A receita subiu quase 50% no primeiro tri – parte pela abertura de novos restaurantes, parte pelo repasse da inflação e o crescimento do delivery – mas a companhia ainda perdeu 1,5 ponto de margem bruta
Por Pedro Arbex e Geraldo Samor
Num complexo de mais de 80 mil metros quadrados em Ponta Grossa, a uma hora de Curitiba, o Madero produz todos os dias milhares de pães, hambúrgueres, queijos e defumados – que são despachados dali para seus restaurantes em 60 caminhões (todos próprios).
O molho do ‘best burger in the world’ vem de lá. O alface orgânico? Plantado ali mesmo. O caldo de frutas vermelhas no petit gâteau? Adivinha de onde vem.
O galpão é tão grande que o Madero poderia dobrar de tamanho e ainda assim ele daria conta de abastecer toda a rede.
Esse grau incomum de verticalização é fruto de um investimento de R$ 500 milhões e da visão de Luiz Renato Durski Junior, o autointitulado “Chef Junior” e fundador da rede de hamburguerias.
Desde o início, Junior percebeu que para garantir a qualidade do serviço – e uma margem EBITDA gorda – teria que “produzir, transportar, ser dono das marcas e operar os restaurantes.”
O modelo rendeu ao Madero uma escala substancial nos últimos anos: a empresa tem hoje 274 restaurantes.
Mas esse crescimento acelerado não veio sem hematomas.
Na pandemia, o Madero foi forçado a cancelar seu IPO e, com as lojas fechadas, a geração de caixa evaporou. Mas em vez de frear, o Madero acelerou.
Mesmo com os lockdowns, Junior continuou abrindo lojas (80 em dois anos) e, para isso, tomou muito financiamento bancário. A dívida líquida saiu de R$ 254 milhões em 2019 para R$ 652 milhões em 2020 e R$ 812 milhões no fim de março – o último número publicado.
Com as lojas fechadas, a alavancagem explodiu de 1x para 20x em dezembro de 2020, levando o mercado a questionar a capacidade da empresa de continuar operando.
“O Junior é muito propenso a risco e muito sensível a preço,” Fernando Borges, o chairman da empresa e ex-sócio do Carlyle na época do investimento, disse ao Brazil Journal. “Ele prefere ter dívida do que ser diluído, mas foi por isso que ele chegou onde está, em vez de ter vendido a companhia lá atrás, quando outros tentaram comprá-lo.”
Em retrospecto, Fernando diz que a companhia subestimou a duração da pandemia. “Vendo o filme hoje, poderíamos ter ido mais devagar, mas o Madero conseguiu pegar pontos premium que o Junior sempre quis e não tinha a oportunidade.”
Agora, ao que tudo indica, essa aposta arriscada está se pagando.
Em novembro passado, o Carlyle injetou mais R$ 300 milhões na companhia – elevando o total investido para R$ 1 bi – e, no início do ano, o Madero emitiu um CRA de R$ 500 milhões que reperfilou sua dívida. Com a captação, a empresa zerou seu endividamento de curto prazo e esticou o duration médio da dívida para 3,6 anos.
“Fechamos o primeiro tri com a alavancagem abaixo de 3x e até o final do ano queremos reduzir para 2,5x,” disse o CFO Ariel Szwarc, na empresa há sete anos.
O recuo da pandemia está ajudando a operação, mas os números ainda são desafiadores. A receita subiu quase 50% no primeiro tri – parte pela abertura de novos restaurantes, parte pelo repasse da inflação e o crescimento do delivery – mas a companhia ainda perdeu 1,5 ponto de margem bruta.
O tráfego nas lojas também ainda não voltou inteiramente, principalmente as de shoppings, onde o fluxo ainda está 25% menor que em 2019.
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Junior não tem medo de risco. Com uma passagem pela política que ele mesmo define como “frustrada” – foi vereador aos 20 anos – Junior acabou seguindo a profissão do pai e do avô e foi trabalhar como madeireiro em Rondônia, onde também se aventurou no garimpo.
Por lá, a cozinha começou como lazer, e 15 anos depois fez com que ele voltasse para Curitiba para empreender com seu primeiro restaurante, o Durski, de cozinha internacional, no bairro boêmio de São Francisco.
No início, a casa não deslanchou, e Junior culpava o bar “mal frequentado” que ficava ao lado. A solução foi comprar o vizinho para espantar a tal da má freguesia, e foi lá que, em 2005, nasceu o primeiro Madero.
Nos últimos anos, o vento contra testou a capacidade de adaptação do chef, um empresário ‘barriga no balcão’ que chega à excentricidade de imprimir seu Whatsapp pessoal em todos os cardápios da rede para ouvir o feedback dos clientes – expondo-se a críticas, elogios, e aos malucos ocasionais. (Junior normalmente responde as mensagens por áudio, já que muitos clientes duvidam que é ele mesmo enviando a resposta.)
Em meio à adversidade – ou talvez por causa dela – ele está tendo que achar outras formas de otimizar a receita.
Antes da pandemia, o Madero simplesmente não trabalhava com entregas online por resistência do fundador, que temia que o produto perdesse qualidade no caminho. Uma covid depois, o delivery já responde por 17% do faturamento.
O Madero opera hoje com quatro formatos: o Madero Steak House (um restaurante com um cardápio mais amplo e garçons atendendo as mesas); o Madero Container (que serve apenas hambúrguer num modelo de fast casual); o Jeronimo (a marca de combate do grupo que serve smash burgers); e o Dundee Chicken (focado apenas em frango frito).
Para tentar atrair público e ocupar as cadeiras vazias dos shoppings, Junior criou outro restaurante dentro do Madero Steak House, dando origem à quinta marca do grupo, o italiano Legno.
“Não queríamos apenas incluir pratos italianos dentro do Madero, por isso criamos duas experiências diferentes,” disse. Quando o cliente senta no Madero, o garçom entrega dois cardápios: um do Madero e outro do Legno. (O garçom também usa uma roupa diferente para servir o Legno.)
O modelo – lançado há dois meses – está sendo testado em algumas poucas unidades em Curitiba, mas a ideia é fazer o rollout para toda a base até o final do ano.
Outra inovação recente foi a criação do Dundee Chicken & Burgers, lançado em dezembro passado.
A marca teve sucesso assim que foi lançada em praças como Curitiba, Goiânia e Águas Claras (DF), mas – dado que os recursos são limitados – Junior teve uma sacada. “E se botássemos o frango frito do Dundee no Jeronimo?”
“Esse é um investimento de apenas R$ 150 mil por loja para colocar uma fritadeira de pressão e uma estufa para depois de fritar você guardar o frango por uns 30 minutos,” disse Junior. “É receita na veia. Para fazer um Dundee novo a gente gasta R$ 4-5 milhões.”
Dois meses depois de começar a testar o modelo, a venda de frango frito no Jeronimo já responde por 12% do faturamento. “E isso sem fazer propaganda, ir para as plataformas de delivery, nada. Acho que tem um potencial relevante de gerar vendas incrementais.”
O plano de Junior é levar o frango frito do Dundee para todas as 91 lojas do Jerônimo até o final do ano.
Com a casa arrumada, o Madero já planeja voltar a crescer. A meta é abrir 20 lojas este ano e 25 ano que vem.
O tão sonhado IPO? Só daqui a 1 ou 2 anos, disse Junior, “quando o cenário estiver diferente e ninguém mais lembrar desses problemas de hoje.”
Fonte: Brazil Journal