O cliente vai a uma livraria olhar as novidades e aproveita para tomar um café ou fazer um lanche na cafeteria dentro do estabelecimento. Ou, o contrário: ele procura a loja pelo café e depois aproveita para espiar o que a livraria tem a oferecer. Esse é um exemplo clássico de store in store, ou “loja dentro da loja”, conceito que une uma marca “hospedeira” e uma marca “hóspede” e que, de acordo com dados da Associação Brasileira de Franchising (ABF), vem crescendo pouco a pouco. Segundo o relatório do franschising brasileiro produzido pela ABF, o modelo de operação de store in store em franquias passou de 0,03% em 2017 para 0,04% em 2018, o que representa uma fatia ínfima do universo de franschising, mas que tem potencial de expansão.
A primeira motivação para que um empresário monte sua loja dentro de outra, em vez de criar um ponto próprio, é financeira. Abrir uma franquia da lavanderia 5àsec em um ponto de rua ou em shopping, por exemplo, custa cerca de R$ 380 mil. Quando a loja é uma store in store, há uma economia de R$ 50 mil, ou seja, a mesma unidade custa R$ 330 mil. Esses valores são referentes à loja completa, com todo o equipamento necessário para a lavagem das peças. A empresa também trabalha com estabelecimentos menores, os pontos de coleta, que apenas recebem as roupas e as enviam para uma unidade maior. Nesse caso, um ponto custa de 20% a 30% menos do que uma completa.
Segundo Alex Quezada, diretor de franquia da 5àsec, a empresa começou a investir nesse modelo, em 2006, como forma de facilitar a vida do cliente. Das 448 lojas estabelecidas pela franquia no País, 33 delas são no modelo store in store, sendo que nove estão em postos de gasolina e 24 estão em supermercados como Walmart, Carrefour e Pão de Açúcar. Pesquisas da empresa mostram que 30% de seus clientes usam a lavanderia mais de cinco vezes por mês, e outros 30% utilizam seus serviços de duas a três vezes por mês. A ideia é que esses consumidores aproveitem as idas habituais ao mercado para levar suas roupas para lavar.
Além de exigir menos investimentos iniciais, a operação das lojas store in store também é mais vantajosa porque o empreendedor economiza com uma infraestrutura que já está estabelecida, em um local que já conta com estacionamento, segurança e abastecimento de água e energia. “A lucratividade das lojas no modelo store in store é, em média 23% acima das demais”, diz Alex Quezada.
Segundo o executivo, o modelo também é uma forma de ajudar o franqueado a expandir seus negócios com um investimento mais baixo. Muitos empreendedores da 5àsec já são proprietários de franquias da lavanderia em outros locais e procuram o store in store para montar pontos de coleta.
Para Patricia Cotti, diretora executiva do Instituto Brasileiro de Executivos de Varejo & Mercado de Consumo (Ibevar), outra vantagem é associar a sua empresa a outra marca de peso e prestígio no mercado. “Geralmente, ou se busca para parceria uma loja com perfil de consumo parecido, ou uma com um status mais alto, que vai elevar a outra marca”, diz.
Por outro lado, é preciso considerar que, ao se hospedar dentro de um outro estabelecimento, a store in store tem algumas limitações, como espaço físico e padronização de comunicação, por exemplo. “Na loja própria a marca tem mais liberdade”, diz Patricia.
Na opinião de Alex Quezada, da 5àsec, o mais importante, antes de estabelecer uma loja neste modelo, é estudar o perfil e o fluxo do público da loja principal, para saber se existe uma sinergia entre as mercadorias e serviços oferecidos por ambas as marcas e se a movimentação de clientes atende às necessidades da empresa. Patricia Cotti concorda. “É um risco para o negócio se os produtos não se complementarem”, diz.
Um exemplo claro de sinergia de produtos são marcas de alimentos com “mini-cafeterias” dentro de lojas de conveniência em postos de gasolina. “Faz sentido ter esse modelo: o cliente vai pagar o combustível ou comprar algo emergencial e aproveita para consumir algum alimento ou bebida lá mesmo”, diz Vanessa Bretas, gerente de inteligência da ABF. Outros exemplos de produtos que se complementam: geladeiras de sorvetes dentro de restaurantes (naqueles casos em que as geladeiras são operadas como franquias, e não são de propriedade do restaurante); serviço de lavagem de automóveis dentro shoppings, academias, centros automotivos ou postos de gasolina; agências de viagem dentro de escolas de idiomas ou faculdades e empresas de procedimentos estéticos dentro de mercados ou até dentro de salões de beleza, para complementar os serviços oferecidos pelo estabelecimento.
Outro estilo dentro do modelo store in store são as “pop up store”, que são lojas temporárias e que podem também ser sazonais, por exemplo para a venda de produtos para datas comemorativas como Natal, Dia das Mães, Dia dos Namorados etc, e que podem complementar o catálogo de mercadorias de um estabelecimento.
Um aspecto interessante é que nem sempre uma marca “menor” vai para dentro de uma “maior”. Grandes empresas também estão apostando em formatos reduzidos para criar mais pontos de interação com o consumidor. As Casas Bahia, por exemplo, estão investindo no modelo quiosque em alguns shoppings e também como store in store, dentro do atacadista Assaí.
Loja “hospedeira”
Já para a loja que recebe outra marca, a vantagem principal é atrair uma nova geração de fluxo de clientes em potencial. “O estabelecimento pode começar a atrair um público que não necessariamente é o seu habitual”, afirma Patricia Cotti, do Ibevar.
Outro ponto positivo é ampliar os produtos oferecidos sem precisar desenvolver o know how de gestão daquela mercadoria. “A loja que recebe a store in store atende a mais necessidades e otimiza o tempo de seu consumidor”, diz Vanessa Bretas, da ABF. E o cliente que tem mais necessidades atendidas tende a comprar mais naquele estabelecimento.
Além disso, a empresa que aluga seu espaço para outras amplia seus serviços sem ter que incrementar seu sistema de logística, já que, normalmente, é o parceiro quem cuida da distribuição dos produtos. Outra vantagem: quando uma marca se estabelece dentro de outra loja, ela leva seus próprios funcionários. O estabelecimento principal pode reduzir seu quadro de empregados ou realocá-los para outros setores diferentes daqueles ocupados por locatários. Por outro lado, a loja parceira também pode ter um número reduzido de funcionários, já que ela não precisa ter um caixa próprio, por exemplo.
É o que acontece dentro dos mercados do Grupo Pão de Açúcar (GPA), que estabeleceu o modelo de store in store em suas unidades há cerca de um ano e meio, e hoje conta com parcerias com a Etna, Daiso e Swift, entre outras marcas. Algumas delas ocupam um espaço significativo. As gôndolas da Etna na loja do Extra no bairro do Itam Bibi, por exemplo, preenchem cerca de 800 m2.
“As compras eram mais centralizadas nos hipermercados de alguns anos atrás, mas isso começou a se abrir”, diz Luiz Felipe Barbosa, diretor comercial de não-alimentos do Grupo Pão de Açúcar. “Se antes o consumidor comprava brinquedos e artigos para casa no mercado, agora ele os adquire em lojas especializadas”, diz. Segundo Barbosa, o GPA começou a discutir a inserção do modelo store in store justamente para trazer de volta às lojas do grupo essa experiência de compra mais unificada, na qual o cliente coloca todos os artigos no mesmo carrinho e passa apenas uma vez pelo caixa. “Priorizamos um fluxo contínuo do cliente, sem interrupções, com marcas de referência, que o cliente deseja ou das quais já é consumidor”, afirma.
Os modelos de negócios das store in store variam. A marca secundária pode pagar apenas um aluguel à loja principal, ou também repassar uma porcentagem dos lucros. “Depende da negociação entre as partes”, diz Vanessa Bretas. E, como em qualquer relação comercial, é preciso deixar claro as expectativas, obrigações e ganhos de cada lado, ressalta Vanessa.
Tendo claros todos os aspectos do negócio, e com sinergia entre público e produtos/serviços oferecidos, o modelo store in store tem tudo para ser um ganha-ganha entre ambas as partes.
Fonte: Novarejo