O comércio eletrônico representa cerca de 4% do total das vendas do varejo hoje no Brasil — o dobro do percentual registrado há cinco anos. Para a rede varejista Magazine Luiza, no entanto, que nasceu há 60 anos no interior de São Paulo, as vendas digitais já representam um terço das receitas. A operação digital está entrelaçada com as 830 lojas físicas. O cliente que compra pela internet tem a opção, por exemplo, de retirar o produto na unidade mais próxima. A equipe de desenvolvedores cresceu cerca de quatro vezes em dois anos e hoje reúne 300 profissionais dedicados a criar aplicativos como o usado por vendedores das lojas físicas, que fazem o pedido dos clientes e os envia automaticamente ao estoque. A medida diminuiu o tempo de emissão do pedido de 40 para 10 minutos. Neste ano, há a previsão de inaugurar 60 lojas, metade delas já saiu do papel.
Tudo isso tem dado bons resultados ao Magazine Luiza, cujas vendas somaram 10 bilhões de reais de janeiro a setembro, 25% acima do registrado no mesmo período do ano passado. O varejo como um todo cresceu mero 1,3% no país no mesmo período. A queda no valor de mercado da empresa após o anúncio da inclusão de itens de eletroeletrônicos no portfólio da gigante Amazon no Brasil, em outubro, não manchou o crescimento registrado em 2017. Até o fechamento desta edição, as ações da empresa foram as que mais valorizaram no país, com um crescimento de mais de 3.000% nos últimos dois anos. “Vamos continuar a transformação digital com pontos físicos e aprofundar nossos diferenciais competitivos”, disse Frederico Trajano, presidente da companhia, na conferência de resultados realizada em novembro.
Em 2017, o Magazine Luiza também é a empresa com o maior crescimento — de 30% — na lista das 25 marcas mais valiosas do Brasil, elaborada pela consultoria britânica Interbrand e publicada com exclusividade por EXAME. Atualmente na 21a posição, a marca vale hoje 497 milhões de reais. Na sequência das maiores ascensões está o Bradesco, que adquiriu em 2016 o concorrente HSBC por 16 bilhões de reais e avançou 18%. O crescimento do valor somado das marcas chegou a 6,4% neste ano e totalizou cerca de 117 bilhões de reais. É uma taxa pouco acima dos anos anteriores — em 2015 e 2016, os índices foram, respectivamente, de 2,7% e 5,4%.
Neste ano apenas cinco marcas perderam valor. Em 2016 sete tinham encolhido e em 2015 um recorde de dez diminuíram de tamanho. As quedas mais expressivas ficaram novamente com o BTG Pactual e a Petrobras, ambas as empresas envolvidas na Operação Lava-Jato. As -duas marcas perderam, respectivamente, 19% e 12%, de seu valor neste ano. Para o BTG, a queda começou em 2015 e já chegou a 46%. Para a Petrobras, no epicentro das investigações, o encolhimento é de 74% desde 2012. As cinco primeiras colocadas na pesquisa, realizada desde 2010, mantêm-se as mesmas há cinco anos. Juntas, Itaú, Bradesco, Skol, Brahma e Banco do Brasil representam 75% do valor total da lista. “O resultado demonstra uma retomada do consumo e a resiliência de marcas fortes que apresentam crescimento acelerado em relação ao mercado”, afirma Daniella Giavina-Bianchi, diretora executiva da Interbrand no Brasil.
As marcas que mais cresceram têm aspectos em comum: atuam no varejo, mesmo que em segmentos distintos, e não pararam de investir. Na sequência do Bradesco, está a varejista de moda Renner, com valorização de 16%. A marca, que registrou o maior crescimento em 2016, ao lado da fabricante de calçados Havaianas, abriu 26 lojas no Brasil em 2017 e inaugurou a primeira loja no Uruguai em setembro. A Havaianas registrou a quarta maior expansão, com uma taxa de 13%, e conseguiu neutralizar o efeito da troca de comando ocorrida nos últimos anos.
Em 2015, a empresa foi comprada pelo grupo J&F. Em julho deste ano, o então novo dono acabou por colocá-la à venda em meio à crise deflagrada pelas investigações de corrupção. A compra foi feita pelo grupo Itaúsa e pela gestora de recursos Cambuhy Investimentos por 3,5 bilhões de reais. Os principais executivos, no entanto, continuaram na empresa, o que garantiu certa blindagem dos resultados. A companhia abriu, desde o ano passado, 29 lojas no Brasil e 17 no exterior. Atualmente, a Havaianas tem 419 lojas no Brasil e 138 no exterior. “Os novos acionistas estão alinhados com a estratégia que vínhamos e continuaremos seguindo”, diz Carla Schmitzberger, diretora da área de sandálias da Alpargatas.
Assim como o Bradesco, que turbinou a própria expansão com a compra de um rival, a rede de locadoras de automóveis Localiza também registrou um salto com a ajuda da aquisição da operação da americana Hertz no Brasil. No total, a empresa passa a ter 551 pontos de locação no país, um acréscimo de 8,7% em relação ao patamar anterior. “Vamos aumentar a visibilidade da marca para estrangeiros no Brasil e para brasileiros, que nos encontrarão em 18 aeroportos ao redor do mundo”, afirma Herbert Viana, diretor de marketing da Localiza.
A estreante na lista é a rede de laboratórios de diagnóstico Fleury, que possui 33 unidades com a marca homônima em São Paulo e em Brasília — dez delas abertas em 2017. As receitas cresceram 9,6% em 2016.No segundo semestre de 2016, a empresa firmou uma parceria com a multinacional americana IBM para oferecer serviços de análise genômica no país. “Já temos produtos nessa área, como testes que identificam mutações genéticas associadas a doenças cardíacas”, diz Jeane Tsutsui, diretora executiva médica, técnica e de pesquisa e desenvolvimento do Grupo Fleury. Há novidade também na coleta. No caso da saliva, o próprio cliente pode enviar o material via correio. Já para as coletas de sangue é possível solicitar um kit pela internet, usá-lo num laboratório de outra marca e enviar pelo correio. Na lista das marcas mais valiosas deste ano, o Fleury está avaliado em 413 milhões de reais.
Nos setores que passam por rápidas mudanças tecnológicas, somadas aos efeitos da crise, a turbulência tem sido maior. A processadora de pagamentos Cielo, por exemplo, teve um lucro líquido 0,8% maior no terceiro trimestre deste ano em comparação com 2016. Por outro lado, a quantidade de pontos de venda ativos sofreu redução de 11,6% com o ingresso de novos concorrentes e com o fechamento de estabelecimentos. No ranking, a marca teve sua primeira queda desde sua estreia na lista em 2011 — a redução chegou a 5%, mas a companhia se mantém na décima posição. A rival Rede, por exemplo, saiu da lista das 25 mais valiosas neste ano. “Há muita chance de crescimento para pagamentos eletrônicos e já avançamos em alguns serviços”, afirma Duda Bastos, diretora de marketing da Cielo.
Um exemplo é o lançamento do Cielo Lio, que emite relatórios e ajuda na gestão das vendas de varejistas. A operadora de telefonia Vivo, assim como a Cielo, também precisou se equilibrar para continuar na mesma posição, entre as dez primeiras colocadas. A marca perdeu 3% de seu valor ao registrar resultados menores do que os esperados por analistas e investidores, com apenas 0,9% de acréscimo às suas receitas líquidas em 2016. As que perderam valor também sofreram com a mudança de hábitos do consumidor. É o que se vê na queda da varejista Extra, cujo valor de marca encolhe desde 2015. A redução é visível também nas ruas. No Grupo Pão de Açúcar, dos 13 atacarejos Assaí inaugurados em 2016, duas lojas tinham antes a marca Extra. Neste ano, mais sete endereços foram convertidos até setembro para o modelo que tem atraí-do mais consumidores.
O histórico do ranking, porém, mostra que é possível recuperar espaço. Um exemplo, também do Grupo Pão de Açúcar, é a varejista Casas Bahia. No ano passado a marca perdeu 16% de seu valor. Em 2017, cresceu 2%. A volta por cima se deve a uma série de medidas. De março a junho, foram inauguradas 13 lojas premium, com tíquete médio 40% mais elevado em relação às lojas tradicionais. Outro caminho é abrir lojas nas quais os clientes possam escolher os produtos em terminais conectados à internet. A intenção é abrir dez lojas e converter 250 unidades de Casas Bahia e Ponto Frio, pertencente ao mesmo grupo, para o modelo batizado de “smart” neste ano. “Sair ileso de um cenário de crise não é para qualquer um”, diz Daniella Giavina-Bianchi, diretora da Interbrand. “As marcas que vêm crescendo estão colhendo os frutos de um trabalho que começou muito antes da retomada do otimismo.”
Fonte: Exame