Aos 20 anos, Luiz Renato Durski Junior elegeu-se vereador de Prudentópolis, a cidade paranaense cheia de cachoeiras com hoje 50 mil habitantes em que seu bisavô foi o primeiro prefeito. Aos 22, renunciou ao mandato, completamente “decepcionado” com a política e a prática legislativa. “Eu não fazia qualquer diferença”, disse ele a PODER. A decepção o acompanha até hoje, 35 anos depois. Para Durski, os poderes executivos e legislativos da União, dos estados e dos municípios – os principais estamentos da política oficial, em outras palavras – são compostos quase exclusivamente por “laranjas podres”. “Se uma só já contamina todas à volta, imagina quando tem na caixa uma única laranja boa”, diz.
É possível que a política paranaense não tenha perdido nada com sua renúncia, mas caso Durski tivesse tomado gosto pela coisa, o Brasil dificilmente teria o melhor hambúrguer do mundo – a frase normalmente vem em inglês –, aquele que ele serve na sua rede de restaurantes Madero. O reconhecimento não lhe foi outorgado por um insuspeito concurso internacional – diferentemente dos vinhos e das cervejas, não existe tal certame. Trata-se de uma auto-consagração. Mas se a velocidade de expansão da rede e os bons resultados financeiros recentes servirem como atestado de qualidade de seu principal produto, o empresário tem um ponto.
A rede, hoje com 127 unidades, fecha 2018 com 151 e em mais um ano quer ultrapassar as 220 lojas. Em 2017, o faturamento bruto chegou a R$ 510 milhões, 67% mais que em 2016, e o número de ouro para 2018 é o do R$ 1 bilhão. O ganho de receita das mesmas lojas, desconsiderada a expansão, foi em um ano de 11%, acima da média do setor, que, segundo Durski, é de 6%. Para expandir a Madero não recorre ao convencional sistema de franquias, prática comuníssima no segmento. Ele se alavanca com ajuda de uma empresa de growth capital, a gestora de investimentos HSI, de São Paulo, que, segundo o empresário, “funciona mais ou menos como um fundo de equity, sem ser equity”. A empresa subscreve debêntures da Madero e empresta a juros não exatamente de pai para filho. Para Durski, a HSI lhe trouxe uma enorme “ajuda na governança”.
Os números da Madero seriam perfeitamente ordinários, perfeitamente assimiláveis não fosse o “locus” do crescimento da empresa: o Brasil de Dilma 2 e Temer zero. O paranaense até colocou um pé, um dedo, melhor dizendo, na expansão internacional, ao abrir, em 2015, uma Madero na Ocean Drive, em Miami Beach, mas a loja não sobreviveu a 2018. Sua meta, definitivamente, é crescer no Brasil, esteja o céu anuviado ou não. “Quando a crise começou, decidi que a gente não ia participar dela. Disse a meu pessoal: ‘Aqui não se fala de crise’. Percebi que os consumidores iriam sair menos e valorizar o dinheiro. Se só tivessem R$ 50 para gastar, teriam de gastá-los na Madero. Naquele tempo tinha mil funcionários, hoje são 5 mil.”
O antídoto usado contra a crise não foi apenas o poder da retórica e do pensamento positivo. Durski aproveitou a mão de obra abundante, os aluguéis com preços deprimidos e, mais importante, passou a investir em “qualidade” – e no controle dela. Para isso, em vez de adotar uma estrutura horizontal, verticalizou. Estreou uma cozinha central em Ponta Grossa, de onde distribui para todas as lojas do Brasil da maionese ao sorvete, passando pela carne já porcionada; tem uma fazenda própria onde cultiva a alface e demais verduras de seus sanduíches e pratos – a produção de seu hortifrúti é 30% orgânica, mas ele quer atingir 100% em 2019; tem também uma transportadora, pois só os “próprios motoristas” saberão tomar a melhor decisão caso enfrentem algum problema que coloque em ris¬co os alimentos que trafegam pelas estradas; há ainda uma construtora para pôr de pé as novas lojas, que são desenhadas, aliás, pela mulher do empresário, a arquiteta Kethlen Durski.
Já o controle da qualidade, diz ele, é severo. Câmeras pelas cozinhas, salões e até na frente das lojas geram imagens vistas numa central no Paraná, “verdadeiro big brother”, diz Durski. Supervisores de qualidade, profissionais que exercem a função de topo de carreira da rede, percorrem o Brasil para ver se tudo está nos trinques. Por fim, os próprios comandantes de cada unidade, os chamados sócios-gerentes, são penalizados se houver reclamações e caso o índice de satisfação do consumidor fique abaixo dos 96%.
TEORIA E PRÁTICA
Formado em direito em Itapetininga (SP) e sem qualquer título acadêmico de administração, Durski é empresário (e chef) autodidata, que desconfia de quem ensina a teoria sem conhecer a prática. A decisão pela verticalização jamais seria tomada se ele ouvisse o que seus interlocutores lhe aconselhavam. A PODER disse ser “a pessoa que mais erra no mundo”, mas que também acaba por acertar bastante, pois “atira muito”. Se a Madero empinou nos últimos anos com crise e tudo, ela já teve seus anos problemáticos, quando suas cinco primeiras lojas deram prejuízo por seis anos seguidos. A questão, ele descobriu, era o preço. A solução hoje parece bastante simplória, mas é daquelas que consultores independentes, caso consultados, exigiriam uma pequena fortuna para não achá-la. O empresário diminuiu pela metade o peso da carne do hambúrguer, que passou a ser de 130 gramas. Por tabela, o sanduíche, que custava R$ 29, passou a valer R$ 19. O couvert também sumiu, e apareceu o nome “express”. Fez-se a luz.
De volta a 2018, outra estratégia que Durski vem empregando na Madero é o da diversificação de portfólio.
Com muitas pequenas unidades em shoppings, que pedem ambientes simplificados e poucos atendentes, ele passou a multiplicar suas marcas. A Vó Maria Durski, já inaugurada num shopping de Curitiba, serve parmeggiana de frango, estrogonofe e massas; A Sanduícheria do Junior Durski, no mesmo mall, tem choripán, falafel e também estrogonofe, tudo no pão; há ainda a Jeronimo, sem garçons, com hambúrgueres com carne prensada e fritas frisadas, como as da famosa rede nova-iorquina Shake Shack; por fim, há as Madero propriamente ditas, uma com serviço expresso, sem garçons, e o “casual dinner”, classudo, em que eles proliferam. Além disso, vem aí a Peixaria do Junior Durski, com pescados e camarão e outra casa rápida de hambúrguer, a Dundee Burger.
O empresário compara a estratégia de diversificação com o manejo da madeira, atividade que exerceu por década e meia na Amazônia, tempo que revive com saudade, apesar das três malárias. Num bom plano de manejo e conservação, ele explica, cortam-se as árvores mais altas para que a luz incida também sobre as baixas, que assim podem medrar. Ele é adepto de primeira hora da chamada “floresta em pé”, a exploração de madeira que não depreda a mata, e diz ter ido a Brasília conversar com o Ministério do Meio Ambiente para defender o expediente. “A salvação da Amazônia passa pelo extrativismo. Ao madeireiro só interessa a floresta em pé. Se ela acabar, game over.”
LOUCURA, LOUCURA
Durski tem cerca de 91% de participação na Madero, cabendo 5% para o apresentador Luciano Huck, que fez um aporte por meio de seu fundo Joá e estrela alguns filmes publicitários da rede, desses com cara de institucional e que exibem uma “narrativa”. No caso, a própria história da Madero, da família Durski, e as ações de benemerência da rede. “Logo na primeira conversa, a sinergia ficou clara”, disse Huck a PODER, por e-mail. “Tenho muito orgulho de dizer que sou sócio, entusiasta e cliente. Estamos construindo a maior e melhor cadeia de restaurantes do Brasil”, completou. Huck associou-se à Madero no começo das especulações de sua candidatura a presidente, e Durski acredita que o sonho do global não morreu, apenas foi adiado. “Acho que em oito anos ele se candidata, e vira presidente”. Completa o quadro acionário o CFO da empresa, que controla com austeridade o fluxo de caixa e tem a missão de refrear os arroubos de Durski, que, como disse à reportagem, “gosta de correr riscos”.
Não deixa de ser uma ironia que Durski, avesso à política, tenha encontrado um sócio que por pouco não se tornou um postulante ao palácio do Planalto. Para o cargo não demonstra qualquer simpatia pelo candidato de seu estado – “Alvaro Dias é velho, sem energia, está mais preocupado com sua próxima plástica” – e, na verdade, por qualquer outro, embora cite en passant João Amôedo, do Novo, alguém que “talvez pudesse fazer sentido”. Encampa com fervor, contudo, algumas ideias e posições professadas por Jair Bolsonaro, como o direito de a população se armar e o desdém pelo “pessoal dos direitos humanos”. Para ele, com efeito, “a pior profissão do Brasil é policial, que pode tomar tiro, mas não atirar”. Na mesma toada, lastima a existência do Bolsa Família, programa que tende a anular o “empreendedorismo nato do brasileiro”. Para terminar atirando, registre-se que Durski adora caçar esportivamente, atividade ilegal no Brasil, mais uma razão para chamar o país de “idiota”. Três dias depois da entrevista com a PODER ele estava no Uruguai atirando em patos, mas, com a chuva que caía no paisito, o balaio voltou vazio. “Matamos meia dúzia, e o normal é matarmos uns 70, 80. Mas valeu pelo churrasco.”
RISCO IMINENTE
Quando diz que gosta de correr riscos, Junior Durski não está a se apoiar numa frase de efeito – frase cara, aliás, ao pessoal da nova economia. Em seus tempos de garimpeiro em Rondônia, um curto interregno das décadas como madeireiro, ele precisava andar com dois seguranças armados para fazer negócios. Durski comprava ali cassiterita – minério de onde se retira o estanho – e a revendia em São Paulo e outros mercados consumidores. O negócio tinha de ser feito em cash, e o dinheiro ia acondicionado num saco volumoso, facilmente percebido pelos ladrões. Como as estradas no fim do século passado em Rondônia eram mais ou menos como são hoje, ele precisava caminhar uns 10 quilômetros até a mina. Não fossem os jagunços, estaria exposto ao deus-dará. Ele lembra de um colega que fazia promoção de sua virilidade, ao dizer seguidamente que dispensava os seguranças. Um dia deu ruim: o trader tomou um tiro, caiu e morreu na hora. O ladrão pegou o saco de dinheiro e mal se preocupou com os seguranças de Durski, logo ao lado. “Aquilo não era assunto nosso”, diz Durski.
Fonte: VIP CEO