Havaianas, Pampili e Pantys seguiram a trilha de fabricantes de calçados e roupas, como Nike, Adidas, GAP, e de cerveja, caso da Budweiser, que encontram os consumidores no mundo virtual
Por Raquel Brandão
Lucrativo e crescente, o mercado de NFTs — sigla em inglês para tokens não fungíveis — tem conquistado cada vez mais empresas de consumo, que querem romper as barreiras entre as realidades física e virtual em busca de manter suas marcas desejáveis. Aos poucos, empresas brasileiras começam a engrossar essa lista de companhias que estão habitanto o universo virtual. É o caso das calçadistas Havaianas e Pampili, que lançaram seus NFTs em 2021, e da Pantys, de calcinhas absorventes. Essas companhias seguiram a trilha deixada antes pelos fabricantes de artigos esportivos Nike e Adidas, a marca de roupas GAP e até a cerveja Budweiser, do grupo AB InBev.
Tokens são códigos numéricos com registro de transferência digital. Basicamente, um NFT é um ativo digital, representando um item de arte ou imagens, que não pode ser replicado. Ou seja, é uma obra exclusiva e, assim como um quadro de um pintor famoso, pode se valorizar com o tempo e ser revendida a valores ainda mais altos. Esse mercado de criptoativos superou US$ 40 bilhões em 2021, segundo a consultoria Chainalysis, especializada em blockchain.
Em maio do ano passado, a Havaianas colocou no ar sua coleção de cinco artes digitais criadas pelo designer Adhemas Batista, com o tema “Felicidade”, reproduzindo as sandálias da marca. Duas obras foram à venda e a primeira a ser vendida foi leiloada no mesmo dia, com lance de R$ 5.600. O artista ainda mantém as outras obras em sua “vitrine” no “marketplace”, ou shopping virtual, de NFTs e não há definição de quando serão vendidas. Todo o recurso obtido com as vendas fica com o artista.
“Com os NFTs, a Havaianas reforça a ideia de que é um produto de modernidade, uma marca sempre à frente”, afirma Maria Fernanda Albuquerque, vice-presidente global de marketing da Havaianas. Além dos NFTs, a empresa já havia estreado no metaverso ao fazer uma parceria com o jogo eletrônico Fortnite, criando uma Ilha de Havaianas no ambiente virtual. A empresa agora trabalha em três projetos relacionados ao metaverso.
“É uma tendência. Cada vez mais as marcas devem estar de olho nisso. Vamos lançar uma coisa que só vai ficar no mundo virtual ou vai ter movimento entre os mundos?”, diz a executiva antecipando que ainda este ano um novo NFT deve ser lançado também ganhando uma versão física.
Do virtual para o real
Esse movimento de nascer no mundo virtual e depois virar produto real foi o que fez a Pampili, marca de calçados infantis. De olho no maior interesse das garotas pelo mundo dos games, a marca decidiu que tinha que entrar nessa realidade virtual. A porta de entrada foi a criação de um tênis digital em NFT, leiloado em junho por R$ 7 mil. Após uma disputa de 19 lances, a obra ficou com um comprador de Xangai.
“A iniciativa teve sucesso e passamos a receber pedidos pelo tênis”, conta Diego Colli, presidente da calçadista. Por isso, em março deste ano, a Pampili vai lançar o tênis SPK35, inspirado no NFT e com direito um NFT próprio. O preço do par será de R$ 229,90.
“Todas as pessoas que comprarem esse calçado vão poder ter acesso à NFT desse produto. Vamos fazer o movimento inverso.”
A empresa promete três benefícios para quem comprar o SPK35. O primeiro é o token, que é um item de colecionador, a pessoa pode colecionar ou revender no futuro. As pessoas que comprarem o tênis e o NFT vão participar de ações exclusivas com influenciadores e ter benefícios promocionais. Além disso, toda a base do NFT já está pronta para ser usada no Metaverso do Facebook, para que esse NFT vire um tênis virtual para a menina usar em seu avatar, por exemplo. “É uma estratégia do on-line pro off-line e vice-versa.”
Nativa digital, a Pantys resolveu dar o primeiro passo para o metaverso criando 33 tokens de imagens que remetem ao universo feminino e ao período menstrual, considerado ainda um tabu para muitas pessoas. “Sempre tivemos essa visão de focar em conteúdo, que consideramos um produto digital para nossos consumidores”, diz a sócia-fundadora da marca, Emily Ewell.
“Acreditamos muito que, no médio a longo prazo, esse universo vai se desenvolver muito. Pode trazer fonte de renda extra para empresa e alcançar um público que não alcançamos hoje”, completa Maria Eduarda Camargo, também sócia da Pantys.
Hoje, segundo dados do Iemi, o segmento de moda íntima, em que a marca está inserida, movimenta cerca de R$ 3,6 bilhões no Brasil e R$ 30 bilhões em todo mundo anualmente. O NFT, portanto, é visto pela empresa como uma oportunidade de conquistar novos clientes, superando, inclusive, fronteiras geográficas. Recentemente, a Pantys começou a acessar o mercado externo, em especial o europeu.
Para os 33 NFTs, os valores de vendas são a partir de 0,015 Ethereum, a criptomoeda usada nas negociações das NFTs. Aproximadamente, R$ 200,00 no câmbio de hoje.
Causas sociais
“Temos também como objetivo democratizar os valores de vendas dentro do novo universo”, afirma Emily. E como a tecnologia blockchain gera importante emissão de carbono, a empresa prevê neutralizar seus NFTs. As emissões da Pantys serão calculadas com base no consumo de energia da rede Ethereum e no gás médio utilizado por transação.
A cada transação, a marca doará uma peça para mulheres em situação de vulnerabilidade social. Já a médio e longo prazo, a marca deseja criar um “social impact NFTs”, trazendo coleções limitadas, também com parte do lucro revertido em doações.
Tanto Havaianas quanto Pampili também atrelaram suas NFTs a causas sociais. No caso de Havaianas, o valor correspondente ao lucro da venda foi revertido para o projeto Favela Galeria, museu de arte a céu aberto, localizado na zona Leste da cidade de São Paulo e escolhido por Adhemas Batista.
A Pampili destinou 70% do valor arrecadado na venda do token para a ONG Movimento Saber Lidar, braço da Associação pela Saúde Emocional de Crianças (ASEC), que é parceira da marca desde 2010.
Fonte: Valor Econômico