A empresa de comércio eletrônico Mercado Livre prevê investir R$ 2 bilhões no Brasil em 2018, o dobro da soma anunciada no ano passado, e as áreas que receberão os maiores desembolsos serão frete grátis e o programa de fidelidade, disse o comando do grupo. No ano passado, a maior parte do valor anunciado de R$ 1 bilhão foi aplicado em frete zero – numa estratégia que fez o mercado questionar a reação de rivais, como Magazine Luiza e B2W.
Com o novo anúncio, a empresa reforça a aposta de subsidiar o consumidor para ampliar venda e ganhar mercado, apesar dos possíveis efeitos sobre rentabilidade. A medida vai na contramão da estratégia de seus grandes rivais, que têm defendido a preservação das margens nos últimos dois anos.
“Frete grátis não tem prazo para acabar. Mas não são investimentos irracionais, é algo planejado e que temos capacidade de fazer”, diz Stelleo Tolda, vice-presidente de operações do Mercado Livre.
Não se trata de um desembolso diretamente na operação de frete, segundo dois consultores próximos à empresa. “Não é uma injeção de recursos pura e simples. Eles subsidiam o frete por meio de um aumento de despesas operacionais e lá no fim do dia vem a conta. Sabe-se que a estratégia tem respaldo dos acionistas, então o mercado deve tolerar isso por algum tempo”, diz um consultor.
Em teleconferência a analistas neste mês, a empresa admitiu que a principal razão da compressão de margem bruta no quarto trimestre de 2017 foi o impulso à política de frete zero e do programa de fidelidade no Brasil e no México. Após a teleconferência, as ações caíram 1% e, desde então, subiram 9,5%. “Isso mostra que mercado entendeu o que estamos fazendo”, diz Tolda.
Questionado sobre a origem dos recursos para sustentar os desembolsos, o executivo afirma que há capital da matriz, além de reinvestimentos da subsidiária, sem especificar valores. Ao fim de 2017, a posição de caixa do grupo no mundo era de pouco mais de US$ 388 milhões (cerca de R$ 1,3 bilhão), 23% acima do ano anterior. O mercado brasileiro equivale a 60% da operação global.
O balanço de 2017 não informa se a empresa fechou o ano passado com lucro no país. A receita líquida no Brasil subiu 82% (em dólar) no ano e no quarto trimestre. A empresa opera o modelo de “marketplace”, que consiste na venda de produtos de lojistas hospedados no site, e estes pagam comissão pelos serviços oferecidos pelo Mercado Livre. É o mesmo modelo que vem sendo explorado por B2W, Walmart e Amazon no país.
Neste momento, essa estratégia de desembolsos mais agressivos têm que contabilizar a batalha da empresa contra os Correios. A estatal elevou o preço das entregas este mês, mas o Mercado Livre obteve uma liminar contra o reajuste, de 29% em média, segundo o grupo. Ontem, a liminar foi suspensa, mas a companhia vai recorrer. A direção do Mercado Livre já afirmou que se o aumento dos Correios prevalecer, uma parte do custo de frete teria que ser repassada pelos lojistas do site ao consumidor.
A expansão mais acelerada do Mercado Livre fez a empresa superar, pela primeira vez, a B2W na liderança do comércio eletrônico no país, diz Tolda. Ao se considerar o “marketplace” e a venda direta ao consumidor, a B2W vendeu R$ 12,8 bilhões em 2017, alta de 3,1%. O Mercado Livre vendeu R$ 17,4 bilhões. Em 2016, a B2W liderava, com R$ 12,4 bilhões, seguida pelo Mercado Livre, com cerca de R$ 11 bilhões.
Neste caso, há o efeito também, de certa forma esperado, da desaceleração das vendas diretas da B2W em seu processo de transição de um negócio de venda ao consumidor para o “marketplace”.
O Mercado Livre reforça que parte dos investimentos deve se voltar ainda para o Mercado Pago, ferramenta de pagamento oferecida aos lojistas. Isso deve ocorrer especialmente no atendimento ao varejo físico, que tem sido mais explorado pelo grupo nos últimos anos. “Estamos buscando maior capilaridade com o Mercado Pago. Cerca de 95% do varejo no país ocorre nas lojas físicas, temos que estar mais presentes aí também”, afirma Tolda. Na internet, a concorrência pode aumentar. Via Varejo e Magazine Luiza têm estudado explorar serviços de pagamento no “marketplace”.