Por Maria da Paz Trefaut | No número 19 da rua Yvonne Le Tac, no bairro de Montmartre, acaba de ser inaugurada, na semana passada, a primeira loja de chocolates Dengo, em Paris. Na fachada de linhas retas se destacam madeira e vidro. Dentro há espelhos, móveis em madeira, uma parede de pedra e os estofados são vermelhos. Com essa abertura, a cadeia soma 34 lojas e tem a expectativa de chegar a 38 até o final de 2023 com mais duas no Brasil e outras duas na capital francesa.
Essa é primeira bandeira que a marca finca fora do Brasil como início de um processo de internacionalização na Europa e fora dela, o que pode incluir o mercado asiático, dos Emirados Árabes e norte-americano. A Dengo Europa é uma subsidiária da Dengo Chocolates SA, que tem como sócios-fundadores o empresário Guilherme Leal, principal acionista da marca e um dos sócios-fundadores da Natura, e o CEO da Dengo, Estevan Sartoreli. A Dengo Europa tem como sócio local o empresário francês Charles Znaty, e a maior parte do capital é da Maraé Investimentos, o “family office” de Guilherme Leal.
O valor do investimento não é informado, mas o custo da abertura de uma loja em Paris é da ordem de 250 mil euros. As porcentagens da sociedade também não são divulgadas, mas Znaty, CEO na Europa, garante que sua fatia é significativa o suficiente para que “tenha autonomia e se sinta confortável”. Znaty é ex-CEO da Pierre Hermé, uma pâtisserie de luxo que se tornou conhecida pelos “macarons” e por suas lojas de doces que parecem joalherias. Em 2018, a marca que tem lojas espalhadas pelo mundo, foi vendida para a L’Occitane.
A parceria com a Dengo partiu de Znaty, que após sair da Pierre Hermé buscava um novo desafio. Com formação publicitária, é um criador de marcas. Aposta na Dengo para consumidores jovens, “muito ativos na escolha de marcas que não sejam apenas boas como sabor, que não contenham produtos químicos, mas que também sejam sustentáveis e boas para o planeta”.
A palavra dengo é desconhecida dos franceses, que a pronunciam “dengô”. “É uma palavra interessante também porque não é originaria do português, ela vem da África e acho que isso toca os franceses e fala do chocolate. No primeiro momento há a noção do afeto, da gentileza, mas também essa origem africana ajudará o francês a compreender que a proposta da Dengo não é unicamente ligada ao sabor, mas também a uma questão de responsabilidade social e preocupação com o meio ambiente”, diz Znaty.
A Dengo é uma marca de chocolates “bean-to-bar” – nome dado quando há controle da amêndoa à barra. Foi fundada em 2017. O segmento premium, que na França tem 26% do mercado, no Brasil é de apenas 5%. Dados do Euromonitor indicam que em 2020 o mercado de chocolates na França era o quinto em termos globais e movimentou US$ 5,8 bilhões enquanto que o Brasil, na sétima posição, teve US$ 3,8 bilhões. Outra grande diferença é o consumo per capita: França de 7 a 9 quilos por ano e Brasil, cerca de 2,5 quilos.
A escolha da primeira loja em Montmartre, bairro boêmio e de artistas, com ruas íngremes e de escadarias, conhecido pela basílica de Sacré Coeur que fica no alto de uma colina, foi proposital. “Não é um lugar de turistas, mas há turistas, escritórios, comércio, pessoas que trabalham e pessoas que vivem. No nosso prédio temos moradores e a primeira coisa que fiz foi dar o chocolate para que provassem”, diz Znat. Vale lembrar que atualmente Montmartre é um dos bairros mais caros de Paris e está na moda.
A Dengo parisiense será um misto de café e loja de chocolates acolhedora, com apenas 15 lugares. Os cafés servidos serão todos brasileiros com torra local. A decoração é parecida com a Fábrica de Dengo da avenida Faria Lima, na cidade de São Paulo. Os uniformes foram desenvolvidos na França, pela diferença climática, mas são inspirados nos brasileiros.
“Com o tempo a gente quer ser percebido como uma marca local, criar raízes no bairro e não ficar estimulando ser diverso para não ser caricato”, diz Sartoreli. “Vamos no ritmo do consumidor. Sabemos quais são nossos best-sellers e vamos descobrir quais sabores brasileiros agradam mais ao mundo”.
Algumas versões de chocolate ao leite, por exemplo, serão oferecidas em Paris na versão “dark”, um segmento mais difícil no Brasil. Por enquanto, 80% do portfólio estará na loja parisiense. Apenas bombons e trufas ainda não. A segunda loja, já em reforma, será no bairro de Saint-Germain-des-Prés.
Se tudo der certo, no futuro, a marca poderá finalizar produtos na Europa, inclusive com ingredientes locais. Tudo é uma questão de tempo e de entender quem será o consumidor da Dengo no exterior. Afinal, lembra Sartoreli, “a gente já nasceu pensando que poderia voar”.
Fonte: Valor Econômico