Por Adriana Mattos
O Grupo Madero está em rodada de apresentação a investidores para avançar numa oferta pública inicial de ações (IPO, na sigla em inglês) que deve girar em torno de R$ 2 bilhões, dizem duas fontes ouvidas. As conversas estão na fase que precede a definição da faixa indicativa de preço da ação, que funciona como termômetro de interesse para a empresa e os bancos. Gestoras têm levantado, nas reuniões com a rede, aspectos financeiros e a necessidade de usar recursos da oferta para reduzir alavancagem e equilibrar a estrutura de capital do Madero, do empresário Luiz Durski Junior.
A operação terá tranches primária, com recursos para o caixa, e secundária, para o bolso dos sócios, sendo que, do total a ser levantado, R$ 1,2 bilhão a R$ 1,5 bilhão devem ser de oferta primária, apurou o Valor. O foco será o pagamento de dívidas, principalmente, e acelerar o crescimento orgânico. Há expectativa de venda de uma parte da fatia que o Carlyle tem na rede no lote adicional da oferta (“hot issue”).
A ideia é publicar as informações sobre o IPO dentro de duas a três semanas e conclui-lo no quarto trimestre. BTG Pactual, JP Morgan, Bank of America Merrill Lynch, UBS BB e Itaú BBA participam da operação. Os números que vêm sendo apresentados aos interessados consideram como projeção um lucro antes de juros, impostos, amortização e depreciação (Ebitda, na sigla em inglês) ajustado de R$ 250 milhões em 2021 e um valor da empresa de R$ 3,7 bilhões (incluindo capital e dívida), num múltiplo de 15 vezes o Ebitda.
Maior parte da oferta vai para pagar dívida e o restante para abertura de lojas, reforma de pontos, investimentos na produção e fortalecimento do braço digital.
A rede tinha dívida líquida de quase R$ 880 milhões em março, um terço acima de dezembro. E o saldo total de obrigações, de curto e longo prazos (que incluem, por exemplo, pagamentos a fornecedores, tributos e empréstimos), eram R$ 2,4 bilhões.
As obrigações com vencimento de até um ano somavam R$ 740 milhões, e deste total, R$ 545 milhões são financiamentos bancários. Nas conversas com o mercado, a rede tem reforçado o alongamento dessa dívida.
O comando da empresa têm ressaltado ainda o potencial do negócio e sua capacidade de recuperação neste ano, após a reabertura dos pontos. E reforçado o discurso de que o endividamento é solucionável, que a empresa é saudável e que “pensa grande”, diz uma fonte. Em uma mensagem no Instagram, em 26 de junho, Durski escreveu que a empresa “está muito bem”.
Um outro ponto que um outro investidor destaca é a exposição de Durski na mídia, especialmente nas redes sociais, que entraria numa conta de “risco político” da operação. “Junior faz algum barulho, ele já falou coisas polêmicas, mas ele sabe como tirar mais do negócio, e já entregou o que prometeu, em termos de números, no passado. É possível que acabe ficando mais contido sobre essas polêmicas envolvendo governo”.
Um eventual avanço no plano de IPO, uma agenda antiga de Durski, aconteceria após a rede relatar problemas de caixa, depois da crise da pandemia que fechou lojas. No balanço do primeiro trimestre, publicado em junho, a empresa informou que a liquidez disponível na rede, mais o caixa adicional esperado, não seriam suficientes para pagar obrigações das dívidas de curto prazo sem financiamento adicional, e com riscos à continuidade da operação.
A PwC, auditoria do grupo, relatava existência de capital circulante líquido negativo consolidado de R$ 446,5 milhões em março – esse montante inclui recursos para girar estoques, comprar insumos e pagar dívidas de curto prazo.
Neste ano, renegociações de dívidas foram abertas com Bradesco, Banco do Brasil, BTG Pactual e Itaú para alongar prazos e rever condições. Nessas conversas, segundo ata de reunião com debenturistas de 23 de junho, o Madero informou renegociação de uma debênture de R$ 160 milhões (quarta emissão) porque não vinha cumprindo compromissos financeiros, segundo dados do site da CVM. O Itaú coordenou a operação e encarteirou os papéis. Nesses casos, os investidores podem pedir antecipação de vencimento.
Para que isso não acontecesse, a empresa entregou garantia de cessão fiduciária de recebíveis de cartões de crédito. Em abril, a empresa fechou uma nova linha de crédito de R$ 54 milhões com o BTG.
“Se bem tocado, o Madero pode ser enorme, mas ainda há questões de custo fixo meio alto, acima da média. E o múltiplo do mercado, mesmo não tendo redes com modelos tão diretamente comparáveis, é menor, varia de 6 a 7 vezes o Ebitda”, diz um gestor que esteve com a empresa nesta semana. “A questão é se o mercado aceita pagar isso, considerando o projeto que estão vendendo e a questão da alavancagem. É um negócio que ainda estamos avaliando”, diz.
A IMC, que opera KFC e Pizza Hut no país, é negociada a 6,3 vezes o Ebitda de 2021 e o BK Brasil (Burger King), em 6 vezes, segundo projeção de analistas para o ano.
Apesar de ter repassado a gestão dos seus ativos à SPX Capital no ano passado, o Carlyle ainda tem investimento no Madero, por meio de um fundo estrangeiro. Em janeiro de 2019, Durski vendeu 22% da rede ao fundo Madrid, do Carlyle, por R$ 700 milhões. O objetivo era reduzir alavancagem e acelerar expansão, após a rede ter emitido, entre 2017 e 2018, R$ 531 milhões (incluindo juros) em debêntures.
O acordo com o Madrid inclui certas garantias em caso de descumprimento ou conflito, definido em acordo de acionistas, em relação a uma investigação em andamento pela Polícia Federal, iniciada em 2016. Essa garantia inclui direito de o fundo subscrever bônus equivalente a até 10% das ações emitidas e em circulação do Durski no Madero, em caso de descumprimento do acordado, segundo notas explicativas das demonstrações financeiras do primeiro trimestre.
Procurado, o Madero preferiu não comentar, pois está em período de silêncio.
Fonte: Valor Econômico