível de 3,1 vezes (2022) para o “ideal” de 2 vezes.
“Tivemos vendas recordes em todos os três meses do quarto trimestre. As vendas recordes em Same Stores Sales [mesmas lojas] sinalizam uma retomada da Espaçolaser. Vamos continuar batendo recorde neste ano”, disse Camargo, que evitou dimensionar o desempenho das receitas no primeiro trimestre de 2023.
O quarto trimestre de 2022 fechou com prejuízo de R$ 12,9 milhões, abaixo dos R$ 16,9 milhões do terceiro. A dívida líquida do ano também foi reduzida em R$ 41,9 milhões após a entrada dos recursos do aumento de capital (R$ 225 milhões captados). O aporte foi feito em outubro pelos principais acionistas, incluindo a L Catterton, um dos maiores fundos globais de private equity focado em consumo e varejo, associado ao grupo internacional LVMH.
O CEO tem aplicado mudanças de gestão na companhia, que encerrou 2022 com 769 lojas com a marca Espaçolaser no país, 40 unidades a mais na comparação com o ano anterior, além de 10 unidades Estudioface, voltada para tratamentos faciais (menos 3 lojas em 12 meses). Camargo reduziu o número de diretores regionais de 8 para 6, e de gerentes, de 70 para 60.
“Já conseguimos reduzir em 10% as despesas gerais e administrativas. Há várias iniciativas em andamento para melhorar as vendas e a eficiência na companhia”, afirmou o CEO, sem detalhar.
O dado mais destacado por ele durante a entrevista foi o aumento de 8,7% nas vendas no quarto trimestre, um aumento de 16,9 pontos percentuais em 12 meses. Essa variação segue o critério Same Stores Sales, ou seja, considera apenas as vendas das lojas que já estavam abertas no mesmo período do ano anterior, desconsiderando unidades novas, que ainda não têm resultados comparáveis.
Nem todas as vendas foram reconhecidas no quarto trimestre, pois o cliente compra um pacote de sessões de depilação que só será concluído em meses seguintes. “Só 1/3 das vendas foi reconhecido no quarto trimestre. O restante ficou para o próximo trimestre”, explicou o CEO, evitando antecipar os dados operacionais do primeiro trimestre, em respeito às regras do mercado.
“A boa notícia é que estamos melhorando a cada trimestre. O setor de depilação no Brasil cresce ano a ano. O mercado ainda é pouco penetrado. Temos uma tecnologia única, que usa o gás criogênico para o controle da sensação térmica. Esse é o nosso maior diferencial em relação à concorrência”, afirmou Camargo, acrescentando que a estratégia da Espaçolaser para aumentar as vendas neste ano inclui o apelo à força de marketing de celebridades como a atriz Juliana Paes, a influenciadora digital Jade Picon e o surfista Gabriel Medina. A apresentadora de TV Xuxa Meneghel, também entusiasta da depilação a laser, detém 2,5% das ações da Espaçolaser.
Sobre a redução das margens, com a práticas de descontos expressivos nos preços dos pacotes, o CEO diz que a companhia busca a recorrência do cliente ao longo do tempo. “Nosso plano regular custa R$ 1.500. O cliente paga para depilar uma área do corpo, percebe que o procedimento não dói e aí decide depilar uma outra área”, exemplificou o CEO.
América Latina
Para preservar o caixa da Espaçolaser, o executivo descarta abertura de unidade própria neste ano. Em 2022, foram abertas 68 novas lojas no Brasil e 11 novas lojas no exterior, entre unidades próprias e franquias. Fora do Brasil, no total são 46 lojas em quatro países da América Latina (Argentina, Chile, Colômbia e Paraguai), 10 a mais do que no ano anterior.
“A Argentina foi nosso primeiro país de atuação fora do Brasil, onde entramos através de um modelo de joint venture em 2018. No quarto trimestre, abrimos mais uma loja própria no país, encerrando o ano de 2022 com 17 unidades, sendo 14 próprias”, destacou o balanço da companhia.
A decisão de não abrir novas unidades no exterior se deve ao foco do novo comando da Espaçolaser nas operações no Brasil, evitando complexidades no seu plano de ação, em um momento em que a ordem na companhia é evitar investimentos de risco elevado e aumentar a geração de caixa atuando em mercados que domina.
Camargo não escondeu que a ambição da Espaçolaser é chegar ao mercado norte-americano, mas, segundo ele, essa tacada deve ser bem estudada, após superar os atuais desafios da gestão, como ajustar suas operações, alongar sua dívida e aguardar ventos favoráveis do cenário macroeconômico.
Peso da dívida
Os dois últimos trimestres de 2022, sob nova direção, mostram que o CEO tem feito o que o mercado aponta como necessário para a virada de jogo.
Em agosto do ano passado, após Camargo assumir o cargo de CEO e antes do aumento de capital realizado em outubro, a Fitch Rating rebaixou o rating de uma emissão de debêntures, citando a expectativa de que a Espaçolaser passaria a operar com margens operacionais mais limitadas, decorrentes de uma conjuntura macroeconômica desfavorável e do aumento da competição.
“O enfraquecimento da geração operacional de caixa da companhia deverá resultar em alavancagem financeira ajustada em torno de 4,0 vezes nos próximos dois anos. No entanto, a classificação considera que a empresa será bem-sucedida no alongamento de seu cronograma de vencimento de dívida”, projetava o relatório da Fitch, em agosto.
“As elevadas taxas de inflação e juros, bem como a maior restrição de renda disponível da população e o menor tíquete médio dos competidores, impõem significativos desafios à operação da companhia, que conta com cerca de 59% do público-alvo nas classes C e D”, detalhava a Fitch.
Na avaliação da agência de rating, esses riscos tenderiam, no entanto, a ser “mitigados pelas reconhecidas marcas da Espaçolaser, por sua diversificação geográfica e pela escala de operações significativamente maiores que a dos competidores”.
Quanto ao calendário de sua dívida, a Espaçolaser informou, nesta segunda-feira (27), que 89% dos vencimentos estão no longo prazo. Em setembro, a companhia tinha renegociado suas debêntures.
“Nosso nível de alavancagem, medido pela relação dívida líquida/Ebitda contábil excluindo o efeito contábil das empresas incorporadas e custos e despesas não recorrentes, alcançou 3,1 x no 4º trimestre, abaixo dos covenants de 3,5 x. Cabe destacar que, com a 2ª emissão de debêntures, concluída em 16 de setembro, 89% dos vencimentos estão alocados no longo prazo”, disse a companhia no material sobre o balanço.
O CEO disse que a companhia ainda tem tempo para trabalhar sobre a rolagem da dívida e que o atual nível de alavancagem é o “adequado”, embora reconheça que o ideal seria um nível de 2 vezes, algo que ele acredita ser possível alcançar com a melhora no resultado de geração de caixa e com iniciativas de aumento de eficiência e recuperação de margens.
A margem bruta da companhia caiu de 38,8% para 35,3% em 12 meses, enquanto a margem Ebitda ajustada recuou 9,1 pontos percentuais no período, de 22,2% (quarto trimestre de 2021) para 13,2% (quarto trimestre de 2022).
“2023 é o ano de defender o caixa, melhorar as margens operacionais e reduzir a alavancagem”, resumiu Camargo.
As ações da Espaçolaser acumulam queda da ordem de 20% neste ano, o dobro da perda do Ibovespa no período. A companhia abriu capital em fevereiro de 2021 como a primeira empresa do segmento de serviços de estética a estrear no pregão da B3, após precificar o papel a R$ 14,99 no IPO (oferta inicial de ações).
Fonte: Bloomberg Linea