Um ano após a compra da Netshoes, o Magazine Luiza fará duas mudanças na linha de frente da varejista on-line de artigos esportivos. Segundo apurou o Valor, Marcio Kumruian, fundador e CEO da Netshoes, deve deixar a função executiva e se tornar membro do colegiado da controladora.
A diretora de operações da Netshoes, Graciela Kumruian, irmã de Marcio, passa a ocupar a diretoria de clientes do Magazine, função até então inexistente, confirma a executiva. A decisão foi tomada após um avanço no plano de integração e aumento das vendas, que levou a Netshoes a atingir equilíbrio entre receita e despesa (“break even”) após a pandemia.
As atribuições de Marcio devem ficar a cargo de Eduardo Galanternick, diretor-executivo de comércio eletrônico e um dos braços direitos do CEO Frederico Trajano na operação digital. O cargo de CEO da Netshoes deve ser extinto. Serão três meses de transição para que Galanternick assuma as tarefas.
Era preciso uma definição agora porque o contrato entre Magazine, Marcio e Graciela previa a manutenção de ambos na gestão da companhia por um ano, para depois, decidir como ficariam as funções. “Eles tinham que entregar determinadas metas e não só entregaram, como superaram”, diz Trajano. Sobre a cadeira no conselho, Marcio e Frederico preferem não comentar a respeito.
O fundador da Netshoes diz, sobre sua nova função, que “há algumas possibilidades” sendo discutidas e vê qualquer evolução como “algo natural”. O Valor apurou que ele deve assumir como membro do colegiado no segundo semestre. Marcio poderá se envolver em outros investimentos de forma paralela, desde que não concorram diretamente com o Magazine. As mudanças precisam ser aprovadas em assembleia de acionistas ainda a ser marcada.
O Magazine também se prepara neste ano para montar um “escritório de integração” de novos negócios a serem comprados com recursos do aumento de capital de R$ 4,7 bilhões no fim de 2019.
A Netshoes foi adquirida em junho de 2019 por cerca de R$ 440 milhões, e se tornou no maior negócio já comprado pelo Magazine, mas não tinha a mesma eficiência e estava alavancada. Desde o ano passado, depois de renegociar dívidas e pagar fornecedores, foi preciso juntar as estruturas e cortar despesas que se sobrepunham.
Em meados de 2019, o Magazine Luiza tinha uma relação entre receita líquida e despesa na faixa de 21% e a Netshoes, de 30%.
“Já melhorou, mas não atingimos essa taxa ainda. Deve ocorrer após a integração total. Ainda há fases não concluídas nesse processo”, diz Marcio. Há 400 processos mapeados em diferentes frentes – de logística e sistemas às linhas de produtos.
Graciela menciona, entre as medidas planejadas, um aumento no número de lojas do Magazine utilizadas no sistema “retira em loja” da Netshoes. Hoje, mercadorias vendidas pelo site e aplicativos da Netshoes podem ser retiradas pelos clientes em 30 pontos do Magazine. O número ainda é pequeno – a varejista tem 1,1 mil lojas no país. O uso dessa estrutura de distribuição tem que avançar porque ajuda a reduzir prazo de entrega e melhorar nível de serviço – algo que virou foco da companhia desde o ano passado – e elevar vendas.
“Vamos ampliar o sistema para todas as lojas, mas isso será feito gradualmente, em parte porque hoje há um nível grande de indefinições sobre quais lojas continuarão abertas por conta da pandemia”, diz a executiva.
O fundador da Netshoes diz ainda que a empresa conseguiu atingir em abril o “break even”, e isso vem se consolidando desde então. Em entrevista ao Valor em julho, Trajano projetava atingir esse nível entre fim de 2020 e início de 2021. O Magazine não divulga dados da Netshoes em seus balanços.
“A pandemia ajudou a chegarmos nesse patamar, em parte por conta do aumento acelerado das vendas no digital após o isolamento social […] Uma das metas hoje [com a unificação das operações] é elevar a “venda cruzada”, que chamamos de ‘cross selling’ [venda de produtos complementares numa mesma plataforma], que gera um crescimento dos negócios como um todo”, diz Trajano.
Marcio diz que, se a pandemia acabou tirando a Netshoes inicialmente do foco do Magazine, que concentrou mais esforços na operação de produtos como alimentos e itens de limpeza doméstica, ao mesmo tempo, trouxe para a carteira consumidores que não conheciam a marca. O total de clientes ativos passou de 6,5 milhões antes da crise para mais de 7 milhões. “Antes de março, crescíamos na mesma velocidade do mercado, segundo dados da Ebit. Após março, o digital deu um salto e acompanhamos isso”.
Ele diz que isso tem ocorrido sem perda de margens. “Meu compromisso com o Fred é crescimento equilibrado, numa lógica racional, sem perder rentabilidade. E mesmo numa crise, em que a concorrência pode acelerar, isso não muda”. A Centauro, que também tentou comprar a Netshoes, acaba de fechar uma oferta de ações de R$ 900 milhões. Com faturamento de R$ 3 bilhões em 2019, a Centauro tem 20% das vendas provenientes do braço digital. A Netshoes vendeu R$ 2,6 bilhões pela internet em 2019.
Sobre a operação do Magazine Luiza, Trajano diz que lojas reabriram “bem”, sem detalhar números. Na sexta-feira, eram cerca de 800 unidades reabertas, pouco mais de 80% do total. “Continuamos com vendas ‘mesmas lojas’ [em operação há mais de um ano] no positivo”, afirma. “Acredito que podemos estar ganhando participação de mercado porque há lojas com dificuldades que não reabriram.”
Fonte: Valor Econômico